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08/10/15

PORTUGAL, AGRICULTURA, E MOUROS (I)

MEMÓRIAS DE LITERATURA PORTUGUESA,
Publicadas
pela
ACADEMIA REAL DAS CIÊNCIAS DE LISBOA

Tomo II

LISBOA
Na Oficina da Mesma Academia
ano 1792
Com licença da Real Mesa da Comissão Geral sobre o Exame,
e Censura dos Livros.


[...]
§ I
DO TEMPO DO CONDE D. HENRIQUE ATÉ ElREI D. PEDRO I

O Terreno que chamamos Portugal, no tempo do Conde D. Henrique era, grande parte, senhoreado de Mouros, inimigos irreconciliáveis dos Nacionais, com que viviam quase sempre em crua guerra. O carácter da guerra daqueles tempos era principalmente de corridas, de falto, e de pilhagem, a ordem de parte a parte se roubavam os frutos, e os rebanhos. Os Lavradores, destas contínuas inquietações sempre assustados, apenas cultivavam as terras mais vizinhas às casas fortes, e povoações muradas, donde facilmente pudessem ser auxiliados das irrupções dos inimigos. Com a mão, hora nos instrumentos da cultura, outra hora nos da guerra pela maior parte colhiam, e pelejavam.

Nas Províncias do Minho, Trás-os-Montes, e uma parte da Beira se vivia com mais repouso. Aí mais a salvo os Lavradores, semeavam, e colhiam. as colheitas eram principalmente de trigo, centeio, cevada, e legumes. As frutas, e hortaliças eram abundantes à proporção do povo. O azeite era raríssimo no Minho; havia suficiente na Beira, e Trás-os-Montes (vemos isto por algumas escrituras, e doações daquele tempo, que se guardam nos respectivos cartórios, e também pelos forais; muitos nos refere Fr. António Brandão na Monarchia Lusitana, e o P. D. António Caetano de Sousa nas Provas das memórias Genealógicas da Sereníssima Casa de Bragança): do mesmo modo era o vinho. Os mais géneros floresciam medianamente.

Ainda então se não tinham introduzido tantas diferenças de qualidades na Ordem política. Um Lavrador era um homem bom, um homem honrado, que rodava com todos os bons Patriotas, e ocupava os honrosos cargos públicos do Lugar em que vivia.

O Conde vendo, que havia bastantes terras incultas, que era necessário cultivarem-se para a subsistência do Estado, e que por outra parte os cuidados da guerra lhe não deixavam empregar-se de propósito neste empenho, buscou modo, com que, sem faltar ao ministério das armas, promovesse a Agricultura. Repartiu largamente as terras incultas por alguns corpos de mão morta, com às Catedrais de Braga, e outras, e aos Monges Benedictinos; e também por muitos Senhores da sua Côrte, que as fizessem cultivar (que fez doações a vários Senhores da sua Côrte, prova-se pelos testemunhos apontados nos referidos AA. "Deus a Alberto Tibão, e a seu Irmão, e aos mais Franceses o campos de Guimarães junto ao seu Paço." Sousa T. I das prov. nº 2 "Também deu a Egas Moniz o sítio de Britiande, que logo pobrou, e fez aí quinta e morada." consta do liv. das doações do Mosteiro de Salzedas, referido por Brandão Part. III liv. VIII cap. 20; aí mesmo se leem estas palavras "e D. Henrique.... deixou-lhes haver quanto filhavam e contava-lho, e assim fez a D. Garcia Rodrigues e a D. Paião seu irmão, que lhes contou o Couto de Leomil etc..."; no mesmo lugar se acham outros muitos testemunhos; também o Conde fez fundar novas povoações de Lavradores, para multiplicar os homens, honrados a estes novos povoadores com graças e privilégios; para prova disto basta ver o foral da Vila de Constantins de Panoias, que refere Sousa no tom. I das Provas nº 1). A Catedral de Braga repartiu estas terras, aforando umas, dando outras aos Lavradores com a convenção de certas partilhas na colheita dos frutos.

Os Monges em parte fazendo o mesmo que a Catedral, em parte dando ainda melhor exemplo, também promoveram a cultura. Viviam ainda estes respeitáveis Monges em todo o rigor dos trabalhos Monásticos. Multiplicaram, com o favor do Conde, os Mosteiros, onde se recolhiam nas horas do repouso, e Oração. O mais tempo empregavam em cultivar por suas próprias mãos as terras que lhes foram doadas, dando testemunho público da sua observância, e do amor ao trabalho honesto, e proveitoso, fundando ao mesmo tempo muitas povoações, e Freguesias para cómodo daqueles seculáres, que por algum modo se agravam às suas lavouras, donde veio ser a Província do Minho a mais povoada, e por consequência a mais abundante.

Mosteiro do Lorvão
Estas Comunidades de Monges lavradores se aumentaram tanto, que além dos Mosteiros Lorvaniense, e Bubulense serem muito povoados, o Palumbário, segundo escrevem alguns, chegou a ter 900 Monges (Que os Monges Beneditinos viviam do seu trabalho manual, já desde as suas fundações em Portugal, e antes do tempo em que falamos, além de ser conforme à sua regra, e testificado pelos seus anais, se deduz da doação, que fez ElRei D. Ramiro aos Monges de Lorvão, que não querendo eles possuir herdades, e sustentando-se como Lavradores jornaleiros, o Rei lhes dá uma herdade, e os obriga a aceitar "quoniam inter istos montes non habetis campos ad laborandum" prova de que eles trabalhavam nos campos para se sustentarem. Que os Monges deste Mosteiro trabalhavam por suas mãos nas herdades que já depois possuíam, prova-se porque as suas lavouras eram muito grandes. Tais, como se colhe de doação que lhe fez ElRei D. Sancho de Leão, que contendo, como quisera levantar o cerco de Coimbra por falta de víveres, acrescenta: "os frades me deram de tudo o que tinham para comer, ovelhas, bois, porcos, cabras, aves, pescados, e muitos legumes, pão, e vinho sem conto que.... tinham guardado etc."; tais eram as suas colheitas que sustentaram um Rei, e um exército - estas não podiam ser feita senão pelas suas mãos; porque tendo sido, depois de expugnação de Coimbra por Almansor, levadas cativas a Sevilha "todas as pessoas que eram de trabalhar"; e algumas poucas que ficaram, constrangidas pela escravidão, a servir aos Mouros, que dominavam a terra, como podiam ter os Monges tanta cópia de criados para tão grandes lavouras? nem os Mouros lhos consentiam, principalmente tendo tão perto o Mosteiro Bubulense, ou da Vacariça, que unindo-se seriam temíveis aos inimigos; além disso "Os Mouros deixavam trabalhar aos Monges pagando-lhes certo tributo, e ainda sim os vexavam."; são palavras de um monumento antigo referido por Fr. Manuel da Rocha no Portugal Renascido - Que o mosteiro Paumbário, ou de Pombeiro, tivesse 900 Monges, diz Fr. Leão de S. Tomás nos prolómen, às Constituições Beneditinas; outros duvidam do número; como quer que fosse, sempre era grande; o mesmo A. refere uma passagem do Livro dos usos do dito Mosteiro, que determina, que "na 5.ª feira Maior se chamem para o Lava-pés tantos pobres, quanto Monges houver: e no caso de se não acharem tantos pobres Curet Soliem (o Abade) quos centum et viginti minime deficiant."). A utilidade intrínseca de Agricultura, os exemplos destes virtuosos Monges, o favor do Príncipe, e dos poderosos, para o aumento da povoação, e por consequência da Cultura, tudo animou os homens, e começaram a empregar-se com mais gosto nos trabalhos da lavoura.

Neste tempo ainda não era cultivada por nós, mais que uma pequena parte da Estremadura. A Beira nem toda era cultivada, o Além-Tejo era ocupado de Mouros, que não deixavam trabalhar os naturais, oprimindo-os ou com a escravidão, ou com a guerra.

Entrou o governo DelRei D. Afonso Henriques, em cujo tempo já nas três Províncias havia muita colheita de grãos, vinhos, e azeite, principalmente nas vizinhanças de Coimbra. Duarte Galvão, e Duarte Nunes de Leão nos contam, que estando este Príncipe em Guimarães vieram os Mouros cercar Coimbra, e destruíram "pães, hortas, vinhos, e olivais, com tudo era tanta a abundância destes géneros na Cidade, que davam cinco quarteiros de trigo per um meravidy de ouro e dois moros de vinho por outro maravidy" são formais palavras por que Duarte Galvão se explica (Duarte Galv. Crónica Cap 7).

As armas Portuguesas conduzidas por este Príncipe foram correndo pela Estremadura, entrando por Além-Tejo, e compelindo os Mouros até aos fins da Monarquia. Novas terras conquistadas pediam novos povoadores, e colonos. Ele todo ocupado na reparação da Pátria, vendo que os trabalhadores da guerra lhe não deixavam pôr todos os esforços no aumento da Cultura, seguiu os vestígios de seu Pai, já em cuidar, que se fizessem novas povoações, já em repartir as terras pelos Corpos de mão morta; deu muitas às Catedrais de Viseu, e Coimbra, que fizeram fundar inumeráveis povoações (consta das nossas Crónicas, da Monarquia Lusitana, e de infinitos documentos dos referidos cartórios; fez das terras de Coja outro, e Senhorio dos Bispos de Coimbra, que as fizeram cultivar - Brand. Part. III liv. 9 Cap.18), outras muitas ao Mosteiro de Santa Cruz de Coimbra (o livro das doações de S. Cruz está cheio de provas "Fez o couto de Verida a esta Casa, na Era de 1204 e deu suas terras para se fazerem abrir", "deu também o Castelo de S. Olaia"; A doação deste Castelo traz Brand. Part. III Liv. II Cap. 7; também lhe deu Leiria, da qual o Rei diz "Quod castruns in terra deserta ego primitus edificavi" Id. Part. III Liv. 9 Cap. 25). Estas corporações repartiram também as terras pelos seus colonos com foros, ou por convenções de partilhas na colheita, por terço, quarto, e oitavo; e esta foi a origem dos direitos que este Mosteiro ainda hoje tem nos campos de Cadima, Tocha, Antuzede, Reveles, Ribeira de Frades, Condeixa a nova, e Vetride povoações, que aquela Comunidade ou fundou, ou reedificou para cómodo dos seus Lavradores.

(a continuar)

16/05/14

VIDA DE S. TEOTÓNIO (notas)

Este é o complemento do artigo aqui publicado.


ADITAMENTO

"1. O costume de celebrar nos sábados a Missa de N. Senhora, que D. Teotónio observou em Viseu, e depois introduziu em S. Cruz, se observa ainda; e nos Mosteiros da congregação de S. Cruz se diz esta Missa no fim de Prima, com órgão, e assistência de dois Acólitos, acesas todas as velas no Altar da Senhora. Desta cordial devoção, com que se empregava no culto e obséquio da Virgem Mãe de Deus, se podia justamente reconhecer S. Teotónio remunerado com os tesouros infinitos da graça, e afluência de todos os bens. Vigiava, e orava prostrado diante do altar e Imagem da Senhora; não se cansava de madrugar às portas de seu Templo, e casa de oração. Que virtudes, que prodígios do Céu deixaria de receber, e obrar, quando sem interrupção gozava a felicidade de ouvir a Mãe da divina graça, a Mãe da eterna sabedoria? (Sap. VII. Super salutem et speciem dilexi illam: venerunt mihi omnia bona pariter cum illa). Esta devoção persuadia a todos, querendo encaminhar a Deus as almas redemidas com o sangue de Cristo, valendo-se do auxílio, e patrocínio da Mãe do mesmo Deus, pela qual baixou à terra o Rei da Glória, que convida, e chama todas as gentes ao conhecimento da verdade, e ao prémio e exaltação na eternidade bemaventurada.

2. Pelo desejo de lucrar a todos para Deus, se acomodava ao génio de cada um: alegre com uns não deixava de chorar com outros. Quem padecia enfermidades ou trabalhos, e se não animava de ver compadecido a Teotónio? O amor de Deus, de que procedia o grande afecto e agrado, com que trocava ao próximo, o obrigava a sentir como próprios os males alheios; a buscar por todos os meios o remédio, a consolação, e o alívio de todos. E isto sem excepção de pessoa. Seu amor igual, como fundado em Deus, olhava a cada um como obra das mãos de Deus, como imagem do mesmo Deus. Assim acudia com presteza ao pobre e ignorante, como ao rico e sábio: (Dilectio aequalis facit non acceptari personas. S. Aug. in Jo). Como verdadeiro filho do grande Agostinho, e discípulo fiel do Salvador, em amar a seus irmãos, e lhes solicitar todos os bens possíveis, e os meios de conseguir os eternos; em obras de misericórdia e caridade soube declarar e pagar as obrigações de ser amado e favorecido por Deus."

04/03/13

4 de Março - NASCIMENTO DO INFANTE D. HENRIQUE

O maior símbolo da navegação portuguesa foi o Infante D. (4 de Março de 1394 - 13 de Novembro de 1460), filho delRei D. João I de Portugal (fundador da Casa de Avis) e de D. Filipa de Lencastre (filha de João de Gant, Lancaster), e irmão do Infante Santo (D. Fernando). Foi o I Duque de Viseu e I Senhor da Covilhã. O seu nome deve-se ao seu tio Henrique IV de Inglaterra e o seu padrinho de baptismo foi o bispo de Viseu. Até aos 14 anos poucos registos temos da sua vida passada com seus irmãos (a estes príncipes se chamou de a ínclita geração, por se tornarem homens de maravilhosos feitos.)

Em 1414, o Infante obtém de seu pai autorização para a fundação de uma companhia na África, para a conquista de Ceuta (o que veio a acontecer em 1415). Foi então armado cavaleiro, e recebeu o Ducado de Viseu e o Senhorio da Covilhã. Governou Ceuta desde 1416 e resistiu ao primeiro cerco muçulmano (1418) que lhe levantaram juntamente com o Fez e Granada.

Recebeu por doação de seu irmão D. Duarte (então subido ao trono de Portugal) o arquipélago da Madeira, em 1433. Em 1420 foi nomeado Grão-mestre da Ordem de Cristo (continuidade da Ordem dos Templários em Portugal) facto pelo qual se explica que os descobrimentos portugueses levassem sempre a cruz desta Ordem. Começa um período de expansão marítima imparável pelos séculos fora.

O Infante tinha de D. Duarte o direito ao quinto e exploração. Fez a povoação dos Açores (descobertos em 1427). A costa de África ganha muitas expedições e descobertas, e esteve o Infante na organização da conquista de Tânger em 1437 onde seu irmão Infante Santo veio a morrer às mãos da moirama depois de 11 anos como prisioneiro.

16/09/12

S. TEOTÓNIO - PRIMEIRO SANTO DO REINO DE PORTUGAL (IV)

(continuação da III parte)


Exercita S. Teotónio as Primeiras Ordens

"3. Levava a luz do Evangelho, e mostrava obras de luz aos próximos. Imaginai, se podeis, quais seriam depois os primores do seu fervor, e de seu zelo santo no Sacerdócio, sendo tão exemplar sua vida no ofício de Ostiário. Não desprezava as cousas mínimas nem as maiores obrigações. Sempre estava solícito, se os altares eram bem asseados, se as paredes eram limpas de todo o pó e teias de aranha, se o pavimento era de todo limpo, o Sacrário puríssimo, os vasos reluzidos, as lâmpadas acesas.

4 . Depois é ordenado subdiácono. Quem poderá explicar, como servia a Deus em humildade, levando ao altar aos diáconos os vasos do Corpo e Sangue de Cristo? E depois os trazia; limpando, e lavava os corporais, palhas, e toalhas: administrava ao Bispo as galhetas, o gumil, e manutérgio; e dava água aos Sacerdotes e Levitas para lavarem as mãos diante do altar? Eu cuido de ser isto evidência, de que nele se preparava um Sacerdote irrepreensível para a Igreja de Deus. Nem referirei a devoção singular, com que dizem, que avisava a todos em voz clara, sendo já diácono, ou a dobrar os joelhos, ou a orar, com que dispensava, e repartia os Sacramentos de Deus; prégava o Evangelho, e assistia aos Sacerdotes em todos os ministérios de Cristo. Ele no altar ajuntava e dispunha as oblações; compunha a mesa do Senhor, e a vestia. Vamos ao Sacerdócio. Ele, como disse, adornado de tais costumes chegou ao Sacerdócio; não seguindo a presunção de alguns, mas ao costume da Universal Igreja. A Igreja sim foi a que o buscou, e chamou; não foi ele o que imprudentemente se ingeriu, e intrometeu.

Aditamentos 

Em Viseu parece residia já S. Teotónio, quando recebeu as suas primeiras Ordens da mão do Bispo de Coimbra. Em Viseu entrou com 16 anos, e aí residiu até aos 34, pois entrava já aos 50 quando tomou a resolução de concorrer para a nova reforma de sua Ordem Canónica, fundando com os mais companheiros o insigne Mosteiro de S. Cruz. Em Viseu, bem dilatado campo de suas glórias, se conservou sempre mui fresca a memória deste se prodigioso Protector. É de especial estimação na Sé a casa do Cabido, lugar próprio da cela em que morreu S. Teotónio."

(continuação, V parte)

03/09/12

"TRADICIONALISTAS" CONTRA O LIBERALISMO DE D. PEDRO IMPERADOR DO BRASIL



Do outro lado do mar chegou-me uma opinião descontente, muito convicta de si, segundo a qual não se podia chamar tradicionalista a D. Miguel I de Portugal, irmão de D. Pedro imperador do Brasil, por ser designação não costumada. Pois bem... é falso! Na História de Portugal dos Tempos Pré-Históricos aos Nossos Dias, dirigida pelo Professor Catedrático da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, Prof. João Medina, podemos ler na página 107 do VIII tomo:

"A Carta esteve longe de propiciar a desejada reconciliação da família portuguesa. A própria infanta Isabel Maria hesitou na sua promulgação, o que só veio a suceder a 31 de Julho de 1826, depois de fortes pressões exercidas por Saldanha, ao tempo governador militar do Porto. Os adeptos da Constituição de 1822 não a aceitavam por ser demasiado moderna. Os tradicionalistas, por seu turno, recusavam liminarmente qualquer texto constitucional."

Já agora, ainda do mesmo texto:

"Numa proclamação datada daquela localidade e de 6 de Agosto de 1826, apelava aos militares para que aclamassem "o nosso legítimo Rei e Senhor D. Miguel I; desembainhai vossas cortantes espadas para vingar os direitos deste Soberano ofendido e ultrajado pela mais vil facção maçónica". (...) No Norte o conde de Amarante (Marquês de Chaves desde a Vilafrancada), reeditava a anterior sublevação e assolou Trás-os-Montes. Por todo o País se sucediam os levantamento absolutistas, no Algarve, em Vila Real e Viseu. Revoltaram-se as milícias da Guarda, de Tondela, Arganil, Arouca, Covilhã..."

Na página 172:

"Na sequência da guerra civil, a vitória de D. pedro e da causa liberal, em 1834, impunha novas condições à proposta antiliberal. A derrota teve, essencialmente, um carácter militar. D. Miguel passava a constituir, a partir do exílio, o pólo da unidade possível das resistências. A alternativa enunciada pelo tradicionalismo contraliberalista ganhava uma identificação definitiva com a legitimidade representada por D. Miguel, no seu mais amplo sentido."

Um dos cognomes de D. Miguel I é "o Tradicionalista", tal como alguns Reis têm mais que um cognome por justos motivos: é o caso de D. Afonso Henriques "o Grande" ou "o Fundador", quanto me lembre.

Mas vamos agora a outra curiosidade oferecida nas páginas 114 e 115:

"... D. Carlos Maria Isidro, que se encontrava em Portugal sob protecção de D. Miguel I, não aceitou aquela disposição que violava a "Lei Sálica" dos Bourbons e divulgou, a 1 de Outubro, o "Manifesto de Abrantes" [Abrantes, em Portugal], onde se considerava o legítimo Rei de Espanha; seguiram-se os "Decretos de Santarém" [Santarém, em Portugal], já assinados como Carlos V, As correntes tradicionalistas espanholas, que se manifestavam desde 1822 encontravam agora um chefe."

19/03/12

S. TEOTÓNIO, OS LUSOS, OS PORTUGUESES (I)

S. Teotónio. Mitra aos pé, báculo na mão,e com a outra mão sustentando um globo de estrelas
(esta é uma das duas formas tradicionais de representar a S. Teotónio)

"O Apóstolo S. Paulo encomenda aos primeiros filhos da Igreja que não se deixem esquecer de seus propósitos: os ministros do Senhor enviados por Deus a anunciar aos povos a doutrina do Céu, a palavra do mesmo Deus, como [a ser] seus intérpretes fidelíssimos.

Esta saudável lembrança lhes faria ver o fim precioso da conversão angélica que esses grandes heróis do Cristianismo instituíram entre os homens; e ao mesmo tempo, como forte suavidade, os inflamaria no deseno de imitar tanta Fé e pureza de costumes ("Mementote praepositorum vestrorum, qui vobis locuti sunt verbum Dei, quorum intuentes exitum conversationis, imitamini fidem" Hebr. XIII). Sendo pois o glorioso padre S. Teotónio um dos mais ilustres Pregadores do Evangelho em Portugal, donde expurgou as superstições do Maometismo, quanto será importante e proveitosa sua memória para os que o veneram e reconhecem Protector prodigioso e perfeitíssimo exemplar de todas as virtudes? Viseu e Coimbra, cidades tantas vezes esclarecidas com os mais brilhantes raios deste sol reflugentíssimo, serão monumentos perenes de suas glórias, quando se honram e prezam do seu patrocinio. Para promover a piedade dos fieis nos obséquiosos cultos a S. Teotónio, se publica sua vida, para que imitando seus exemplos se disponham os devotos a receber por intercessão do Santo as bênçãos do Céu: pois é certo, segundo a promessa que o Apóstolo S. Pedro lhe fez em nome de Deus, que por seu meio há-de o mesmo Deus fazer muitos e grandes bens aos que se valerem do patrocínio e merecimentos de tão Poderoso Advogado.

As excelências do Padre S. Teotónio têm [sido celebradas]  por muitos e graves autores. Sua vida, escrita pelo seu discípulo anónimo, anda publicada em diversos escritores latinos, portugueses e doutras nações. Há pouco se imprimiu em Coimbra em uma breve notícia dos Santos Protectores desta cidade.

O patrocínio do mesmo Santo é uma das maiores glórias de que sempre se honrou a cidade antiquíssima e ilustríssima de Viseu. Ela se preza mais de ser santificada com a presença de Teotónio em vida e com a preciosa relíquia de seu braço, que parece a estar sempre defendendo, sustentando e abençoando, que de inumeráveis prerrogativas e excelências, que desde sua primeira fundação a adornam e engrandecem, pode ser com vantagem a muitas, quando não a todas as da província da Beira e reino de Portugal. Entende-se ser povoada pelos Turdulos, povos da antiga Lusitânia, 500 anos antes dos nascimento de Cristo. No de 138 antes também do nascimento, foi aí morto o celebre Viriato, valeroso Lusitano, terror dos Romanos, que não o podendo vencer por força ou indústria, á traição o fizeram cair nas mãos dos infiéis assassinos. Conquistada pelo cônsul Cipião, com toda a Beira, para que os maturais esquecessem as antigas proezas, levantou das ruínas de Viseu, que antes se dizia Vacca, uma fortaleza de Romanos no sítio onde se fez a Sé. Frontónio e Flaco, irmãos, autores de suas duas torres, em uam gravaram seus nomes, em outra as quais do império; por sua grande vista se disse Visoncio. Viso ou Viseu.

(terá continuação)

S. TEOTÓNIO - PRIMEIRO SANTO DO REINO DE PORTUGAL (V)

(continuação da IV parte)


Sacerdote e Prior de Viseu Floresce na Pureza e Mais Virtudes

1. Ordenado Sacerdote, começou Teotónio a crscermais na prudência dos costumes e madureza da boa conversação, dando proveito a todo o povo de Deus enquanto se adiantava na prática  das virtudes, e o edificava com os mais honestos procedimentos de vida inculpável. Assim pois vivia, que a todos dava bons exemplos em sua conversação e tracto. Exercitava admiravelmente o Ofício da sua Ordem, catequizando e instruindo na Doutrina e mistérios da Fé aos povos rudes; ele os baptizava, e instruídos nas obrigações de Cristãos os incorporava na Igreja Santa. Chamava os delinquentes à penitência; ele os sarava, absolvia, e reconciliava com Deus, aplicando com a mais recta administração dos Sacramentos juntamente a medicina de suas orações e palavras de toda a consolação.

2. Suplicava, e instava com orações a Deus pelos pecados do povo, como bom medianeiro entre Deus e os homens: qual outro Moisés trazia ao povo os preceitos de Deus, como excelente pregador da verdade em que instava e insistia com zelo incansável e espírito verdadeiro Apostólico; e levava a oferecer a Deus as orações do povo, intercedendo pelos pecados do mesmo povo; no altar celebrava os divinos mistérios do Corpo e Sangue de Cristo, hóstia de propiciação, com que aplacava a suprema e infinita Majestade; aí dizia por todos as orações, e benzia os dons de Deus e as oblatas dos fiéis. Sempre cheio de temor, respeito e veneração divina. Permanecia na igreja cumprindo completamente seu Ofício Celestial. Desprezou de todo o fausto e luxo, com as delícias do século, que passam, e servem de ruína aos que as gozam, Não o desvaneciam os louvores, nem com as riquezas se fazia túmido e desabrido, nem a pobreza o abatia e deixava triste; mas, sempre igual no prospero e adverso, nem se ocupava nos excessos de alegria ou tristeza, nem entretinha seus cuidados mais que em Deus, em promover por todos os modos a glória do Senhor, a própria santificação e salvação de todas as almas. Para isto exposto a quaisquer fadigas, esquecido de todo o descanso, nem sentia os ardores do sol do dia, nem a lua de noite o molestava.

3. Louvem outros em S. Teotónio, que nunca buscou novidades, curiosidade ou desejos e delícias da vida; nunca cobiçou honra ou aplauso longe de toda a ambição e de quaisquer outros defeitos: eu mais nele admirei, que em todas as suas acções foi sempre tão circunspecto que fazia resplandecer em seu hábito a honestidade e pureza angélica. Cuidava pois, como se diz, em fugir de todas as suspeitas e ocasiões em que com probabilidade se pudesse fugir o que era menos decente. Por isto em sua casa, ou cela, nunca jamais quis ter, nem admitiu leito, cadeira, banco, ou assento, em que descansasse, ou se pudesse assentar. Isto, como diz S. Gregório, é próprio dos Varões Santos, que para sempre estarem longe das coisas ilícitas se abstêm e apartam de si muitas vezes as lícitas. Portanto para não incorrer alguma culpa pelo tracto de mulheres, nunca com elas admitiu prática, nem ainda confissão particular, se não à vista de testemunhas. E costumava dizer que se tivessem de falar alguma cousa mais em segredo, não haveria alguma tão desumana e intratável que não tivesse uma ou outra mulher, em que se fiasse, para a acompanhar juntamente à confissão. Contudo amava como irmãs a todas as mulheres: mas, como dissemos, as acautelava como inimigo, negando-se de todo à sua familiaridade.

4. Com estas virtudes se fez tão amado não só dos nobres e principais de Viseu, e de todo o povo, mas ainda por toda a comarca e providência da qual muitos de um e outro sexo acudiam a ouvir da sua boca a palavra de Deus, que o respeitavam com o maior afecto, como pai espiritual e Reverendo Mestre, e director de suas almas. Portanto vencido com as súplicas e instâncias de todos os cidadãos de Viseu, e principalmente Gonçalo, Bispo de Coimbra, a quem então, como já notámos, pertencia à Igreja de Viseu, e bem contra sua vontade, como depois mostrou o sucesso, tomou posse do priorado da Sé de Viseu. Ele a ampliou por sua discrição prudente, e fez aumentar muito em bens temporais, em grande número de livros, vestes sagradas, sinos, cruzes, e cálices de prata dourados, em muitos testamentos que por respeito do santo Prior lhe fizeram os fiéis; ele a sublimou admiravelmente ao mais alto grau de honra que ao presente gozar; ele ajudando aos clérigos, dando-lhes toda a honra devida ao seu carácter, fez mui respeitável a sua igreja: e o que é mais que tudo, a enriqueceu com os costumes e exemplos de sua vida a mais pura, casta e santa.

ADICTAMENTO

1. Morreu o pior D. Tedónio no ano 1112, e assim este parece ser o da promoção de seus sobrinhos S. Teotónio na idade de 30 anos ao Priorado de Viseu. A devoção e piedade, que o santo Sacerdote fomentava nesta cidade com seus exemplos e doutrina, fizeram aí florescer o espírito da Igreja primitiva. Cheios seus moradores de caridade, e doçura com os próximos, faziam seus bens comuns aos necessitados. O amor de Deus os unia todos; tendo o mesmo coração e alma: aquela cidade ilustríssima neste feliz tempo só parecia uma casa religiosa, em que se cantavam perpétuamente os louvores divinos: tudo era bem ordenado, e se observou uma grande paz e tranquilidade nos ânimos. E como não seria assim abençoada com espirituais e temporais felicidades, se este Anjo do Senhor falava pela cidade, e lhe impetrava as misericórdias do altíssimo? (Job. XXXII. Si fuerit pro eo Angelus loquens miserebitur ejus). Falava Teotónio como verdadeiro pai de todos, atendia a cada um com mais ternura que a mãe ao filho único de suas entalhas; e como com pastor, qual outro Jacob, deixava fugir o sono de Deus olhos por não os apartar das ovelhas de Cristo, que tinha mui presentes ainda no mais profundo silêncio de alta noite, para rogar a Deus por sua eterna saúde. Os ardores do estio, os gelos do rigoroso inverno, de dia e de noite não o puderam divertir da oração e lição santa, da frequência do coro, da pregação contínua da palavra de Deus, da administração dos sacramentos.

2. Sua penitência causa pasmo e assombro; nem se fizera crível a não ser testificada pelo discípulo, autor digno de todo o crédito, em tudo exacto, sincero e verdadeiro. Este nos assegura que S. Teotónio nem tinha cama, nem banco em que pudesse descansar ou dormir; e assim é evidente que nem se despia, nem tomava algum breve sono mais que sobre a dura terra. Os cilícios, e aspereza do saco, que cingia sobre a carne, e escondia com os vestidos ordinários, era outra penalidade mais disfarçada, mas por ser perpétua não deixava de ser molestíssima. Esquecia-se do sustento; no jejum se gozava de padecer fome e sede por amor da justiça. Crucificado ao mundo, qual o Apóstolo S. Paulo, sua vida escondida em Cristo, não cessava de brilhar sobre a terra; manifestas suas boas obras aos homens pela divina providência, por mais que ele só em oculto procurasse agradar ao Pai Celeste: mas a este se referia todo o louvor dos prodígios e maravilhas, com que engrandecia no mundo a seu admirável e fiel servo, que havia posto sobre sua família, a quem havia dado suas vezes, e fiado o cuidado importantíssimo da salvação das almas. Ao tempo de seu Priorado se devem referir alguns sucessos, que vão nos seguintes capítulos, que parece não observada neles a ordem cronológica, como são as victorias que obteve de mulheres impúdicas; o costume de celebrar missas às setas feiras pelas almas, e nos sábados em obséquio de N. Senhora, e o que passou com a Rainha D. Teresa ou "Taraja"; mas por não inverter, ou deixar de seguir a narração do Anónimo, se vai traduzindo da mesma sorte que vem no original.

(a continuar)

06/03/12

S. TEOTÓNIO - PRIMEIRO SANTO DO REINO DE PORTUGAL (II)

Nossa Senhora do O (Lamego)
Costume do Sábado dedicado à Mãe de Deus:

"1. O costume de celebrar nos sábados a Missa de N. Senhora, que S. Teotónio observou em Viseu, e depois introduziu em S. Curz, observa-se ainda. Nos Mosteiros da congregação de S. Cruz diz-se esta Missa no fim de Prima, com órgão, e assistência de dois Acólitos, acesas todas as velas no Altar da Senhora. Desta cordial devoção com que se empregava no culto e obséquio da Virgem Mãe de Deus, podia-se justamente reconhecer S. Teotónio remunerado com os tesouros infinitos da graça, e afluência de todos os bens. Vigiava, e orava prostrado diante do altar e imágem da Senhora; não se cansava de madrugar às portas de seu Templo, e casa de oração. Que virtudes, que prodígios do Céu deixaria de receber, e obrar, quando sem interrupção gozava a felicidade de ouvir a Mãe da divina graça, a Mãe da eterna sabedoria? (Sap. VII Super salutem er sapeciem dilexi illam: venerunt mihi omnia bona pariter cum illa). Esta devoção persuadia a todos, quetrendo encaminhar a Deus as almas redemidas com o sangue de Cristo, valendo-se do auxílio e patrocínio da Mãe do mesmo Deus, pela qual  baixou à terra o Rei da Glória, que convida e chama todas as gentes ao conhecimento da verdade e ao prémio e exaltação na eternidade bem-aventurada." ("Vida do Admirável S. Theotónio", pag. 36)

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