Cap. V
DA MORTIFICAÇÃO DO ENTENDIMENTO
DA MORTIFICAÇÃO DO ENTENDIMENTO
Quando a porta da fortaleza está bem guardada, seguro podes dormir: assim o que tem boa guarda na vontade e coração forte de todos os males, e origem de todos os bens, seguro pode andar. Todavia para maior facilidade da guarda é necessário vigiar sobre os escravos, criados, e gente de casa, porque sendo estes mal criados, e desmandados, senão tiveres cuidado sobre eles dar-te-hão trabalho, e inquietação. De semelhante maneira, além da mortificação da vontade, e para mais facilmente seres senhor dela, deves ter vigia sobre o entendimento, que é um rapaz vagabundo demasiadamente desmandado e trabalhoso, e de todo desobediente.
Três maneiras há de pensamentos uns que em si não são maus nem pecados mortais, como são os castelos de vento, que o entendimento faz, que não aproveitam estes, dado caso que de sua colheita não sejam pecado mortal, fazem porém grande dano, porque se os consentes, é sinal que tens o coração vazio, e acabado de fazeres um castelo de vento, ficarás triste, e a cabeça esvaída, e tu cansado como se trabalharas com pedra e cal sendo tu vento, e facilmente virás a cair em pecados mortais, e torpes desejos, pela qual razão não deves consentir tais imaginações.
A segunda maneira de pensamentos danosos são, quando trazes à memória pensamentos de pecados mortais, ou de algumas pessoas com deleitação da carne, ainda que não consintas no pecado nem na deleitação. Estes tais pensamentos são muito prejudiciais. Porque deves com diligência enxotar estas molcas e maus pensamentos de teu entendimento, e em nenhuma maneira lançar mão deles. porém se viverem contra tua vontade, e forem importunos, não canses em os lançar de ti; porque esta contenda te fica em gloriosa coroa. Estes dois modos de imaginações deves mortificar e não dar lugar que o entendimento ande vagabundo por ela pois facilmente podem levar a pecado mortal, não te poderás muito tempo conservar no estado da graça.
A terceira maneira, são os pensamentos bons; como do cuidado da casa, da família e fazenda e dado que sejamos bons, em tempo podem vir que te danem e te impeçam de ter a vontade com Deus. Como estando na igreja à Missa, e em oração e recolhimento, e ocupado nas coisas de tua alma; porque assim como então não são necessários, podem distrair-te e tirar-te do negócio espiritual em que estás ocupado: porque em tal tempo mais servem a imagem de JESUS crucificado, e os pensamentos dessa morte e paixão, e teus pecados, que não os da sua casa, e se quiseres aproveitar na virtude recolhendo-te um pedaço de tempo com Deus, sabe que qualquer pensamento pode impedir a devoção, como se dirá na quarta parte. O que agora é necessário para te conservares no estado da graça, e não pecar mortalmente é, não consentir nas vagabundas e torpes imaginações, mortificando o entendimento. (Compendio Spiritual da Vida Christam ... Coimbra, 1600)
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