01/02/16

1 de JANEIRO - AGIOLÓGIO LUSITANO - COMENTÁRIOS (IV)

(continuação da III parte)

f) Vive ainda a memória no convento de Mosteiró do servo de Deus Fr. Álvaro que faleceu no ano 1476 quando este convento era dos frades Menores da Província de Portugal, e hoje dos principais da de Sto. António, ao qual deram princípio no ano 1392 três varões de grande espírito, e zeladores da perfeição religiosa, filhos da Província de Santiago, cujos nomes são Fr. Diogo Asturiano, Fr. Gonçalo Marinho, e Fr. Pedro Dias. Consta do breve que para a nova função passou o Papa Bonifácio IX no 3 ano de seu Pontificado o qual traz Wadingo (tomo 4) dos anais (nº 4).

Esta casa dista pouco mais de uma légua de Tui, e outra de Valença, e fica do Rio Minho para o meio dia. Foi edificada sobre uma ermida de N. Senhora que já ali estava de tempos antiquíssimos, a qual com admirável culto frequentava o povo pelo notável princípio de sua fundação, da qual havemos de falar (Deus crendo) no nosso Tratado dos Santuários de Portugal. E como esta casa foi a primeira que da Observância que houve neste Reino, era bem que o fosse também na santidade, e como tal nela viveram, e saíram religiosos que no exercício das virtudes foram admiração ao mundo, e no exemplo, e pregação evangélica dignos semeadores da divina palavra, como veremos em diversos lugares desta obra. Deram-nos notícias de Fr. Álvaro umas adições que se mandaram fazer pela Província a Crónica Seráfica de Gonzaga.

g) Foi o Pe. Fr. António Pereira filho da Província dos Algarves, defenidor três, ou quatro vezes, e Guardião dos principais conventos dela. Faleceu no de S. Francisco de Beja no ano 1599. Gonzaga quando trata dele, não se delibera em que ano teve princípio. O livro das memórias desta província, que ano 1615 mandou fazer o Vigário geral da Ordem, Fr. António de Trejo, refere sua fundição no ano de 1324 e fiz que é Padroeiro dele ElRei nosso Senhor. Deste Religioso faz menção o mesmo livro que não tem pequena autoridade na Província.

Igreja do Convento do Carmo mandado construir pelo Santo Condestável de Portugal
h) Floresceu Fr. Jerónimo de Brito no ano 1593 como afirma Fr. Luís de Mértola na vida do Venerável Fr. Estêvão  da Purificação (c. 27) e na sua m. s. onde se lê, que é natural de Lisboa, e filho do convento do Carmo dela. De que foi fundador o S. Condestável D. Nuno Alvares Pereira no ano 1386 como mais largamente diremos no seu dia 13 de Maio.

Igreja do Convento do Carmo
i) O mosteiro de S. Mónica de Lisboa da Ordem de S. Agostinho fundou uma ilustre Senhora (como fica dito) chamada D. Maria de Abranches, filha de D. Álvaro de Abranches, Capitão mór de Azamor, e de D. Joana de Mello, numas casas suas, no sítio em que hoje se vê, não longe do convento de N. S. da Graça da própria Ordem. Cuja primeira pedra ela levada de devoção, e fervor de espírito com suas próprias mãos lançou no I de Janeiro de 1586, e II de Outubro do dito ano, com procissão, e solene festa, foi nele colocado o santíssimo Sacramento, e neste dia professaram 12 noviças nas mãos do Provincial da Ordem, que nomeou a D. Isabel de Noronha Prioresa, a D. Jerónimo de Meneses Subprioresa, e a D. Margarida da Silva Mestra de Noviças, que todas três vieram do convento do menino Jesus de Évora, para darem princípio a esta nova fundação. Nela a serva de Deus foi a primeira, que vestiu o hábito, mas vendo os temerários juízos, das que julgavam que o fizera para se habilitar para o cargo de Prioresa, se foi com grande desconsolação sua, para mais assegurar de tão errados juízos. Viveu depois no século (como temos escrito) frequentando, e assistindo sempre no dito convento de N. S. da Graça, até que adoeceu, chegada ao artigo da morte, e perguntada da parte das religiosas, como fundadora do convento e que lugar queria ser nele sepultada, respondeu (com sumissão) "que se não se atrevia estar em morte, onde em vida a rejeitaram; mas que iria mui consolada se estivesse seu corpo na Igreja, e lugar em que sua alma fora alumiada com a santa doutrina do Pe. Mestre Fr. Sebastião Toscano autor de sua conversão para que seus ossos fossem pousados dos pés dos religiosos de S. Agostinho de que sempre fora discípula, e assim faleceu no ano de 1600, foi enterrada no meio do cruzeiro na sepultura de sua mãe, em cuja campa se vê esse epitáfio:

Aqui espera a D. Joana de Mello a ressurreição dos mortos, e vida bem-aventurada com os que forem seus descendentes.

E posto que este epitáfio não fale nela, consta de memórias de um, e outro convento estar ela sepultada ali, e tudo o mais que de sua vida sumariamente referimos.

l) Faleceu Sór Mecia de Paiva no ano 1614, depois de ser Mestra de Noviças, e duas vezes Prioresa do mosteiro das Agostinhas de Évora, que hoje pelos muitos milagres, que nele obra uma santa imagem do menino Jesus, tomou sua invocação, por cujo título é mui conhecido, e nomeado neste Reino. Sua fundação se verá a 30 de Maio em que se celebra no dito convento a memória de suas fundadoras Maria, e Constança de vida pobres. O que da serva de Deus Sór Mecia, deixamos dito, devemos às relações m. f. que deste convento se nos comunicaram.

m) Olivença principal vila do Bispado de Élvas, fundada duas léguas além do Guadiana, numa planície da Bética, cujo fundador se ignora, foi muito tempo de Castela, até que ElRei D. Dinis a houve com outras para esta coroa. O Castelo não é obra de Mouros (como alguns disseram) mas do tempo do próprio Rei. Vê-se isto claramente de um escudo de pedra que está na porta, que chama da Graça, o qual tem esculpido uma figura de mulher (que se entende ser a Rainha santa) sentada em cadeira com coroa, e ceptro, à parte direita as armas de Aragão, e as de Portugal, à esquerda há uma Oliveira com letras que dizem.

A primeira pedra deste Castelo foi posta em dia de S. Miguel, e a pôs aqui Pedro Lourenço do Rego, em tempo DelRei D. Dinis era 1344 que é ano 1306.

A vila antiga era cercada de muro, e tinha cinco portas. ElRei D. Manuel por ir em aumento a povoação a mandou cercar, cuja obra com sua morte parou. Tem ao presente mais de 1800 vizinhos, por se haver recolhido a ela (por causa da guerra) a gente do campo, e aldeias circunvizinhas. Abunda de trigo, azeite, carnes, palhos, e frutas, e não menos de casas ricas, e nobres famílias.

A todas estas excelências excede, a de haver procriado a grande serva de Deus Maria da Cruz, filha de pais humildes, mas mui virtuosos. Faleceu pronunciando estas devotas, e formais palavras: Doce Jesus de minha alma, doce Jesus de minha vida; quando chegará a hora, de minha doce partida. Na capela de Sta. Isabel do mosteiro de S. Francisco (como fica dito) jaz sepultada, a qual ela muitos anos antes profetizou se havia de fazer, e que seria a primeira que nela se sepultasse. Na campa da sepultura contém escudo formado de cordão da Ordem, e dentro uma coroa de flores com palma, e em cerco esta letra de S. Paulo "non coronabitur nisi qui letitime certaverit". Pendem dele à parte direita um cilício, à esquerda umas disciplinas, com a letra: Arma militia nostra, e por baixo:

Aqui está sepultada Maria da Cruz filha de Bento Alvares, e de Isabel da Paixão, todos terceiros da Ordem da penitência de N. Seráfico P. S. Francisco. Faleceu no I dia de Janeiro da era de 1635 sendo de idade de 50 anos, e Ministra da dista Ordem.

E ao pé de tudo uma lançadeira esculpida, em figura do ofício de Tecedeira, que exercitava. Sua vida anda manuscrita por seu Confessor Fr. Miguel dos Anjos religioso Arrábido, da qual nós aproveitamos; e de umas informações, que (por mandado de D. Sebastião de Matos, sendo Bispo de Elvas) se fizeram; e de outras memórias, e relações autênticas, que se conservam entre os religiosos da província dos Algarves, aos quais o dito convento pertence, como se verá em mais próprio lugar.

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