10/02/17

CONTRA-MINA Nº 45: Verdadeiros Interesses da Espanha ... (II)

(continuação da I parte)
 
Ora uma das primeiras necessidades, e por certo o maior interesse das almas generosas, é o de se mostrarem agradecidas aos seus benfeitores, quando estes sofrerem, e quando padecem; quando estão ameaçados de morte, é que mais cresce o empenho, e o desejo de satisfazerem uma dívida, que só é pesada aos corações vis, rasteiros, e degenerados...
 
Fernando I de Leão, o Magno
Temos acudido à Espanha todas as vezes que ela nos chamou, ou careceu do nosso auxílio. Portugueses, (e que Portugueses!) foram grande parte na tomada de Coimbra por Fernando Magno, assistiram à expugnação de Toledo, combateram em Alarcos, apressaram o rendimento de Sevilha, e derrotaram em 1340 um dos maiores Exércitos, que os Mouros puseram em Campo, e que tal medo incutira ao Rei Castelhano, que mandou expressamente a este Reino a Soberana sua Consorte, para que instasse com seu Augusto Pai o Senhor D. Afonso IV, a fim de que os Portugueses o livrassem do apuro, em que se via; e o nosso Poeta, que referindo este caso não desmente um só ápice a verdade histórica, põe na boca dessa aflita, e consternada Rainha as seguintes frases:
 
Por tanto, ó Rei, de quem com apuro medo
O Corrente Mulucha se congela;
Rompe toda a tardança; acude cedo
À miseranda gente de Castela:
Se esse gesto, que mostras claro, e ledo,
De Pai o verdadeiro amor asselha,
Acude, e corre, Pai, que se não corres,
Pode ser que não aches quem socorres.
 
Acudiu efectivamente o Rei Português, e seguiu-se a Victória do Salado. Mas para que é acumular sucessos antigos, de que por tantas vezes me tenho recordado neste Periódico? ... Os modernos têm sido muitos, e bem palpáveis, e sobejam para o caso presente, que por si mesmo demanda, e como exige dos nossos honrados vizinhos a mais estreita reciprocidade; mas caso dado, que a mais bem merecida gratidão fosse posta de parte, e que a Nação Espanhola, o que é incrível, nos desamparasse de todo, instam por outro lado motivos poderosíssimos, e dos quais mais costumam influir no coração humano, quero dizer, os interesses próprios; o que devereis expender um pouco mais largamente. Quem se persuadir, que o intento da Esquadrilha Maçónica é somente empossar-se de Lisboa, e do Reino de Portugal, não só poderá ser arguido de vista curtíssima; porém deverá ser chamado rigorosamente uma toupeira em assuntos, e matérias políticas... A tomada de Lisboa seria simplesmente um acessório, seria simplesmente um degrau, para subirem a coisas maiores. Já em 1820 se fez uma íntima aliança entre os Pedreiros Portugueses, e Castelhanos, e por sinal, que estes mandaram grandes somas, para que se efectuasse a Revolução do Porto em 1820... Desde então que se trata somente de se fazer uma espécie de maciço Liberal, um todo compacto, e unido, e que na Península das Espanhas haja um só Governo, e uma só Influência toda Maçónica, o que traz consigo necessariamente a deposição dos actuais Soberanos... Os Reis Fidelíssimos, e Católicos são estes Soberanos reprovados pela alta, e baixa Maçonaria, o que só de per si era bastante, para lhe conciliar o amor dos seus povos, e todo o empenho, que eles mostram pela segurança dos seus Tronos... Ainda em 1828 persistia a mesma ideia de se revolucionar a Península; e entre os papeis de um dos Generais da Tropa rebelde, se encontraram os mais decisivos argumentos, de que a desentronização dos Reis, fatais para a Maçonaria, isto é, do Senhor D. MIGUEL I, e do Senhor D. Fernando VII é, e nunca deixará de ser o alvo de todas as empresas Maçónicas, que disserem algum respeito à Península das Espanhas... Este segredo político, se ainda houver quem o trate, como tal, já deixou de o ser; e nas próprias Sessões do Parlamento Britânico, foi o Demosthenes Inglês, (hei de conservar-lhe o nome, que lhe deu o mais eloquente dos Portugueses antigos, e modernos) foi Lord Aberdeen, quem disse em voz clara, e inteligível, que o desígnio dos Liberais é fazerem D. Pedro de Alcântara, o ex-Defensor Perpétuo do Brasil, Rei, ou Imperador Constitucional das Espanhas, a quem D. Maria da Glória (acrescento eu) faria em Lisboa a mesma segunda, que o chamado Rei de Roma fazia a seu Pai Napoleão Bonaparte.
 
Daqui se vê, que o primeiro tiro, que a Esquadrilha disparar contra as fortificações, ou torres de Lisboa, deverá forçosamente ressoar até às alturas, até aos próprios cabeços das montanhas, que dividem a Força da Espanha; deverá ser o canhão d'alarme, que chame às armas todos os habitantes da Península, que forem capazes de as cingirem. Não venho a dizer com isto, que os Reinos da Espanha sejam necessariamente engolidos, em ar de almoço, pelos Exércitos Luso-Maçónicos. Dou muito pelos Voluntários Realistas de Espanha, onde não se come gato por lebre; dou muito pela firmeza, com que são mantidas invariavelmente as suas instituições políticas; dou muito pela nobre independência, com que se tem havido tantas vezes, a despeito de intrigas, e ameaças... dou tudo pela execução fiel do Plano "Anti-Maçónico, o mais simples e o mais terrível para a Seita. Metade na forca, e outra metade nula, fora dos Empregos, e sem o mais pequeno influxo, ou mostra de autoridade..". Nesta parte declaro-me absolutamente a favor dos Castelhanos, que ainda metidos entre dois fogos ostentariam as suas forças, e pode ser, que zombassem dos seus mais poderosos inimigos; o que tanto mais se reforça quanto é certo, que no caso imaginado, ou imaginário, que D. Pedro vencesse Portugal, teríamos necessariamente concluída em breves dias uma nova, e muito mais avultada emigração de tudo, quanto fosse verdadeiramente Português; e oferecendo os nossos braços, recursos, e vidas ao Rei Católico, ainda poderíamos tomar uma parte bem activa, e importante na Liberdade da Península.... Desenganem-se de uma vez os Leais Portugueses, e sirva esta ideia, não para lhes inspirar sentimentos de cobardia, e pusilanimidade; mas para lhes designar meramente, o que ainda nos resta nos casos mais infelizes, e desesperados.... Temos em a nossa retaguarda uma grande Nação Católica, e fiel ao nosso Deus, e aos seu Rei, e onde os Negros, ou Malhados nem sequer ousam abrir bico; onde os suspeitos são vigiados de contínuo, são excluídos da mais pequena governança, até nas mais insignificantes aldeias, e longe de porem pé em ramo verde, como fazem tantos, e tantos, que eu conheço em Portugal, nem sequer podem trazer consigo um triste canivete de aparar penas, visto que todas as armas, que toda a força, e autoridade está na mão dos verdadeiros Realistas único modo de quebrar as forças à Maçonaria, que tudo o mais é andar às cegas, ou perfeitamente às escuras, e em perigo contínuo de esmigalhar a cabeça, e perder a vida... Ora no meio de tudo isto não se pode negar, que terrível coisa é um mau vizinho ao pé da porta, e que certamente é do maior interesse para as Espanhas, que o ex-Defensor perpétuo do Brasil não chegue a ser Defensor momentâneo da Cidade de Lisboa... Muito enganada vem, ou quer vir a este Reino, a por muito desejada, Esquadrilha, que em seu próprio nome encerra a mais exacta, e verdadeira definição da sua índole, e dos seus principais intentos.
 
És: Quadrilha de Salteadores, que vens roubar, e por isso te acenam com os tinteiros, e castiçais de prata, em que esperas cavar a tua cobiça... És: quadrilha de Ladrões, que desejas continuar as pavorosas cenas, que se passaram desde 1820 até 1823, cresce-te a água na boca ao lembrarem-te aqueles 4800 réis diários, com que podias regalar-te, e até levantar casa de sobrado!! Comeste por uma vez... e como todos os bons Portugueses sabem optimamente, que és: quadrilha composta de aventureiros de todas as Nações, por isso ardem nos mais vivos desejos de te fazerem uma boa montaria, de que sairás, eu to afianço, bem escarmentada..... Ainda que sejas quadrilha numerosa, de uns 10$ [10.000?] como dizem, para este número sobejaram os chuços dos nossos Paisanos... e neste conflito não imitarás a sorte dos dez mil Gregos comandados por Xenofonte; e não se iluda o teu Comandante Grego com estas paridades Históricas, pois não há de escapar, nem meio; e tais migas aparecerão em nossas praias, que nem as do Campo de Alfarrobeira, que se fizeram do ensanguentado cadáver do malfadado Conde de Abrantes, lhe empatarão as vazas...
 
Desterro 11 de Janeiro de 1832.
 
Fr. Fortunato de S. Boaventura.
 
(Em o Número 44 deste Periódico Pag. 10 linha 32 onde se lê "Pio VIII" leia-se "Pio VII contra os Pedreiros Livres"; e pág. 11 linha 15 onde se lê "defender" leia-se "desfazer".)
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LISBOA
Na Impressão Régia. 1832
Com Licença

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