27/08/15

DOM FR. ALEIXO DE MENESES - Anotações


D. Fr. Aleixo de Meneses (Lisboa, 1559 - Madrid, 1617), Frade da Ordem de S. Agostinho, foi Arcebispo de Goa (Primaz das Índias Orientais), Governador da Índia, Arcebispo de Braga (Primaz das Espanhas), e Governador de Portugal.

"... D. Frei Aleixo de Meneses, entretanto, seguiu a rota tradicional dos navegantes portugueses, pelo eixo do Atlântico e do Índico ocidental. Partiu em 13 de Abril de 1595. Como era comum, o novo metropolita atravessou um longo percurso marítimo, pontuado por doenças a bordo,[...]"

A trajectória (...) no Estado da Índia ocasionou a solidificação do projecto, germinado no reinado de D. Sebastião, de construção da missionação agostinha, quando Agostinho de Jesus foi Geral da Província de Portugal. [...]

D. Fr. Aleixo de Meneses, nome secular de Pedro de Meneses, pertencera igualmente a Casa de primeira nobreza do Reino. D. Aleixo de Meneses († c. 1569), seu pai, era o terceiro filho do segundo casamento de Pedro de Meneses, 1º Conde de Castanhede, com D. Beatriz de Soares, viúva do marechal d. Álvaro Coutinho. D. Aleixo foi morRdomo-mor da ainha D. Catarina, entre 1554 e 1559, e Aio de D. Sebastião em 1559. Porém, antes da fixação em ofícios cortesãos no Reino, fez carreira no norte da África e na Índia, o que favoreceu uma combinação de fama e notoriedade nos espaços reais de d. João III.

O amplo verbete sobre D. Aleixo de Meneses na Biblioteca lusitana, de Diogo Barbosa Machado, é eivado de elogios: "foi valoroso capitão, prudente embaixador, consumado político, e em tão diversos ministérios preferiu a honra ao interesse, a benevolência à severidade, e a verdade à lisonja".53 [...]


Por sua vez, a mãe de d. frei Aleixo de Meneses, D. Luiza de Noronha, era filha de D. Álvaro de Noronha, que fora Capitão de Azamor. Filho do segundo casamento de D. Aleixo de Meneses,55 Pedro de Meneses nasceu em 25 de Janeiro de 1559, na cidade de Lisboa.56 Professou no Convento da Graça na capital do Reino e recebeu-o D. Fr. Agostinho de Jesus, em 27 de fevereiro de 1575. Na nova identidade religiosa, mudou o nome para Aleixo de Jesus (...). Passou pela Universidade de Coimbra, entre 1582 e 1586, (...) primeiro por estudante corista e depois já na posição de Sacerdote. Contudo, não chegou a finalizar os estudos académicos.57 Na Província de Portugal dos agostinhos, foi eleito Prior dos Conventos de Torres Vedras, em 1588, de Santarém, em 1590, e de Lisboa, em 1592.

(...) foi elevado ao lugar de Pregador Real de Filipe II, distinção que supriu a ausência da formação formal em Teologia [falso], como [não] destacado nas provas reunidas ao processo consistorial de sua nomeação em Roma: "e embora não tenha nenhuma graduação em Direito Canónico, é insigne em Teologia Sagrada, é um grande teólogo e aplicou-se em letras sacras na Universidade de Coimbra, além de ser insigne pregador. Foi eleito e elevado entre os oradores, pelo Rei".58


Antes da partida para Goa, foi expedido um breve pela chancelaria papalina de Clemente VIII, que concedeu faculdades ministeriais a Fr. Aleixo de Meneses de absolver os religiosos agostinianos da Índia de qualquer pena de excomunhão, se porventura os Dominicanos declarassem algum decreto contra eles.59 Os frades da ordem dos pregadores de Portugal usufruíam, em solenidades públicas e procissões de uma antiga posse de precedência aos eremitas de Santo Agostinho, aos religiosos de Nossa Senhora do Monte do Carmo e da Santíssima Trindade, na capela do Sumo Pontífice, em Roma, e nos limites da cristandade.60 Ademais, entre os termos de praxe do juramento de fidelidade prestado quando da consagração episcopal, Aleixo de Meneses comprometeu-se a perseguir e impugnar hereges, cismáticos e rebeldes. A construção da monarquia católica universal, projecto acalentado por Roma, encontrou no Arcebispo goês um bastião, que aliou à política religiosa um "gosto" pela "conversão do infiel". A experiência do Estado da Índia projectara um universo de "ovelhas de várias cores" que o agostinho, um pastor de almas, comprometera-se a conduzir à obediência ao Papa na Ecclesia romana. Entretanto, não obteve legado apostólico ou a condição de Núncio, apesar de pedidos do Rei católico. Por fim, pelo Breve In specula summi apostolatus, de 22 de fevereiro de 1607,61 o Papa Paulo V, embora não concedesse legado de representação papal, permitiu faculdades diversas, entre as quais as de autorizar a dispensa nos graus proibidos para contrair matrimonio, com a justificativa da distância e da vastidão das regiões atendidas na Índia Oriental. Um segundo Breve, no mês seguinte, em 6 de março,62 acatou a realização do Sínodo Provincial a cada dez anos e não na prática instituída que seguia o intervalo de cinco anos, o que contemplou uma das súplicas do Arcebispo de Goa, que se justificava por causa da distância dos sufragâneos, dificuldades de navegação, ou pelos incómodos que sofriam aquelas "tenras ovelhas por causa de tão contínuas e longas ausências de seus pastores".63 

Fr. Aleixo é Sagrado Arcebispo de Goa
Apesar dos percalços com Roma - em época que sinalizava mudanças quanto à política missionária de Roma e o embate com o Padroado ibérico −, D. Fr. Aleixo de Meneses construiu uma trajectória única e fulgurante na carreira eclesiástica e administrativa no âmbito (...) dos Áustria: Arcebispo de Goa (1595-1610), a partir de 1606, (acrescenta-se) o título de Primaz do Oriente, acumulou a função de Governador do Estado da Índia;64 no retorno ao Reino, exerceu a mitra no Arcebispado de Braga (1612) em substituição ao pai espiritual D. Fr. Agostinho de Jesus e, nos últimos anos de vida, foi Vice-Rei de Portugal e Presidente do Conselho de Portugal.

Fr. Aleixo é Sagrado Arcebispo de Goa (pormenor)
Os vínculos entre as famílias de D. Fr. Agostinho de Jesus e de D. Fr. Aleixo de Meneses com o Estado da Índia são conhecidos (...). Uma breve exploração genealógica indica conexões de linhagem que explicam, em notas biográficas, a alusão de um vínculo familiar, através do emprego do termo "sobrinho" atribuído a Aleixo de Meneses com relação a Agostinho de Jesus. Embora não se confirme o parentesco em linha directa, os ramos maternos dos insignes metropolitas, por exemplo, remetem a um núcleo comum Noronha, de D. Afonso (1350-1395), Conde de Gijón, e Noronha, filho bastardo do Rei de Castela, D. Henrique, e de D. Isabel de Portugal (1364-1435), filha natural de D. Fernando I.

Fr. Aleixo é Sagrado Arcebispo de Goa (pormenor)
Dois agostinhos ocuparam simultaneamente Arcebispados centrais durante a monarquia dos Áustria. Uma combinação de acaso e virtude que consolidou o enraizamento da Ordem dos Eremitas de Santo Agostinho no Estado da Índia. O longo período de duração do arcebispado de Aleixo de Meneses acentuou a expansão e o fortalecimento dos agostinhos nos espaços do subcontinente indiano, na região denominada de províncias do norte, no Gujarate e Bengala, assim como na Pérsia, em áreas de presença de comunidades portuguesas fora da colonização formal do Estado da Índia. Durante o período de seu arcebispado, os agostinhos do Estado da Índia conduziram um movimento para o interior, deslocando-se das partes litorais. Tal configuração sinaliza o desenho da geografia religiosa anunciada por Trento, com ênfase na ampliação da malha diocesana nos territórios submetidos às jurisdições das monarquias ibéricas, e o deslocamento do clero regular para as missões de alargamento das fronteiras da cristandade.

Fr. Aleixo é Sagrado Arcebispo de Goa (pormenor)
No diapasão trentino, o célere metropolita conduziu visitas pastorais; promoveu o Sínodo de Diamper (1599) de romanização dos cristãos sírios de São Tomé do Kérala, na costa do Malabar; realizou o 5º Concílio Provincial de Goa em 1606 (...).

Fr. Aleixo é Sagrado Arcebispo de Goa (pormenor)
No período em que permaneceu na mitra goesa, Aleixo de Meneses deu cumprimento às orientações do Concílio de Trento de disciplinamento das ordens regulares e de expansão da rede diocesana.67 [...]

Fr. Aleixo é Sagrado Arcebispo de Goa (pormenor)
Entretanto, a morte por enfermidade de D. Martim Afonso de Castro, em seguida ao confronto com a armada holandesa, elevou à cabeça do Estado da Índia, com o título de Governador, D. Fr. Aleixo de Meneses. Primeiro Arcebispo de Goa até então a ocupar o governo do Estado da Índia, permaneceu no cargo por dois anos e meio. No exercício do mando temporal, acumulou experiência de governo, em período de crescente desestabilização das possessões portuguesas no Oriente com as singraduras de embarcações das companhias das Índias Orientais inglesa e holandesa, fundadas em 1600 e 1602 respectivamente. A prática de governança, unindo o trato dos dois poderes, seria reconhecida por Filipe III em futuro próximo, na nomeação a postos cimeiros da burocracia do Reino: Vice-Rei (6/7/1614 a 11/7/1615) e primeiro Presidente do Conselho de Portugal (1615-1617).74 Sem avançar no aprofundamento da trajectória político-administrativa de Aleixo de Meneses, cabe atentar para a relevância de um estudo da dimensão política e religiosa de sua actuação que escape ao relato edificante.

Fr. Aleixo é Sagrado Arcebispo de Goa (pormenor)
[...]

A abertura de um convento na capital da Pérsia, em Ispahan, envolveu a actuação dos agostinhos em um contexto político internacional que combinava [intervenientes] diversos − persas, turcos e europeus (representados no papado, monarquia Habsburgo e nas novas companhias orientais de comércio inglesa e holandesa). A região foi central na condução da política da Igreja, presente no intento explicitado em cartas por Aleixo de Meneses, de conquista das "almas perdidas" da Igreja da Arménia − cristianizadas, segundo a tradição registrara, pelo Apóstolo são Judas Tadeu −, e dos cristãos evangelizados pelo Apóstolo "São João", na região de Baçorá ocupada pelos otomanos. A actuação do metropolita na Pérsia de xá Abbas I colocava em acção o empreendimento de universalização da cristandade pela [conversão] dos cristãos cismáticos, entendidos por perdidos nos "erros nestorianos" das igrejas do Oriente. Um modelo da cristandade já perseguido por Aleixo de Meneses na realização do Sínodo de Diamper entre os cristãos do Kerala. O avanço dos agostinhos, iniciado no início do século XVII durante o arcebispado de Aleixo de Meneses, pelos espaços do golfo Pérsico, Arménia e Geórgia, nos diversos contextos de guerras na região, culminaria na abertura de conventos na década de 1620 (Baçorá e Xiraz, em 1624; na cidade de Gori, no Gorgistão, em 1624). Acrescente-se ao peso das guerras a crescente disputa entre as missões do Padroado de Portugal e os religiosos enviados pela Propaganda Fide.

Fr. Aleixo é Sagrado Arcebispo de Goa (pormenor)
Não obstante, pouco mais de um ano após a carta acima indicada, Aleixo de Meneses, no seu empenho pela introdução do Rito Latino à Igreja arménia, em nova epístola ao Arcebispo de Braga, em 2 de fevereiro de 1604, manifestava o desejo de pessoalmente empreender a redução dos "cismáticos" à autoridade de Roma: "ir-lhes eu fazer um synodo, como foi na Serra - com maior fundamento e clareza da confutação de seus erros, para isto ficar fixo".77 Nessa ocasião, em seu lugar, foi mandado pela segunda vez à Pérsia o agostinho Fr. António de Gouveia. Saliente-se, no contexto das guerras perso-turcas, a migração em massa de arménios para a Pérsia promovida por xá Abbas I. Uma área vizinha a Ispahan abrigara os contingentes de arménios, a Nova Julfá.

O estudo de John Flannery sobre a actuação dos agostinhos na Pérsia aponta as dificuldades e os percalços no plano diplomático da mediação entre Roma, Filipe III e xá Abbas I, como também o contexto da fixação da actuação missionária na região.78 Nesse panorama, localiza-se o malogro de romanização da Igreja arménia. Não obstante, a cronística agostinha retém a fabricação de uma memória edificante do ato de submissão do Patriarca arménio David IV (1587-1627) ao papa Paulo V em maio de 1607. A participação de ordens religiosas nas relações diplomáticas, como nesse exemplo dos agostinhos na Pérsia de xá Abbas I, encontra ainda, na experiência das embaixadas conduzidas pelos jesuítas na corte mogol de Akbar, indicadores de acções controversas, em que o proselitismo e a compulsão religiosa certamente assombreavam a dimensão cultural de compreensão da alteridade. Cabe assinalar, em ambos os casos, a valorização das disputas teológicas entre vertentes abraamicas no ambiente das côrtes persa e mogol, enredando-se as querelas políticas e as rivalidades comerciais entre impérios. (...) No nosso exemplo, a ilusão dos agostinhos na conversão do rei da Pérsia, xá Abbas I.

(...) Acrescente-se ademais a frustrada tentativa agostinha de evangelização da ilha de Socotorá mais um dos pontos vinculados ao (...) Apóstolo são Tomé. (...)" (Margareth Gonaçalves)

 D. Fr. Aleixo de Meneses foi o 7º Arcebispo de Goa Damão.

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