19/12/14

CONTRA-MINA Nº 29: Valor da Lealdade dos Portugueses (II)

(continuação da I parte)

D. Afonso de Albuquerque
Que Nação da Europa nos deu Leis em quanto éramos pequenos em território? Nenhuma. E quantas auxiliámos, ou antes preservámos de iminente e completa ruína? Todas... A espada nua de Afonso de Albuquerque, lampejando em Ormuz, avassalando o Golfo Pérsico, e fazendo tremer a própria Meca.. já então salvou a Europa... mas para que buscar sucessos distantes de nós.. Quem senão o ferro Português abriu caminho em nossos dias ao salvamento da Europa? Seriam Jena, Austerlitz, e Friedland as primícias da Liberdade Europeia? E depois da invencível continência dos Hespanhóis, não competirá antes essa glória aos vencejantes louros, colhidos nos Arapiles, e em Victoria? Seriam por ventura mais frondosos os de Talavera, em que os Portugueses não tiveram parte? Se a Hespanha sucumbisse aos formidáveis Exércitos de Napoleão, quem teria forças para o deter na carreira de seus triunfos? Quem obstaria ao já mui adiantado cativeiro de toda a Europa? Como poderia a Inglaterra sempre infeliz, e mal sucedida nos seus desembarques Europeus, levantar um padrasto contra as agigantadas forças do mais célebre dos Conquistadores modernos? Era talvez um inepto; um fraco General, o que até é louvado; e tantas vezes aplaudido João Moore? Não o era por certo; mas faltaram-lhe dez mil Portugueses, que se os tivesse, por certo que seriam bem diferentes os resultados da Acção da Corunha, como foram bastantes uns 30$ Ingleses para defenderem Lisboa da agressão intentada por 110$ homens...

E para que trago eu estas memórias recentes, e geralmente sabidas, que por isso mesmo talvez sejam enfadonhas a uma boa parte dos meus leitores.... Trago-as porque estou cheio de confiança no valor, e na lealdade das nossas Tropas de terra... que não mudaram fisicamente, dentro de um espaço brevíssimo de tempo, e que devem reputar-se melhoradas, e adiantadas no moral, quando já não é um Chefe estrangeiro, quem as chama para a defesa de seu País, é sim um Rei natural, e legítimo quem as convida, para darem ao mundo novas lições de continência, e valor.

A Maçonaria, lisonjeou-se com a estulta opinião, de que já não há Portugueses como os de algum dia; aproveitou o descontentamento de certa classe de Fidalgos, (que pôde ser guardem nos seus Museus a Carta de Par, e as famigeradas [Pelles?], como testemunho eterno de que lhes parece honra, e não é senão perfídia, e fatuidade) fez valer a perícia, e a dexteridade de meia dúzia de franchinotes da Escola Coimbrã, espalhados por este Reino, e talvez empunhando nas suas mãos a balança de Astréa[?], que esquecidos de si, e dos seus deveres, e pode ser que aliciados com a esperança de uma Pasta, (só a dos meninos, que aprendem a ler, ficaria bem a este mentecaptos) fazem quanto neles é, para que o Sistema ressuscite, e prevaleça; pintou enfim a Loja Directora, que era chegado o momento favorável de sacudir-se o jugo imposto, e agravado pelo Senhor D. Miguel I....

Quanto se enganaram! E que vazio campo vai abrir-se à ingénita valentia, e lealdade dos Portugueses? Os Portugueses com o seu Rei à frente, e com o seu Rei dado claramente por Deus; para que não se acabasse a Fé em Portugal, serão invencíveis..... Parece-me, que estou vendo renascer os dias mais gloriosos do Exército Português.... Se um António Veloso, levando a Bandeira na tomada do Cabo de Gué, teve as mãos cortadas, e apesar disso segurou a Bandeira com os sangrentos cotos, e depois de lhe cortarem estes lhe agarrou com os dentes, e assim mesmo a plantou sobre as ameias da Fortaleza.... eu vejo tal ardor, e tal vontade de combater nos Soldados Portugueses, que já me parece estar vendo mais que uma heroicidade deste género. Se um D. Pedro de Menezes defendeu a Praça de Ceuta com um CACETE de Zimbro, facilmente aparecerá mais de um cento de imitadores de tão desusada valentia; se D. Lourenço de Almeida, estando numa Nau cheia de inimigos, somente com a sua espada lançou quatrocentos ao mar; e Duarte Pacheco só com 70 Portugueses combatia, e destroçava Exércitos numerosos; se D. Jorge de Castro se defendeu em Chale de 50$ Mouros com tal desproporção de forças, que a um dos nossos respondiam mil inimigos,e presumo que ainda haverá no Exército Português quem os imite no valor, e já poderia nomear um crescido número de briosos Oficiais, de quem espero outras semelhantes gentilezas de valor, mormente quando o seu Rei, (e que Rei!!!) lhes facilitar com os seus exemplos, e denodo, e lhes aplana os sempre [?]brosos, e árduos caminhos da heroicidade.

Vejo, (não me cansarei de o repetir) vejo em todos os Corpos do Exército Português uma cede, um empenho tal de combater, que me seria necessário ser o mais estúpido de todos os homens para deixar de conceber firmíssimas esperanças, de que se for indispensável correr às armas, por certo que nos será propícia a sorte dos combates. Esses veteranos, que mais de uma vez tem obedecido à voz do seu Rei, não os próprios, que militaram na guerra da Península, e que ainda não esqueceram a grande arte de vencer inimigos por mais numerosos, que eles sejam; esses veteranos formam num Exército já pronto, já adestrado para a guerra. E para que género de guerra? Para a mais sagrada de todas, em que será mui fácil cruzar as duas palmas da Lealdade, e do Martírio!!!

Parabéns, e mil parabéns à tão leal, como esforçada Guarnição de Lisboa, e aos Esquadrão Sagrado, que é no meu conceito a Guarda da Polícia, e aos Voluntários Realistas, e aos milhares de fiéis habitantes, que de súbito apareceram feitos Soldados, expondo-se, expondo-se, como se o fossem há largos anos, à maior força de um trabalho, que teria feito sucumbir os menos experimentados, se um princípio interior de coragem os não tornasse como de bronze, para mostrarem ao seu Rei, que nem se negam a defendê-lo, nem a morrer por ele.... Todos sem excepção parecem desde já prometer, afiançar, e até jurar, que não será menos o mui Alto e Poderoso Senhor D. Miguel I à testa dos seus Filhos, do que foram os Senhores D. João I, e D. Afonso V. É nestas circunstâncias, que o Reino de Portugal é para mim tão grande, e respeitável, que não posso consentir que lhe chamem pequeno. Muito embora sejamos pequenos em relação às grande Potências da Europa, que se nos avantajam em território seis, dez, e ainda mais vezes, e em forças navais, e terrestres, somos por certo demasiadamente grandes, para sermos escravos de qualquer Nação, por mais poderosa que seja, e que intente deprimir-nos, e agrilhoar-nos....

Representou-se-me agora estar ouvindo um como reparo, ou objecção dos meus leitores.... Pois não conheces o progresso horrível, e espantoso da gangrena interior, em que labora, e com que se definha todos os dias, e cada vez mais, e mais este desgraçado Reino? Não penetras o estado actual, e as forças do Maçonismo Português [melhor dizer "do Maçonismo em Portugal"]? Não tem ele abocanhado, ou empolgado nobres, e plebes, grandes e pequenos, sábios e ignorantes? De 1820 para cá tudo serve, e o que mais lhe importa é fazer crescer o número dos adeptos, para que no momento oportuno se desenvolva por tal arte, que nenhumas forças humanas o possam contrariar, ou vencer.... Nunca este infelicíssimo Reino de Portugal tratará de resistir a uma invasão estrangeira, sem que tome em contra, e ao mesmo passo outra invasão, qual é a dos seus próprios naturais, que hão-de metê-lo em dois fogos, e necessariamente lhe dividiram as forças, sem que muitas vezes saiba à qual deva resistir primeiro....

Confesso, que a objecção é forte, e seria fortíssima, e até indestrutível, se os Mações Portugueses [entenda-se antes "Mações em Portugal"] fossem os mais valentes, assim como são os mais cobardes de todos os homens. Dizia o Poeta Virgílio, que para as abelhas, quando mais assanhadas guerreiam entre si, não há remédio melhor do que atirar-lhes mãos cheias de poeira, e que logo todas essas rixas, e bulhas se desvanecem.

Pulueris exigui jactu compressa qui[?]unt

É igualmente simples, e fácil o remédio para os Mações, todas as vezes que se queiram rebanhar, e que zunindo levantem a grimpa contra os verdadeiros Realistas. É o CACETE, que anda tão impresso nas costas de uns, e na imaginação de outros, que já por vezes conseguiu pacificar este Reino.

Em S. Paulo de Frandes 7 de Agosto de 1831.

Fr. Fortunato de S. Boaventura.

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