26/10/18

O MASTIGÓFOTO - ("Inventários") a

Mosteiro da Seiça
Inventários - Como estes actos jurídicos trazem muitas vezes associada a ideia da morte, bem se viu o que eles queriam dizer, quando se fizeram em vida por aresto dos Clubs Maçónicos aos Mosteiros, e Casas Religiosas de pessoas de ambos  os sexos. Foi necessário que se tomassem a rol estes bens nacionais, para que os seus possuidores há séculos não fossem por aí deitar-lhes a mão, julgando que eram coisas suas; pois a condição tácita dos benéficos doadores foi, que a pena saíssem a Lume os filantropos Mações, tudo lhes pertencesse de juro, e herdade para os gastinhos patrióticos das Lonas, das Colunas, das Mitras, e das Trolhas; e assim como para a fundação das Monarquias existiu um "Pacto Social" também pelos mesmos fundamentos se pôde mostrar, que existiu um Pacto Laboral, por cuja virtude quanto se deu aos Frades, e às Freiras levou anexa a condição, de que só o desfrutariam até chegarem os Cavalheiros Escoceses, e os caraçudos Vigilantes, e os abalizados Mestrinhos, que pela ardente devoção de regenerarem o mundo, ipso facto, ganharam direito para ficarem senhores do mundo, sem o haver para se lhes ir à mão; direito arquitetado pelo génio (do mal) e conservado pelas artes (diabólicas) do Maçonismo, que depois de pôr tudo a pão, e laranja, se entronizaria sobre o Portugal Regenerado, e de sobrolho caído para quem se lhe viesse queixar de fome, em consequência das novas instituições, daria remédio a tudo,  com meia dúzia de palavrinhas mágicas. "Esta obra é minha, o meu génio a cunhou, nasceu das maduras meditações dos antigos e modernos tempos, etc., etc. e o mais é, que só isto bastaria para remédio das cruzes na boca, ainda que estas mesmas já seriam crimes gravíssimos no 5º ano Constitucional! Ora cada um, diz o ditado, chega a braza à sua sardinha, e como estes Inventários me deram sempre no goto, hei de oferecer aos meus Leitores o que já sucedeu neste Reino, há mais de cem anos (1690) quando  Senhor D. Pedro II exigiu um rol, ou inventário (que não teve efeito) dos bens das Ordens Religiosas, que lhe endereçaram a seguinte:

PETIÇÃO

Cópia da Petição que fizeram as Religiosas todas a Sua Majestade, sobre a notificação que se lhes fez, para haverem de dar conta por um Rol das Fazendas que possuem.

Senhor, as Religiosas desta Coroa nas Pessoas de seus Superiores estão notificadas da parte de Vossa Majestade por Ministros Seculares, que dentro de certo tempo deem aos ditos ministros Roles das Fazendas que possuem, sob pena de Sequestro, e perdimento delas, não o fazendo assim dentro do dito tempo assinado; e porque no cumprimento desta notificação há dificuldades gravíssimas, e riscos certos da consciência, que sendo presentes a Vossa Majestade haveria por bem mandar prover em negócio de tanto porte por outro modo que fosse servido: Portanto as Religiões [ordens religiosas] por seus Procuradores gerais abaixo assinados, posto aos pés de Vossa Majestade com a humildade, e reverência que devem a seu Rei e Senhor natural.
Dizem que elas estão prestes para servir a Vossa Majestade com a Fazenda, trabalhos, e vida de seus Súbditos como sempre fizeram no tempo das guerras deste Reino com Castela, concorrendo para a defesa da liberdade com donativos consideráveis, e o fazem, mandando seus Súbditos às Conquistas desta Coroa para nelas ajudarem as almas em serviço de Deus, e de Vossa Majestade, e da mesma maneira estão pres para fazerem tudo o que Vossa Majestade lhes ordenar, e de presente ordena na sobredita notificação em quanto salva a consciência o poderem fazer, por que esta é também a vontade de Vossa Majestade, que como Rei tão Católico e Zeloso do Serviço de Deus; Defensor do Estado Eclesiástico: Amparo das Religiões [ordens religiosas] da sua Monarquia, a este fim dirige suas Reais acções, e por que entendem que de nenhum modo podem sem ofensa de suas consciências concorrer na execução desta notificação, por ser o tal concurso contra a serva proibição, com que os Sagrados Cânones, e Santo Concílio Tridentino sobre gravíssimas penas proíbe e condena aos que de algum modo consentem, ou concorrem contra o quebramento, e violação da imunidade da Igreja, que não é de crer permita a piedade e Católico Zelo de Vossa Majestade, se já violada, sendo dela Potector, e Defensor. E outro sim, por que esta mesma notificação se fez já em tempos antigos, e consideradas as razões, que obstavam à execução, se mandou desistir dela, o que tudo se fará presente sendo Vossa Majestade Servido: portanto

P. humildemente aos pés de Vossa Majestade, suposto o referido, gravidade deste negócio [assunto], e grave escrúpulo de consciência em que se acham, seja Servido mandar considerar por pessoas doutas e desinteressadas, e de sã consciência a razão de escrúpulo, que impede esta execução, se dado que se houvesse de fazer, deve ser por ordem do Sumo Pontífice, ou de seu Núncio neste Reino, para poderem sem escrúpulo de pecado, e de incorrerem nas penas dos Sagrados Cânones, executar prontamente o que lhe está notificado, porque tirando este justo temor, estão prontos para executarem o que Vossa Majestade lhes manda.

Está visto o que pensaram os nossos maiores sobre este grandíssimo assunto, e é bem sabida a opinião dos modernos, que fariam processar, e castigar os seus autores, assim como perseguiram o Padre José Morato, e desterraram para fora do Reino o Padre Biancardi da Congregação de S. Vicente de Paulo, por ter alegado em contraposição ao saque dos Mosteiros, o disposto no Sagrado Concílio de Trento! Ora eu não hei de vir do outro mundo pregar a este certas verdades, que muito amargam ao Século das Luzes. Suceda pois o que suceder…. Já que este propósito da jurisdição em causas Sagradas, que os Liberalíssimos Canonistas dão aos Príncipes, só com o fim de atenuarem a Igreja, e roubarem os Império esse baluarte firmíssimo do Sacerdócio, que é constantemente o primeiro investido, quando se trata de conquistar, e render aquele outro, se faz cada dia mais importante, em razão de novas, e incansáveis diligências, para que fiquem em pé, ou revivam as ideias Constitucionais, seja-me permitida neste lugar uma sucinta exposição dos estratagemas da Seita, para levar ao cabo as suas malvadas pretensões. Vendo que a nossa Religião fazia dever de consciência o rendimento, e a mais inteira sujeição aos Príncipes, cujos tronos se queriam solapar, ou destruir, acharam no seu caminho, ou Príncipes voluptuosos, e dissipados como Henrique VIII de Inglaterra, ou Príncipes aferrados à crença dos seus maiores, e inabaláveis em pontos de Religião, quais têm sido os nossos Piíssimos Soberanos. Acenaram aos primeiros com o engodo das riquezas do Clero, e lisonjeando desta arte a sórdida avareza, que os consumia, puderam alcançar dentro em poucos anos, com a extinção da verdadeira Fé, a extinção dos Mosteiros na Inglaterra, e na maior parte da Alemanha. Foi-lhes necessário usar de mais astúcia com os outros, que longe de caírem no sobredito laço, olhariam com desprezo a cólera para quem lhes indicasse tão violentas, e sacrílegas medidas…. Começaram de pintar-lhes a Igreja como usurpadora dos direitos da Realeza, encareceram a desmedida opulência dos Eclesiásticos, motejaram de que eles se quisessem livrar dos encargos públicos, taxaram de filha dos tempos escuros a imunidade Eclesiástica, e por saberem perfeitamente, que a Igreja Romana, verdadeira Mãe e Mestra de todas as Igrejas, acudia sempre às Igrejas Particulares em seus maiores trabalhos, conseguindo muitas vezes da piedade dos Soberanos, tudo quanto podia, ou aliviá-las, ou melhorá-las; e que por este motivo nunca se deitava numa só contribuição do Clero, em que não fosse ouvido e acatado o Pastor da Igreja Universal, contra este dirigiram os seus primeiros tiros, e daqui veio na maior parte das Escolas da Europa, uma tendência constante, e pronunciada contra os direitos e prerrogativas da primeira das Igrejas do Orbe Católico. Daqui procedeu um atrevido exame dos direitos do Primado, e foram tidos na conta de homens grandes, todos aqueles Teólogos e Canonistas, que mais furiosos se mostraram em seus ataques ao Trono Pontifício. Houve Reino da Europa (ninguém sabe qual é) em que se perdoou a um Teólogo assalariado para combater a Igreja de Roma, um sem número de citações infiéis, e um despejo, qual eu não me atreveria a usar, ainda que se tratasse de um simples Pároco, que mais tivesse faltado aos seus deveres! Sobre esta inclinação para diminuir a chamada perigosa influência da Côrte de Roma foram traçados esses próprios Livros, que o Santo Padre feria em Roma com os seus anátemas. O Jansenismo, que desde o seu berço guarda como reposto no fundo da alma o entranhável desejo de acabar com a Sé Apostólica Romana, foi recebido nas aulas com os braços abertos, e com toda a pompa de um Libertador, que vinha rasgar o véu da supersticiosa ignorância, que vendara os olhos da Igreja até ao século XVIII … Compare-se a exclamação de D. Frei Bartolomeu dos Mártires ao entrar na Capital do Mundo Cristão, referida pelo seu Historiador o grande Frei Luís de Sousa, com os sentimentos de uma boa parte do nosso Clero Superior e Inferior, e digam-me que sou temerário, se julgo descobrir duas Igrejas totalmente diversas uma da outra? Que grandes juízes faz preeminências do Santo Padre os Eibels e Cavalários condenados em Roma!! Ora que os Protestantes reverenciassem os autores, que se chegam muito às suas doutrinais, por certo que não é de estranhar, mas que os Portugueses cumulados de benefícios pela Igreja Romana, se encarniçassem de tal modo contra ela, que já fosse moda em a Universidade, e em Colégios Seculares sustentar, que o Papa é falível, que a Igreja não tem propriedade, que os Reis têm um poder absolutos de lançar mão, quando lhes parecer, dos bens do Clero!! Que houvesse Professores desvelados em sonhar questões, em que o Papa descesse a um papel subalterno, e o mais impróprio da sua altíssima dignidade!! E que fossem estes os passos que levaram mais de um Professor aos assento na Cadeira dos Apóstolos!!! Que eles nas suas correspondências familiares, que eu li com horror! exaltassem até às nuvens o zelo de Cipião Ricci, e dos Padres do Concílio de Pistoia, e se congratulassem da quebra dos direitos Pontifícios!!! Oxalá que tudo isto não fosse verdadeiro, e que eu nunca tivesse de passar pelo vivo dissabor de manifestar estas nódoas da Igreja Lusitana! Deram tudo ou quase aos Reis, arquitetaram uma Religião Política, e que fizeram com isto? Adiantaram por ventura a Causa do Trono? Encheram os cofres dos Soberanos? Curaram as feridas da Pátria? Ah! Se os Canonistas, e Jurisconsultos Liberais se doem da acrimónia de uma repreensão sobejamente merecida, ao menos queiram reflectir sobre a própria confissão dos bens da Igreja, e os esbulho da influência do Papa, e vejamos como eles não se pejam de afirmar, que conseguido o desbarate do principal exército, que defende os Tronos, já lhes não resta se não abalá-los, e destruí-los à vontade. Esses infelizes Membros do Parlamento de França, que tão emprenhados se mostraram por tirar a influência, e diminuir os padres do Clero, foram uns agentes da Maçonaria, e embriagados com o aplauso de que eram homens grandes, humilharam a Igreja, sem advertirem, que ao menos passo humilhavam o Trono, e preparavam a guilhotina, que havia de sacrificar Luís XVI. "Se a antiga Religião dominante (eis aqui as palavras do Ministro da Polícia Geral, às administrações centrais, municipais, etc. em 9 de pluvioso ano 7º) não era menos o Código das Instituições da Monarquia, do que um Código Religioso, é nas absurdidades do fanatismo, que se tinha escondido a base subterrânea de um governo absoluto: eis aqui o motivo porque os defensores do Altar, e do Trono, sempre têm andado a par, e nunca separaram a sua causa; eis aqui o motivo porque depois da queda da Monarquia, o poder público tem vindo reclamar sucessivamente as partes da autoridade, que eram espontaneamente da sua jurisdição, e que o Sacerdócio tinha invadido, ou ante, que os Reis tinham abandonado ao Sacerdócio, a fim de casarem, e cimentarem um pelo outro, os seus poderes respectivos, etc."

Que testemunho este, de que as Instituições Monárquicas se firmam nas ideias religiosas, e que esse chamado poderio do Clero era o mais seguro alicerces em que descansavam os Tronos!!

(continuação, parte b)

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