24/03/16

A SEMANA SANTA - Sto. AFONSO DE LIGÓRIO V (Quinta Feira)

(ver anterior: Quarta Feira)


QUINTA-FEIRA SANTA
O dia do amor

Sciens Iesus quia venit hora eius, ut transeat ex hoc mundo as Patrem, cum dilexisset suos, qui erant in mundo, in finem dilexit eos - "Sabendo Jesus que era hora de passar deste mundo ao Pai, como tinha amado os seus que estavam no mundo, amou-os até ao fim" (Io. 13, I).

Sumário - Embora Jesus Cristo em todo o curso de sua vida mortal nos tivesse amado ardentemente e nos tivesse dado mil provas do seu amor infinito, todavia, quando chegou ao termo dos seus dias, quis dar-nos a prova mais patente pela instituição do Santíssimo Sacramento. Aí o Senhor se faz não só nosso constante companheiro, mas ainda nosso sustento e se nos dá todo inteiro. Com muita razão, portanto, Santa Maria Magdalena de Pazzi chamava a quinta-feira santa o dia do amor.

I. Um pai amoroso nunca patenteia melhor a sua ternura e o seu afecto para com os filhos do que no fim da sua vida, quando os vê em torno do seu leito, aflitos e com os olhos em pranto, e pensa que em breve deve abandoná-los. Tira do seu coração e põe sobre os seus lábios o resto de sua vida prestes a extinguir-se, abraça aqueles queridos do seu amor, exorta-os a serem sempre bons, imprime-lhes no rosto os mais ternos beijos, e misturando as suas lágrimas com as dos filhos, lança-lhes a bênção. Depois manda trazer o que mais precioso possui e dando a cada um uma última lembrança: Tomai, diz, e lembrai-vos sempre do amor que vos tenho dedicado.

Foi exactamente assim que quis fazer connosco Jesus Cristo, verdadeiro Pai da nossa alma e Pai tão amante, que na terra não tem havido, nem jamais haverá outro igual. Embora em todo o curso da sua vida mortal nos tivesse amado com amor ardente, e nos tivesse dado mil provas do seu amor infinito, todavia, quando chegou ao termo dos seus dias, quis dar-nos a prova mais patente, pela instituição do Santíssimo Sacramento. E por isso na mesma noite em que devia ser traído, reuniu os seus discípulos ao redor de si, instituiu a Santíssima Eucaristia, e disse-lhes para os consolar de sua próxima partida:
Filhos meus, vou morrer por vós, para vos mostrar o amor que vos tenho dado. Posto que, escondido debaixo das espécies sacramentais, deixo-vos o meu corpo, a minha alma, a minha divindade, a mim mesmo todo. Numa palavra, não quero nunca estar separado de vós, enquanto estiverdes na terra: Ecce ego vobiscum sum, usque ad consummationem saeculi - "Eis que estou convosco, até à consumação dos séculos". - Meu irmão, que tal te parece esta extrema fineza de Jesus Cristo? Não tinha razão Santa Maria Magdalena de Pazzi de chamar a quinta-feira santa o dia do amor?

II. Jesus Cristo não satisfez o seu amor, fazendo-se nosso constante companheiro; quis ainda fazer-se nosso sustento, afim de se unir intimamente à nossa alma, e santificá-la com a sua presença. E nesta manhã, qual amante apaixonado, que deseja ser correspondido, de dentro da Hóstia consagrada, onde nos observa sem ser visto, está espreitando todos os que se preparam para alimentar-se com a sua carne divina, observa em que pensam, o que amam, o que desejam e as ofertas que irão apresentar-lhe.

Irmão meu, prepara-te para recebê-lo com as devidas disposições. Aviva a tua fé na presença real de Jesus Cristo neste inefável mistério; dilata o teu coração pela confiança, lembrando-te que te pode fazer todo o bem, muito te ama e vem a ti exactamente para te enriquecer com as suas graças. Humilha-te profundamente diante da sua divina majestade, e lembrando-te que no passado, em vez de amares um Deus tão bom, o tens magoado, voltando-lhe as costas e desprezando a sua amizade, pede-lhe perdão e toma a resolução de que para o futuro antes quererás morrer do que tornar a ofendê-lo - Mas prepara-te sobretudo para receber Jesus Cristo com amor, e convida-o pelo desejo.

Vinde, ó meu Jesus, vinde depressa e não tardeis. Ó meu único e infinito Bem, meu tesouro, minha vida, meu paraíso, meu amor, meu tudo, quisera receber-Vos com aquele amor com que Vos receberam as almas mais santas e mais amantes, com que Vos recebeu Maria Santíssima. Uno a minha comunhão de hoje com as suas. - Santíssima Virgem e minha Mãe Maria, eis que vou receber o vosso Filho. Quisera ter o vosso coração e o amor com que recebíeis a santa comunhão. Dai-me hoje o vosso Jesus, assim como o destes aos pastores e aos santos Magos. Desejo recebê-lo de vossas mãos puríssimas. Dizei-lhe que sou vosso servo devoto, porque assim me olhará com olhar mais amoroso e me apertará mais estreitamente contra o seu Coração, quando vier a mim. (*I 406.)


MEDITAÇÃO PARA A TARDE
Quinta Dor de Maria Santíssima - Morte de Jesus

Et erit vita tua quasi pendens ante te - "A tua vida estará como suspensa diante de ti" (Deut. 28, 66).

Sumário - Contemplemos a acerba dor de Maria Santíssima no Calvário, obrigada a assistir a Jesus moribundo, a ver todas as penas que Ele padecia, sem contudo lhe poder dar alívio. Então a aflita Mãe não cessou de oferecer a vida do Filho à divina justiça pela nossa salvação. Lembremo-nos que pelo merecimento de suas dores cooperou para nos fazer nascer para a vida da graça. Por isso todos nós somos seus filhos. Oh, como a Virgem exerceu sempre e ainda exerce bem o ofício de Mãe! Mas como nos havemos nós como filhos?

I. Fogem as mães da presença dos filhos moribundos; e se por acaso alguma mãe se vê obrigada a assistir a um filho que está para morrer, procura-lhe todos os alívios que pode dar. Concerta-lhe a cama, para que esteja em posição mais cómoda; serve-lhe refrescos, e assim a pobre mãe procura mitigar a própria dor. Ah, Mãe a mais aflita de todas as mães, ó Maria! incumbe-vos o assistir a Jesus moribundo, mas não vos é permitido dar-lhe algum alívio.

Maria ouviu o Filho dizer: tenho sede; mas não lhe foi permitido dar uma gota de agua para lhe mitigar a sede. Só pôde dizer-lhe, como contempla São Vicente Ferrer: Fili, non habeo nisi aquam lacrimarum. Via que sobre aquele leito de morte Jesus, pregado com três cravos de ferro, não achava repouso. Queria abraçá-lo para lhe dar alívio, ao menos para o deixar expirar entre seus braços; mas não podia. Via o pobre Filho, que naquele mar de aflições buscava quem o consolasse, como ele já tinha predito pela boca do profeta Isaías. Mas quem entre os homens o desejava consolar, se todos eram seus inimigos? Mesmo sobre a cruz um o blasfemava e escarnecia de uma maneira, outro de outra, tratando-o como impostor, ladrão, usurpador sacrílego da divindade, digno de mil mortes.

O que mais aumentou a dor de Maria e a sua compaixão para com o Filho, foi ouvi-lo sobre a Cruz lamentar-se de o Eterno Pai também o ter abandonado: Deus, Deus meus, ut quid dereliquisti me? - "Deus meu, Deus meu, porque me desamparaste?". Palavras, como disse a Bem Aventurada Virgem a Santa Brígida, que não puderam nunca mais sair-lhe da ideia enquanto viveu. De modo que a aflita Mãe via o seu Jesus atormentado de todas as partes; queria aliviá-lo, mas não podia. Pobre Mãe!

II. Pasmavam os homens, diz Simão de Cássia, vendo que a divina Mãe guardava o silêncio, sem se queixar no meio da sua grande dor. Mas, se Maria guardava o silêncio com a boca, não o guardava com o coração, porquanto naquelas horas não fazia senão oferecer à justiça divina a vida do Filho pela nossa salvação. Saibamos, pois, que pelo mérito de suas dores, ela cooperou para nos fazer nascer para a vida da graça, e por conseguinte somos filhos das suas dores: Mulier, ecce filius tuus - "Mulher, eis aí o teu filho".

Naquele mar de amargura era este o único alívio que então a consolava: o saber que por meio de suas dores nos conduzia à salvação eterna. - Desde então começou Maria a exercer para connosco o ofício de boa Mãe; pois que, como atesta São Pedro Damião, foi pelas súplicas de Maria que o bom ladrão se converteu e se salvou, querendo a divina Mãe recompensá-lo assim pela delicadeza que outrora lhe mostrou na viagem ao Egipto. E o mesmo ofício de mãe tem a Bem Aventurada Virgem continuado sempre e continua a exercer. Nós, porém, com as nossas obras mostramo-nos deveras seus dignos filhos?

Ó Mãe, a mais aflita de todas as mães! Morreu enfim vosso Filho, tão amável e que tanto vos amava! Chorai; que tendes razão para chorar. Quem jamais poderá consolar-vos? Só vos pode consolar o pensamento que Jesus com a sua morte venceu o Inferno, abriu o céu fechado aos homens, e ganhou tantas almas. Do trono da cruz reinará sobre tantos corações que, vencidos pelo amor, com amor lhe servirão. Não recuseis entretanto, ó minha Mãe, que vos acompanhe a chorar convosco, já que mais que vós tenho razão de chorar pelas ofensas que tenho feito a vosso Filho. Ah, Mãe de misericórdia! em primeiro lugar pela morte de meu Redentor, e depois pelos merecimentos de vossas dores, espero o perdão e a salvação eterna.

(continuação, Sexta Feira)

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