14/03/12

O NATURALISMO (2)

(continuação)
"Além de que, as leis da natureza, única existência que reconheceis, e declarais imutáveis, são tão simples, claras e compreensíveis? Como as definis) Em que consistem? Acaso as entendeis? Quanto principiam e quando acabem? Onde está a causa íntima e razão de suas funções? Que regra seguides, quando saís de objectos puramente materiais? Se admitis a inteligência, dizei-nos o que ela é? Acaso a calculais, matemáticos? Já a pesastes, físicos? Dissecaste-la, fisiologistas? Como distinguis a alma da animalidade? Que é a vida? E o instinto? E o sentimento? E o pensamento? Questões que não podem ser resolvidas com o aprumo das afirmativas e subtilezas das distinções.

No que respeita à essência de Deus, figura-se-nos grandíssima temeridade marcar-lhe leis, e eternos limites; declarar todas a ordem, acto e fenómeno, está fora da vontade e poder dos soberano ser; que ele não pode querer nem obrar diversamente daquilo que nos entendemos; que as leis gerais lhe bastam, e que ele não tem direito nem poder de entrar ao alcance de nossa vista, na ordem do miraculoso e sobrenatural.

É certo que ele é o ente necessário e imutável; mas esta imudável necessidade está em sua substância e atributos, e não no exercício de seu poder; por quanto, se fosse variável em sua essência, seria imperfeito; se necessitado em suas obras, seria limitado em poder. Deus, por si mesmo independente, não pode se limitado nem depsendente em seus actos. É imudável; mas pode modificar suas obras, objectos estranhos à sua ciência. 

Ele que, no seio da eternidade criou o mundo, sem dúvida o mais espantoso dos prodígios, a mais maravilhosa mutação [mudança], como é possível que depois, regendo o mundo, se haja limitado a uma só ordem imudável e natural, e se faça escravo das regras que impôs e leis que fez? 

Estranha pretensão, quando o sobrenatural é necessário para explicar tantas coisas, quando o mais racional e verosímil nos está afirmando que o sobrenatural faz parte do plano divino! Quando o incompreensível, o invisível, o maravilhoso nos cercam por toda a parte! Quando, perante a razão e consciência, são tantos os factos que não podem naturalmente entender-se! Quando o presente, passado e o futuro são enigmas e abismos, sem o sobrenatural! Quando a criação é impossível, se o rejeitam! Quando a imortalidade é gravemente predicada se o repelem!

Efectivamente, a vida futura está em grave risco de nada ser para os doutrinários do naturalismo, sem excepção daquele que se honram de espreitar os grandes princípios da lei moral. Em verdade, Deus é o fim do homem; notem porem, que é o fim sobrenatural. O homem, que nasce e vive este mundo, aqui deve cumprir naturalmente seu fim, material e inteligente, preenchendo com o duplo meio de razão e corpo. Que haverá para além da vida? Se falhais de recompensas futuras, que sabeis vós disso? Como podereis entender o invisível, o incompreensível e insondável por ilações que tirais do que vedes, sentis e compreendais? Quantas leis declarais imutáveis [o mesmo que “immudáveis”], o incompreensível e insondável por ilações que tirais do que vedes, sentis e compreendeis? Quantas leis declarais imutáveis e necessárias, para este mundo foram feitas. Transportai-as a outra parte: como serão elas aí aplicadas? Segundo vós, deste mundo nada sai. No mundo de ver um grande número dos vossos, o instinto religioso não passa de uma faculdade natural do homem. Convencei-vos de que os futuros prémios nada tem comum com as leis da terra. Da vida além não há naturalismo: reina o sobrenatural."

(AQUI, a continuação)

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