29/01/16

CAPELA MÓR DA SÉ DE ÉVORA (IV)

(continuação da III parte)


Se o Espectador divide as Paredes, e debaixo para cima começa a contemplar com atenção o que alcança a vista: o soco, ou a primeira enfiada de mármores azuis representa a Cogitação do Homem que de Manto escuro rajado de branco não sente ver-se carregada com o peso que sustenta, antes dá-se por muito satisfeita no lugar, que ocupa e com o sério do seu olhar repreende a curiosidade, e distracção, manda o silêncio a qualquer que entra, ou lá se demora. Subindo com a vista, a parte média do Edifício é o retrato da juvenilidade vestida de gala, como quem acaba de sair do Toucador; a cor de rosa que mais aparece, o ouro que lhe tinge as faces, o verde, que sobressai, e é o símbolo da vida vegetativa, tudo indica a presença de um ser amável, cheio de formosura, que estima os segredos da ordem, abençoa os bens da paz, e dá graças àquele a quem serve, que na Caridade, com que ama tem a verdadeira medida das suas Misericórdias. Ninguém olha de perto para este lado de faces sanguíneas, que não deseje possuir uma garganta canora, voz ajustada às modulações do culto, ninguém há que não queira ver-se transferido nas boas prendas da juvenilidade.

Mais ao alto fica a Cimalha, e o resto que termina que são os olhos daquele corpo: a cor branca, que alu sobressai imita o humor cristalino por onde a luz passa a mostrar-se a todos a ver, e ser vista, e o lugar emite, por onde se reparte quer dizer que além de luminosa o seu ofício é servir de Espia, e vigiar os Ministros do Altar nas funções a seu cargo.


RELAÇÕES COM O RITUAL

Seja a Capela Mor de uma Catedral o Campo de operações Cristãs, ou qualquer outra imagem a que se queira assemelhar, deve ser ajustada aos destinos sublimes da Igreja, a primeira Rainha do Mundo, e desde que há Mundo com estados, e domónio independentes. Mui bem entende a Igreja dar-se nas suas representações grande distância entre a imagem, e a realidade entre a figura, e o figurado, e para redusir esta distância isto é para elevar os Fiéis ao alto conceito dos Mistérios Santos é que emprega no culto toda a demonstração de pompa e grandeza. Que funções não aponta o Calendário na roda do ano que é preciso celebrar com a solenidade do rito? A Semana Santa, Natal, Corpo de Deus, as Bênçãos Sagradas, a Ordenação Clerical pedem Pontífice, Sacerdotes, Ministros, Acólitos, Directores com ofícios separados, que precisam de uma Área extensa para nem se confundirem, nem esconder uns com outros. Demandam distribuição metódica desta Área, para nela as Pessoas se distinguirem acções, perguntas, e respostas vozes, e sentimentos, os Aleluias do Miserere as Lamentações dos Hosannas oxalá que sempre se pudesse dar nas funções do culto uma pronúncia clara, e distinta em Sílabas, e Letras bem farta de ar sem falência, nem de dentes nem da respiração nasal, por fanhosa, ou desentoada...

Eu ainda não assisti a Pontifical nesta Capela Mor porque (mal hajam contemplações!) na Igreja Catedral de Évora, nem os Santos Óleos se benzem há mais de dez anos. Entendo que pelo graduado do pavimento, pelo desafogo do Tecto, pelo espelhado das Paredes, pelas Abóbadas lisas, sem concavidades, nem cotovelos há boas proporções para o serviço do Báculo, e da Mitra e um Pontifical bem dirigido, e executado à Noite de Natal por exemplo com 300 lumes mais de placas em cachimbos de solda, á roda das Colunas imitando as Cartuxeiras de Caçadores para reflectir milhares de luzes nos espelhados Mármores seria função primorosa de grandíssimo esplendor, e magnificência. Entendo que tirado o Crucifixo (*) da frente posto como está acima do Docel, superior ainda à Cimalha, onde nem serve de ornamento nem de veneração por ficar muito além das vistas fronteiras a quem entra; com seus cancelos de Mármore à entrada e reduzida ao serviço Pessoal de um Prelado Arcebispo, ou Bispo pertencente ao Paço Pontifício seria talvez a Capela mais primorosa da Cristandade.



EXTERIOR


É grande formosura desta Obra a Serventia exterior por comunicações excêntricas abertas nas Paredes com boa ordem, segurança e claridade suficiente. Entra-se pela Porta da Capela da Cruz ao lado da Epístola, e logo começa um Corredor que vai de volta por detrás do altar até à Capela do Sacramento onde tem saída. Este Corredor é alto e largo quanto basta para o fácil trânsito, e desafogado.


Dele sobem duas Escadas de Caracol de 31 degraus, que conduzem aos Coretos espaçosos, e cómodos a seus destinos. Segue-se um pequeno lance de Escadas com 8 degraus; seguem-se outros mais pequenos, que dão lugar a andar-se à roda do Edifício por caminho descoberto, e seguro. Desta varanda vão duas Escadas de caracol de 36 degraus que terminam no Terrado, e é o remate da Capela correspondente ao Pavimento.


Em volta do Terredo cerca a Balaustrada de Mármore branco, de cinco palmos de altura maciça, e grossa quanto pede o lugar eminente a que se eleva, e forma do Terredo uma Varanda soberbíssima no ponto dos mais subidos da Montanha, em que Évora está fundada.


Nos Mês de Julho, Agosto, e Setembro a quem olha deste Terredo centro de um Horizonte de 6 a 8 Léguas de diâmetro 16 ou 20 de circunferência sem cortaduras ou interrupções, e só com nevoeiros de fino pó que andam ao largo representa-se-lhe um Mar inflamável, dividido em tantas corrente, ou Riachos cor de cinza quantas são as Estrelas, que saem de Évora, e vão dar às diferentes Terras da Província, ou fora dela.


Sobre o Peitoril da Varanda há dez pirâmide de Pedra altas 9 palmos, que terminam em Cortados semelhantes a Línguas de fogo estas Colunas representam Archotes, ou Fogareiros, que de noite, e de dia ardem a iluminar o Edifício e indicam a largas distâncias a sua Magnificência.

Fogareiro
FIM

Sem comentários:

TEXTOS ANTERIORES