(continuação)
"Marcha Inglaterra, e Espanha
Com muita descompostura,
Quando da França a impostura
Tem posto a França por terra,
Prégar a paz e fazer guerra
Aos que têm mando ou riqueza,
É protecção à Francesa.
Roubar os Templos Sagrados,
Roubar a Casa Real,
Entrar na Patriarcal
Em nove meses um dia!
Portugal, quem tal diria!
Mas este mal que te lesa
É protecção à Francesa.
Entrar nas casas dos grandes,
Destruir o que elas Têm,
Sem lhes custar um vintém,
Querendo afectar por logro
Vilão em casa do sogro:
Tão descarada esperteza
É protecção à francesa.
Dizerem que são Cristãos,
Sendo na Lei mascarados,
Roubar os vasos Sagrados,
Com sacrilégio tremendo,
Na Igreja bestas metendo;
Este insulto, esta baixeza
É protecção à francesa.
Por vingança ir aos Conventos
E com rancor, sem piedade
Matar o Clérigo e o Frade,
As freiras ir perseguir,
E nos seus fazer preza
É protecção à francesa.
Se os Mouros aqui tornassem,
Outro tanto não fariam:
Se os Franceses protegiam
Os mais Reinos desta sorte,
Já sabem que o saque, a morte,
A fome, o engano, a fereza,
É protecção à francesa.
Mandar pôr a gente em marcha,
Ouvir de um Sírio o tambor, ... (4)
Com denotado valor,
Lançar-lhe mão da bandeira,
Vir na gazeta primeira
Por façanha a grande empresa
É protecção à francesa.
De igual forma Dom Quixote
Ao longe os moinhos vendo,
Enrista a lança, e correndo
Esfrangalha, fura, impele,
Mas a quem protegeu ele?
Aos moinhos: tal fraqueza!
É protecção à francesa.
Perder a vida um Soldado,
Que em saques foi cão de fila,
E achar-se-lhe na mochila
Orelhas e mãos cortadas,
De brincos e anéis ornadas,
Este horror da natureza,
É protecção à francesa.
Fuzilar gente nas Caldas,
Sem dó, sem humanidade,
Sofrer igual impiedade
Évora, Beja, Leiria,
Minha pátria: oh tirania!
Este excesso de crueza
É protecção à francesa.
Querer sujeitar o Povo
Com tramóias disfarçadas,
Com compras atraiçoadas,
São acções de alta memória;
E quem ler a nossas História,
Verá, que tanta vileza
É protecção à francesa.
Deixar impunes os crimes,
Quando algum dos seus os faz,
E fuzilar um rapaz, .... (5)
Cuja culpa era a demência,
Faz girar a consciência:
Despotismo sem defesa
É protecção à francesa.
Consentir que a tropa brava
Queime olivais, vinhas corte,
Dando sentença de morte
Aos bois de carro e de nora,
Sem compaixão de quem chora,
E de quem fica em pobreza,
É protecção à francesa.
Podia-se bem compor
Um catálogo de petas
Dos Editais e gazetas
Destes nossos protectores;
Mas serem uns impostores
Com capa de singeleza,
É protecção à francesa.
Porém faça-se justiça;
Nem todas tão maus seriam;
Porque eu sei que alguns viviam
Prudentes, bem inclinados;
Mas em maça incorporados
Seguir do todo a fereza
É protecção à francesa.
Os cem Meninos perdidos, ... (6)
Que não negam que há um Deus,
E que os sentimentos seus
São cheios de honra e constância,
Vem abater a jactância
De uns monstros, cuja altiveza
É protecção à francesa
Isto são puras verdades,
Praticadas sem desculpa:
O Menino não tem culpa;
Tem-na quem o cá mandou:
A Passarola voou,
E se for morta ou for preza
É protecção à francesa.
(4) O Círio da Ameixoeira, com que a Tropa francesa investiu destroçando-o em forma de batalha, em que os franceses venceram a Bandeira de S. Senhora, que veio para o quartel General por testemunho daquela vitória.
(5) Execução feita na Praça do Comércio aceleradamente, sem formalidade de Justiça.
(6) Soldados ingleses tratados por irrizão numa gazeta, pelo nome de cem Meninos perdidos, porque soltaram nas nossas praias, e nossa defesa.
(Tem continuação, aqui)
(Tem continuação, aqui)
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