"118. O Seminário, ou Confraria dos meninos filhos dos índios e mestiços, ia em crescimento maravilhoso. Tinha cuidado dele o Pe. Salvador Rodrigues, com cuja doutrina florescia com louvor de todas as virtudes. Saiam em procissões todos juntos pela cidade, cantando as ladainhas e orações da doutrina cristã em canto de solfa, com tal modéstia e religião que levavam os olhos de todos: e começavam a pretender os portugueses agregar seus filhos a eles, para saírem bem doutrinados. Outras vezes iam em procissão da cidade até suas próprias aldeias levando sua Cruz levantada e cantando as mesmas devoções em língua brasilica, com sumo gosto e alegria dos pais, que de nenhuma coisa mais se prezavam. Nenhuma outra satisfaz tanto a esta gente, como a doçura do canto: nela põe a felicidade humana. Chegou a ser opinião de Nóbrega, que era um dos meios com que podia converter a gentilidade do Brasil a doce harmonia do canto; e por esta causa ordenou-se-lhe que pusessem em solfa as orações e documentos mais necessários de nossa S. Fé; porque à volta da suavidade do canto entrasse em suas almas a inteligência das coisas do Céu. Sucedeu que dirigiram certo dia sua procissão a casa de um Principal de grande nome, amigo dos Cristãos, mas gentio ainda. Tinha este uma filha sua doente, e desconfiada da vida: um dos meninos entrou em zelo e com fé disse ao pai que sua filha logo ia se sarar: ele o disse, e o pai o viu; porque fazendo o menino, e os companheiros, suas orações sobre a enferma, melhorou logo, e sarou brevemente; de que ficou espantado o gentio e tão contente do sucesso, que desde logo ofereceu aos próprios meninos um filho seu a quem queria muito para que eles o instruíssem naquela doutrina dos padres, que ensinava a fazer maravilhas: fizeram-no eles melhor do que lho encomendara o pai, e em breve tempo o baptismo, e o agregaram ao restante número de seu Seminário. Chegava a ser demasiada a opinião que se tinha destes meninos entre os índios; porque os respeitavam como coisa sagrada; nenhum ousava obrar coisa alguma contra sua vontade, acreditavam no que diziam, e julgavam que neles estava posta alguma divindade: até os caminhos entramavam por onde haviam de passar. Foi finalmente tão aplaudida a traça deste Seminário, que à imitação dele levantariam os portugueses outros em diversas povoações, pedindo aos Padres alguns dos meninos por mestres dos deles, assegurando renda que bastava para os sustento de todos.
120. Neste tempo apresentava o Governador-geral, por ordem de elRei vinda de Portugal, uma missão em descobrimento de certas minas do sertão da banda do sul da Bahia, distante mais de 200 léguas (segundo conjecturo, era entre a Capitania do Espírito Santo e Porto Seguro pela terra dentro) mandava uma tropa de soldados sertanejos capazes de aturar aquelas asperezas. Ao som de tambor desta leva não aquietou o espírito do bom Pe. Navarro: era seu ânimo converter a gentilidade do Brasil toda, e das que viera a ele suspirava pela que estava escondida e remontada por essas brechas onde não podia chegar. Agora que vê esta porta aberta, abrasar-se em desejos, pede ao Pe. Nóbrega se aproveita da ocasião, e o mande a ele com título de Capelão daquela gente em busca de almas (pois outra semelhante não se acharia facilmente) e a explorar aqueles sertões, e denunciar por eles a Fé de Cristo: e que por esta via se faziam dois serviços, juntamente a Deus e ao Rei, que não o tinha Capelão que mandar." (Chronica da Companhia de Jesu do Estado do Brasil e do que obrarão
seus filhos nesta parte do novo mundo..., Tomo I. Pe. Simão de
Vasconcelos. LISBOA, M.DC.LXIII - pag.106)
1 comentário:
Quão grandioso é ver como a cristandade no Brasil cresceu! Que maravilha! =)
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