(continuação da II parte)
Continuam as victorias na Turdetânia,
a quem os Mouros chamam Fogron (12), e determinadamente Alburg, como já
dissemos. As nossas Cidades, Lugares, e Povoações ficam ermas, e solitárias. Os
homens se embrenham nos desertos, nos cabeços dos montes: seguem-nos os filhos,
e as mulheres, repetindo clamores, e áis aos Céu. A cada instante topavam cadáveres,
que juntando as campanhas, faziam horroroso o trato da humanidade. O susto, a
fome, a morte, e a desesperação os transformava em Estátuas. Uns a
outros divisavam nos seus rostos como em espelho os males que os seguiam. Esquecidos
de si, e parece que insensíveis à mesma natureza, tinham como inveja aos
irracionais, vendo que se nutriam na carne dos amigos, e parentes.
Tristes, e fatais dias foram
estes à Pátria, e à Igreja! Emudeceram as vozes dos Pastores: não se ouve a
doutrina do Santo Evangelho: o sangue dos Mártires: os trabalhos dos crentes
encerrados nas escuras cavernas a que se refugiavam: as lágrimas, e desamparo
das donzelas, dos pais, e dos filhos: todos estes sensíveis objectos gritavam
ao Céu, que parece endurecido aos penetrantes clamores dos inocentes. Tudo, na
verdade, tudo fugia diante destes bárbaros, que pisavam aos pés as Leis mais
santas da natureza, e profanavam com impiedade todas aquelas mesmas coisas, que
o Cristianismo tem de mais sagrado, e respeitável. Abandonados aqueles fiéis ao
despotismo, e tirania dos Mouros, a sua formosa, e amável Esposa a Santa Igreja
ia como desgarrada, entregue ao ludibrio, e profanação dos infames Africanos. Malvados,
e sem humor se atrevem a profanar, e pôr as mãos na Arca do Testamento: roubam
os Vasos Sagrados, despedaçam as alfaias que servem ao Santuário: aquele mesmo
tremendo Sacrifício, onde veneramos, e respeitamos os Mistérios da nossa
Reparação, onde humilhados adoramos presente ao Supremo, e Omnipotente Senhor, é
interrompido, e apenas seria por alguma vez praticado sem aquele esplendor, e
aparato que pedia o Deus Imenso, a quem se tributavam aqueles cultos.
Dura séculos este bárbaro domínio.
Dilatados tempos geme a Lusitânia nesta escravidão. Os Reis das Astúrias, de Leão,
e de Navarra sacodem o jugo, e por muitas partes levantam o troféu, e
estandarte da Cruz contra os intrusos, e infames Africanos. Castigam a ferro, e
fogo o ímpeto de suas victorias aqueles Soberanos, que animando com os seus
exemplos aos soldados, adiantavam conquistas em que se respeitava a Lei de
Jesus Cristo que eles seguiam.
A Província também se mostrou benigna aos males que padecia a Lusitânia. O Todo Poderoso suscita de entre nós ao insigne, e grande Rei D. Afonso Henriques, terror, e açoite dos Mouriscos, e vencedor de muitas, e famosas batalhas, que a benignidade de um Deus, Senhor dos Exércitos, lhe fez conseguir, ainda em idade provecta (13). Um digno sucessor anima as suas venerandas cãs. Sancho I herdando as virtudes, e forças de tão valoroso pai, segue as pisadas do respeitável Progenitor.
(continuação, IV parte)
(continuação, IV parte)
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