22/12/14

CONTRA-MINA Nº 30: Os Novos Estóicos ... (II)

(continuação da I parte)

Tem-se querido fazer popular neste Reino uma espécie de Culto à Senhora D. Maria da Glória; e como já é costume antigo dos Constitucionais inventarem as coisas mais Sagradas para os seus fins, que já neste sentido o Azemel de Guimarães publicou o "Credo dos Corcundas", também agora se inverteu a Oração da Salve Rainha em obséquio à Senhora D. Maria da Glória, rematando-a com o blasfemo peditório... "Para que sejamos dignos das promessas de D. Pedro IV". Desta Oração, assim desfigurada, e invertida se têm espalhado muitos, e muitos Exemplares, que só fazem horror aos bons Cristãos, servem de alento apara um grande número de maus, e dão um claro testemunho de que se prepara tudo, para que esta Glória, no momento da sua chegada, encontre os ânimos bem dispostos a saudá-la, e recebê-la como querem, instam, e há largos anos premeditam os infames Pedreiros Livres deste Reino.... Mas que deve esperar o Senhor D. Pedro desses próprios, aos quais chamou à face dos Céus, e da terra LOBOS FARDADOS? Presume, que são faltos de memória, e que só pela força mágica do seu Nome se tornarão instantemente mansíssimas ovelhas? Julgará ele que as penas afrontosas, mandadas infligir aos Soldados Portugueses no Rio de Janeiro, já se apagaram inteiramente da lembrança daquelas vítimas, e de todos os seus Camaradas? Assentará ele, que os Portugueses, aos quais endereçou, não aquele terníssimo Adeus, que só lhe merecerão os seus fiéis Brasileiros, porém uma despedida insultadora.... "NÃO QUERO NADA DE PORTUGAL", hão-de querê-lo para Soberano, e recebê-lo com os braços abertos? A ferida aberta nas Leis Fundamentais deste Reino seria acaso tão leve, que os Portugueses já não sintam a vivíssima dor, que lhes causara em 1826? Acaso teríamos uma inércia, e frouxidão tal, que consentíssemos de bom grado, que a tornassem a abrir, e fazê-la mais profunda? E por mãos de estrangeiros!! E com a mais sensível de todas as quebras, qual seria a do brio e carácter Português!!!

D. Pedro
Parece, que já se pôs inteiramente de parte a questão da Legitimidade, e que o "legítimo" no entender de muitas, e grande cabeças se há feito sinónimo de "útil", adquirido por toda a sorte de meios ainda os mais infames, e indecorosos... É impossível, que os mais exercitados Negociadores, e Diplomáticos da Europa saibam responder aos argumentos, em que se funda a certíssima, e incooncussa Legitimidade do Senhor D. Miguel I, pois eu tenho lido com atenção os Protocolos das Negociações, que precederam ao seu regresso para Lisboa. De tantas cautelas, com que se procedia, de tantos laços, que se armavam, e de tantos receios, que sobrevinham aos agentes principais da trama, eu concluo necessariamente, que os mais empenhados em fazerem aceitar pelo Senhor D. Miguel as ilegais Propostas de seu Augusto Irmão, eram involuntários apologistas da verdadeira Legitimidade; e se o próprio mui Alto e Poderoso Senhor D. Miguel I não fosse tão generoso para com os seus maiores inimigos, e deixasse correr à vontade as penas do seus defensores, então se conheceria, que o princípio da Legitimidade, é o que mais facilmente se posterga, e anula, todas as vezes que se põe as miras em algum interesse maior...

Escreveu a medo em tais assuntos, e só direi, que assim como eu tantas vezes ponho o ramo numa parte, para vender o vinho em outra, assim também a Diplomacia moderna está fazendo todos os dias outro tanto, e mais de uma vez porá, verbigratia, o ramo no Tejo, para vender o seu vinho nas margens do Vistula, ou do Neva... Se a uma formiga em literatura, e a um ninguém, a um zero em altas políticas fosse lícito fazer uma pergunta não às Testas Coroadas, porém aos seus Ministros, eu a formaria desta sorte. Qual é a razão, porque se os Franceses querem outro Rei, se defere imediatamente à vontade dos Franceses? Talvez me respondam, porque os Franceses são um Povo grande, rico, e poderoso, e não temos forças bastantes para lhes darmos regras e leis... E se eu replicar; mas que diremos dos Belgas? Acaso serão eles tão grandes como os Franceses? É natural, que me respondessem, que têm aprovado esta revolução por evitarem guerras, que poderiam envolver toda a Europa. Bem está; mas permitam os mui altos e magníficos Senhores, que eu lhes proponha humildemente o caso de Portugal. A maioria da Nação quer o Senhor D. Miguel I, e não quer outro. Seremos nós inferiores aos Belgas, e aos Gregos? O tempo mostrará, que lhes somos infinitamente superiores; e se julgam conquistar sem guerra, e só com um feixe de Notas Diplomáticas a Nação Portuguesa, saibam de uma vez, que a nação Portuguesa, que já assombrou a Europa, com a importância e variedade de suas descobertas, e com a superioridade de sua marinha, e com o valor de suas tropas, fará pagar bem cara a insolência e ousadia, com que lhe queiram meter em casa uma Senhora, na qual não vê, nem pode ver outra coisa, senão um simples autómato da Pedreirada, e que forçosamente desapareceria da cena, logo que parecesse aos Mações figura inútil, e escusada.

(continuação, III parte)

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