(continuação do "Freud em Cifra I")
O Freudismo em Cifra
É o mais importante dos movimentos empiristas da Psicologia do século passado. Nascida como análise terapêutica para a cura da neurose (“psicanálise”) desdobrou-se logo numa doutrina psicológica e vulgar, que pode chamar-se de mitologia, fundada toda ela em 40 anos de tenaz investigação de Freud (1856 - 1939) – Obras Completas em castelhano, 20 tomos, trad. López Ballesteros, Biblioteca Nueva, Madrid, 1930).
Tendo curado em 1892, em colaboração com o doutor Breuer, e por meio da hipnose, um caso de histeria, o jovem judeu vienense, discípilo de Charcot na Salpetrière e depois de Bernheim en Nancy (ou seja, em posse de toda a novísima psiquiatria da escola francesa , “Les Medictations Psychologiques”) achou de rajada nessa experiência clínica os elementos do seu “método catártico” de purificação mental ou liquidação psicológica, a saber:
1) aexistência do “Inconsciente” (subconsciência) a região do psiquismo desapercebida e activa, cuja exploração será desde então seu objecto;
2) o “trauma”, causa da neurose, que Freud fixou como atropelo sexual sofrido em tenra idade; e depois ampliou bastante, contudo conservando seu carácter sexual;
3) o “complexo” ou imagem patogénica, “repelida” e oculta;
4) o “sintoma” ou forma patente em que ela emerge, já disfazada;
5) a “censura”, mecanismo psicológico que bloqueia a imagem e a oculta;
6) a cura ou correcção do mal, por elucidação a fundo, ou seja um “reviver provocado”.
Freud abandonou logo depois a hipnose, usada neste caso, por outros métodos de “exploração psicológica” mais normais e refinados. Este método terapêutico continha já o esboço duma explicação causal dos transtornos psíquicos, com o gérmen de todos os temas especiais do freudismo, ou seja, de uma doutrina psicológica:
1 ) o famoso e discutido “pansexualismo” na sua noção de “Libido” (o “eros” em sentido amplo , não somente o instinto sexual formado) convertido em motor central e único da afectividade humana;
2) o “Complexo de Édipo”, pecado original natural da espécie humana, consistente na aversão ao pai (no varão) e atracção libídica à mãe;
3) uma teoria do automatismo dos “actos falhados”, do sonho , da piada, de todos os “sintomas”, e incluso (mais tarde) da angústia e da agração, em função do “Inconsciente”; com regras para a sua interpretação;
4) a divisão do psiquismo em três zonas, o “Isso”, o “Eu” e o “Supereu”;
5) a teoria da “sublimação” a transferência do dinamismo sexual para a actividade ideal, científica, artística ou filantrópica, não a religiosa;
6) uma nova classificação da neurose em “neurose actual” e “psiconeurose” (neurastenia e histeria) que compreende seis membros;
7) uma teoria pormenorizada das aberrações sexuais e a evolução (que não é evolução mas transferência) da Libido infantil – doutrina fundamental, à qual Freud na sua terceira época juntou outras peças, às vezes contrárias , como a teoria dos “instintos de Norte” (Thánatos) e a noção de “Angústia – causa” (neurose de guerra).
Penetrando e informando esta doutrina, que se ia subtilizando e complicando, existia sem dúvida uma filosofia antropológica, que se pode enraizar no voluntarismo pessimista de Schopenhauer e Hartmann e o materialismo empirista de um Bücher e um Meynert. Maritain na sua conferênica em Buenos Aires (1938, incluída mais tarde em “Quatro ensaios sobre o espírito na sua condição carnal”, Dededec, Buenos Aires, 1939, pág. 17) distinguiu, distinguindo a Dal biez, o “método” psiquiátrico, a doutrina psicanalítica e a “filosofia freudiana”: qualificando o método de “investigação genial” á filosofia de “quase demente” (apoiado nisto por grandes nomes, como Max Scheler, Klagues, Prinzhorn, De Sanctis, Bergson, Ramón e Cajal, Dalbiez) mas a doutrina como um aporte psicológico importante, “cujas ideias, activadas por um assombroso espírito de investigação, estão arruinadas no entanto por um empréstimo radical e por uma metafísica aberrante, incosciente de si mesma”.
O bloco dissociou-se em seguida na escola vienense, com os cismas de Adler, Allers e Jung, que rejeitaram o “pansexualismo” mesmo não o fazendo com o “monoinstintivismo”, levando-se a análise; mas repondo o núcleo activo da vida psíquica e no “Imperium” (impulso de superioridade, Adler) já na “Pulsão Vital” (Jung). Mutissimas outras divergências parciais se produzem: Pfister, a escola de Friburgo, Rank, Hesnard, Maeder, e a escola de Zurique, Claparéde; mas Freud permanece fiel à Libido. Ela é submetida fora do freudismo ortodoxo a uma evolução conceptual; que vai desde Dalbiez, que a delimita, até Súllivan, que a transforma.
No decurso de sua vida Freud estendeu a sua teoria a todos os domínios da antropologia; à arte, à vida colectiva, à psicologia de massas, a pré-história social, a cultura, a religião à qual se declara amargamente hostil no seu livro póstumo (Der mann Moses und die monotheistische Religion, Londres, 1939) síntese e topo das suas ideias “teológicas” em três livros anteriores: “O provenir de uma Ilusão” (1926), “Uma experiência religiosa” (1913) e o tratado mais extenso “Totem e Tabu” datado de 1913; de modo que para os docentes cristãos é um heterodoxo; e Bolloc chama-o “parte da grande heresia contemporânea”.
(continuação, AQUI)
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