07/01/16

O REI E O PAI (III)

(continuação da II parte)

§ 21

Que vergonha para os bons (...), ver (...) [o seu próprio Reino] dilacerado por intrigas, e inconsolável por suspeitas vagas contra o verdadeiro patriotismo! Que indignidade, dar princípio à mais importante regeneração Nacional, e confundi-la nos horrores da Anarquia! [nesta época, o autor ainda acreditava numa suposta regeneração para lá de uma simples correcção e aclaramento pontuais; eis a discreta influência do ambiente liberal sobre os próprios e declarados inimigos do liberalismo]

§ 22

Uma (...) [Pátria] significa o mesmo, que muitos Pais de famílias congregados a bem os seus domésticos por arbítrio espontâneo, como um chefe, simples depositário e executor dos direitos paternais: suponhamos que falece, ou é impedido nas suas funções o sumo Imperante; aquele direitos, como imprescriptíveis, tornam para as mãos, donde saíram: cada um pode separar-se da sociedade, a que pertencia, e habitar a terra, que não se achar ocupada, ou transigir com os seus possuidores.

§ 23

Tudo, que obsta a estes direitos, ofender a natureza, e resiste à Divindade, que criou o homem livre, e com a faculdade de ocupar todas as coisas, que não são possuídas "Res nullius" são todas as coisas criadas, antes de possuídas definição singular, que lhe deu o imortal Coecci, impugnada a preocupada opinião, que supôs tudo em comum: como se o ânimo de possuir fosse o mesmo, que o acto de ocupar.

§ 24

Pode o homem separar-se da sociedade, que o molesta injustamente; mas o monstro da Anarquia é tão bárbaro, que o impede, o por força há-de o homem sofrer os seus desvairos, e despotismos: eis a razão, porque de todos os males da sociedade o pior é a Anarquia, sendo antes preferível o sofrer um Nero, que os furores da populaça, mais cruel que todos os Tiranos.

§ 25

Eis a razão porque os espíritos fortes preferiram a vida selvagem à sociedade, e porque o grande Rousseau se precipitou no seu pacto social, fazendo proposições contra o bom senso e contra o estado actual da Europa: factos não induzem direitos: violências não provam razão: despotismos não alteram, nem revogam as Leis; recorra-se à natureza, e todas as dificuldades se aplanam, todas as dúvidas se resolvem: recorre-se à Natureza no seu estado primitivo, e a luz da verdade brilha a nossos olhos.

§ 26

O homem, ainda mesmo corrompido, conhece, que não é obra do acaso, e reconhecendo o seu autor, também reconhece dever-lhe obediência, e gratidão; isto basta para provar a existência de uma lei: e esta lei basta para provar a dignidade do homem superior a todos os animais; pois que não tem este conhecimento sublime, inspirado ao homem, como uma força centripeta, que o leva ao Céu.

§ 27

A ideia do Céu não é abstracta: o homem erigido do abatimento, em que nasce, olha para ele, e nas suas aflições não busca outro recurso; não é o encanto dos Astros, que o eleva, não é a formosura de um tecto abrilhantado, que o atrai, é a luz da razão, que lhe diz "A morada do teu Criador enche o Universo imenso, e infinito, e tu existes debaixo dos seus pés" é portanto mui natural, que o homem veja a terra como lugar de suplício, ou de experiência.

§ 28

Vê o homem os seus semelhantes sem rivalidade, em quanto não divisa a proferência; porém a gentileza, a robustez, a vivacidade de alguns homens, que lhe fazem sombra: entristece-se, e se vê, que lhe preferem por mais estimados, rebenta o ciume, que produz a guerra e a morte; assim pereceram nosso primeiro Progenitores, como Abel, cuja lembrança era bastante para desterrar nossa soberba.

§ 29

O Pai é o Rei, o Sacerdote, o legislador da sua família e para cumprir melhor estes direitos, umas vezes se associou a outros chefes de famílias, outras vezes se separou, como se prova pela exemplo dos Patriarcas; se cabiam no país, que habitavam, durava a união; senão cabiam, separavam-se para a direita, e para a esquerda por uma escolha amigável, que faz saudosos aqueles tempos de inocência, em que viviam ornados de virtudes, homens desclaços, e só cobertos de lã, e peles.

§ 30

Fundaram-se Pagos segundo a frase de Aristóteles, e até aqui temos por Fundadora a Natureza: edificaram-se Cidades, e se todas foram como as de Nembroth e Rómulo, são suspeitosas suas origens: mas de qualquer maneira consideradas, os Pais de famílias não perderam os seus direitos; seriam estes apenas estorvados pelo abuso, e pela violência, mas nunca extintos: por serem divinos, e sempre inseparáveis, da natureza do homem.

§ 31

O ser humano, não pode privar-se da vida, e da liberdade justa; porque a sua existência, essencialmente requer uma, e outra coisa; pode assim perder o direito a conservá-las, como diz Filangieri; mas os Réus contritos, arrependidos, e penitenciados voluntários recuperam os direitos da vida, e da liberdade; é portanto que a Igreja sempre advogou a sua Causa para livrá-los da pena de sangue; o que seria absurdo, se a Natureza o proibisse.

§ 32

Os direitos dos Pais de famílias são muito respeitáveis: David os reconheceu no segundo Salmo, quando lhes manda quebrar as cadeias da tirania, e sacudir o jugo da opressão: até lhes prometer que Deus zombará dos tiranos, e fará seu filho senhor absoluto de toda a terra, para governá-los com uma vara de ferro, e quebrá-los como vasos de barro.

(continuação, IV parte)

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