22/03/16

A SEMANA SANTA - Sto. AFONSO DE LIGÓRIO III (Terça Feira)

(ver anterior: Segunda Feira)


TERÇA-FEIRA SANTA
Jesus é coroado de espinhos e apresentado ao povo

Et plectentes coronam de spinis, posuerunt super caput eius - "E entrançando uma coroa de espinhos lha puseram na cabeça" (Math. 27,29).

Sumário - Depois de terem açoitado a Jesus, os algozes, tratando-o como rei de comédia, atiram-lhe sobre os ombros um manto de púrpura, colocam-lhe um caniço na mão, e põem-lhe na cabeça uma coroa de espinhos, na qual batem fortemente com o caniço, afim de que penetre mais. O Senhor ficou reduzido a tão triste estado, que Pilatos julgou que comoveria de compaixão os próprios inimigos, só com apresentá-lo. Contemplemo-lo também, e pensando que foi tão maltratado por nosso amor, não tenhamos a crueldade de dizer com os Judeus: Crucifigatur - "Seja crucificado".

I. Contemplemos os outros bárbaros suplícios que os soldados infligiram a nosso Senhor já tão atormentado. Instigados, e, como afirma São João Crisóstomo, subornados pelo dinheiro dos Judeus, reúnem ao redor de Jesus toda a côrte, põem-lhe aos ombros um manto vermelho a servir de manto real, nas mãos colocam-lhe um caniço a servir de ceptro e na cabeça um feixe de espinhos a servir de coroa. Os espinhos estavam entrelaçados em forma de capacete, de modo que lhe cobria a cabeça toda: Et plectentes coronam de spinis, posuerunt super caput eius

Mas, porque os espinhos com a força das mãos não penetravam bastante na cabeça sagrada, já tão ferida pelos açoutes, tomam-lhe o caniço, e enquanto lhe escarravam também no rosto, batem com toda a força sobre a cruel coroa, de sorte que rios de sangue corriam da cabeça ferida pelo rosto e sobre o peito. Ah, espinhos ingratos! é assim que atormentais o vosso Criador? – Mas, para que acusar os espinhos? Ó pensamentos perversos dos homens, sois vós que trespassastes a cabeça do meu Redentor.

Eia, minha alma, prostra-te aos pés de teu Senhor coroado; detesta ali os teus consentimentos pecaminosos, e roga-lhe que te trespasse com um daqueles espinhos, consagrados pelo seu preciosíssimo sangue afim de que não o tornes mais a ofender. – Enquanto os bárbaros algozes, juntando o escárnio à dor, o tratam como rei de comédia, dele motejam e o esbofeteiam, tu, pelo menos, reconhece-o pelo supremo Senhor de tudo, como na verdade é; feito agora Rei de dor por amor dos homens. 

II. Voltando outra vez a Jesus ao pretório de Pilatos, depois da flagelação e coroação de espinhos, este, ao vê-lo todo dilacerado e desfigurado, capacitou-se de que comoveria o povo à compaixão, só com mostra-lo. Saiu, pois, para a varanda com o nosso aflito Salvador, e disse: Ecce Homo - "Eis-aqui o homem". Como se dissesse: Judeus, contentai-vos com o que este inocente tem sofrido até agora; vede a que estado se acha reduzido. Que medo ainda podeis ter que ele queira fazer-se vosso rei, visto que não pode mais viver? Deixai-o ir morrer em sua casa. Exivit ergo Iesus, portans coronam spineam, et purpureum vestimentum - "Jesus saiu, coroado de espinhos, e vestido de um manto de púrpura". Minha alma, tu também contempla naquela varanda a teu Senhor, ligado e arrastado por um algoz. Vê-o, como ali está meio despido, se bem que coberto de chagas e sangue, com as carnes todas rasgadas, com aquele farrapo de manto purpúreo, que serve tão somente para escarnecê-lo, e com a cruel coroa que continuamente o atormenta. Vê a que estado se acha reduzido o teu Pastor, para te achar, a ti, sua ovelha perdida. 

Ah, meu Jesus! Quantos papeis de teatro fazem-Vos os homens representar, mas todos eles de dor e de ignomínia. Ó dulcíssimo Redentor, inspirais compaixão às próprias feras, mas aí não achais piedade! Ouve o que aquele povo responde: Crucifige, crucifige eum! - "Crucificai-o, crucificai-o!" Mas, ó Senhor meu, o que dirão no último dia, quando Vos virem na glória, sentado como Juiz num trono de luz? Ai de mim! Jesus meu, houve um tempo em que eu também disse: "Crucificai-o, crucificai-o!" Foi quando Vos ofendi pelos meus pecados. Agora arrependo-me deles mais que de todos os outros males, e amo-Vos sobre todas as cousas, ó Deus de minha alma. Perdoai-me pelos merecimentos da vossa Paixão. – Ó Mãe das dores, Maria, fazei que no dia do juízo eu seja vosso Filho aplacado, e não irado para comigo. (* I 613.) 


Meditação para a tarde
Jesus é condenado e vai ao Calvário

Tunc ergo tradidit eis illum ut crucifigerent - "Então entregou-lhes Jesus, para ser crucificado" (Io. 19, 16).

Sumário - Imaginemos ver Jesus Cristo que escuta a injustiça sentença de morte, aceita-a por nosso amor, e abraçando a cruz, se encaminha para o Calvário. Os Judeus temendo que a cada momento expire, e desejosos de o ver morrer crucificado, obrigam a Simão, e abraçando com resignação a nossa cruz, carreguemo-la atrás de Jesus, que no-la manda para nosso bem.

I. Considera como Pilatos, depois de proclamar diversas vezes a inocência de Jesus, finalmente a torna a proclamar, lavando as mãos e protestando que é inocente do sangue daquele justo. Se, pois, havia de morrer, os Judeus deveriam responder por ele. Em seguida lavra a sentença e condena Jesus à morte. Ó injustiça nunca jamais vista no mundo! O juiz condena o acusado ao mesmo tempo que o declara inocente!

Lê-se a iníqua sentença de morte na presença do senhor condenado; este escuta-a, e todo conformado com o decreto de seu Eterno Pai, que o condena á cruz, aceita-a humildemente, não pelos delitos que os Judeus lhe imputavam falsamente, mas pelas nossas culpas verdadeiras, pelas quais se tinha oferecido a satisfazer com a sua morte. Na terra Pilatos diz: Morra Jesus; e o Pai Eterno confirma a sentença no céu dizendo: Morra meu Filho. E o mesmo Filho acrescenta: Eis-me aqui, obedeço e aceito a morte, e a morte de cruz: Humiliavit semetipsum, factus obediens usque ad mortem, mortem autem crucis - "Humilhou-se a si mesmo, feito obediente até á morte, e morte de cruz".

Meu amado Redentor, aceitais a morte que eu devia sofrer, e pela vossa morte me alcançais a vida. Agradeço-Vos, ó amor meu, e espero ir ao céu para cantar eternamente as vossas misericórdias: Misericordias Domini in aeternum cantabo. Mas, já Vós inocente aceitais a morte de cruz, eu pecador aceito de boa vontade a morte que me destinais; aceito-a com todas as penas que a tenham de preceder ou de acompanhar, e desde agora ofereço-a a nosso Eterno Pai em união com vossa santa morte. Vós morrestes por meu amor, eu quero morrer por vosso amor.

II. Lida a sentença, o povo desgraçado levanta um brado de júbilo e diz: "Felizmente Jesus é condenado à morte! Vamos depressa, não percais tempo, preparar-se a cruz, e façamo-lo morrer antes do dias de amanhã, que é a Páscoa". - E no mesmo instante agarram a Jesus, tiram-lhe o manto vermelho dos ombros e entregam-lhe os seus próprios vestidos; afim de que, segundo diz Santo Ambrósio, fosse reconhecido pelo povo por aquele mesmo impostor (assim o chamavam) que poucos dias antes fora recebido como Messias. Depois tomam duas rudes traves, que compõem em forma de cruz, e mandam-lhe com insolência que a leve sobre seus ombros até ao lugar do suplício. Ó Deus, que crueldade, carregar com tamanho peso um homem tão maltratado e enfraquecido!

Jesus abraça a cruz com amor e encaminha-se para o Calvário. O seu aspecto naquele caminho é tão lastimoso, que as mulheres de Jerusalém, ao vê-lo, o acompanham, chorando e lamentando tamanha crueldade. Mas, nem assim os pérfidos Judeus são levados à compaixão! Ao contrário, desejando, por um lado, ver Jesus crucificado, e, por outro, temendo que expirasse no caminho, visto que caía quase a cada passo, tiraram-lhe a cruz dos ombros e obrigaram certo homem, de nome Simão, a carregá-la. Minha alma, une-te ao ditoso Cyreneu; abraça a tua cruz por amor de Cristo, que por teu amor padece tanto. Vê como ele vai adiante e te convida a segui-lo: Qui vult venire post me, tollant crucem suam, et sequatur me - "Se alguém quiser vir após mim, tome a sua cruz e sigam-me".

Não, meu Jesus, não quero deixar-Vos; quero seguir-Vos até morrer. Pelos merecimentos desse caminho doloroso, dai-me força para carregar com paciência a cruz que quiserdes mandar-me. Ah! Vós nos fizestes minimamente amáveis os sofrimentos e os desprezos, abraçando-os por nós com tanto amor! – Ó Mãe de dores, Maria, rogai a vosso Filho por mim.

(continuação, Quarta Feira)

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