19/06/14

HISTÓRIA DA FUNDAÇÃO DA REAL BASÍLICA E MOSTEIRO DO SANTÍSSIMO CORAÇÃO DE JESUS DA CIDADE DE LISBOA (VIII)

(continuação da VII parte)

No dia 17 do mês de Agosto do ano de 1788, dia célebre pela solenidade da Trasladação, que se celebra na Catedral de Orense, da nossa portuguesa Sta. Eufémia, cujo corpo se conserva numa arca de bronze: Pelo óbito da Beata D. Beatriz da Silva, fundadora da Ordem da Puríssima Conceição, Dama da Rainha D. Isabel de Castela, e irmão de D. Diogo da Silva primeiro Conde de Portalegre: pelo óbito de D. Leonor de Vasconcelos, Abadessa do Mosteiro de Celas em Coimbra; e pelos de outros mais santos, e santas Mártires; dia em que se contam 8 anos, nove meses, e vinte e quatro dias da primeira pedra fundamental, por ter sido lançada aos 24 dias do mês de Outubro do ano de 1779, sendo Geral da Ordem o R.mo Pe. Me. Fr. António do Nascimento, e Priora D. Teresa de Jesus, sua principal fundadora, superiora D. Teresa Maria José do Coração de Jesus, Fundadora; Clavarias as Madres Maria Teresa do Coração de Jesus, Maria Bárbara do Coração de Jesus; Madres Porteiras, Gertrudes Rosa do Coração de Jesus, Fundadora, e Maria Joana do Coração de Jesus, Fundadora; Sacristã a Maria Joana de Jesus, Fundadora.

Foram os mesmos sinos, que haviam sido fundidos no sítio das Amoreiras ao Rato, por José Domingues da Costa, conduzidos dias antes do Tesouro, onde se achavam cobertos com toda a segurança e decência, para a dita Basílica, onde se puseram do mesmo modo suspensos com  Magnificência extraordinária, na forma do Pontifical Romano, debaixo da arcada do pórtico da Igreja, todos em linha recta, e horizontal, uns após outros, sendo o primeiro da parte da portaria o dedicado ao Santíssimo Coração de Jesus, que tem de peso 190 arrobas, e 16 arretéis, ponto D. lá-sol-ré, onde se lê a seguinte letra "Discite a me quia mitis sum et humilis corde."


O segundo a Nossa Senhora do Carmo, de peso de 135 arrobas, e 26 arretéis; ponto E. lá-mi no qual se acha esta letra "Qui me invenerit, invenit vitam, et hauriet salutem a Domino". O terceiro a S. José, de peso de 95 arrobas, e 30 arretéis; ponto Dó-fá-ut e tem esta letra "Venit filii, audite me". O quarto é dedicado a Santa Teresa, e tem de peso 80 arrobas, e 1 arretél; ponto G. sol-ré-ut; e por letra "Regem Virginum Dominum, venite adoremus". O quinto a Santo Elias, e tem de peso 56 arrobas, e 29 arretéis; ponto A. lá-mi-ré; e tem esta letra "Quaerite Dominum dum inveniri potest, invocate eum, dum prope est". O sexto, a Santa Bárbara, e tem de peso 40 arrobas, e 24 arretéis; ponto B. fá-mi; e por letra tem "Nolite timere, fugite partes adversae; vos, et mundum vicit Jesus Christus". O sétimo, a S. João da Cruz; que tem de peso 32 arrobas, e 30 arretéis; pornto C. sol-fá-ut e tem esta letra "Psalite Deo nostro, psalite; psalite Regis nostro, psalite". O oitavo a S. Norberto; tem de peso 23 arrobas, e 30 arretéis; ponto Delasobré; no qual se lê "Hodie si vocem Domini audiritis, nolite obdurare corda vestra". O nono para o relógio; ao Santíssimo Sacramento; tem de peso 275 arrobas, e 1 arretél; ponto D. sol-fá-ut, e por letra "in voce exultationis resonent epulantes in mensa Domini". O décimo das meias horas a S. Miguel, e tem de peso, 134 arrobas e 20 arretéis; ponto E. lá-mi; e no mesmo está esta letra "Laudemus Dominum, quem laudant Angeli, quem Cherubim, et Seraphim Sanctus, Sanctus, Sanctus, proclamant". E o undécimo dos quatro a Sto. António; tem de peso 79 arrobas, e 30 arretéis; ponto G. sol-ré-ut; e no mesmo se lê "Laudate Dominum in Sanctis ejus"; sendo o peso total dos sinos 1145 arrobas, e 21 arretéis: em cada um destes sinos se acha esculpida uma letra, que mostra quem foi o Ex.mo Bispo que os sagrou.

Sino do SS. Sacramento
Sino de S. Miguel Arcanjo
Estavam os arcos da dita arcada tapados de madeira com suas bandeiras de vidro por cima, e toda ela ricamente ornada, tanto no seu pavimento, como nos lados, e teto, como fica exposto. Sendo a Rainha M. S. D. Maria I Padroeira do Mosteiro, e sua Alteza o Senhor D. José príncipe do Brasil, o Senhor Infante D. João, a Senhora Infanta D. Carlota Joaquina, e a Senhora Infanta D. Maria Ana servidos honrar com a sua imediata assistência, e de perto esta solene função, se fabricou no alto dos três pórticos da igreja uma magnifica tribuna, com três repartições, estando na do meio, e principal os mesmos Senhores, e na do lado direito as Damas, e na do esquerdo as açafatas.

Para os mesmos Senhores passarem para a mesma tribuna, se formou de madeira com a mesma figura que há-de ter depois de acabada de pedraria, o corredor, onde estão os confessionários, que vai da portaria entrar no cruzeiro da igreja; pelo qual, e pela nave principal da mesma, continuava a dita serventia até o pórtico da igreja, onde estava armada a dita tribuna, subindo-se para ela por uma magnífica escada, em forma de trono, tudo ricamente armado, assim no pavimento, como nos lados, como se vê da descrição individual da armação.

Armou-se também do mesmo modo a portaria que fica fronteira à dita vista directamente para a mesma arcada, para assim as religiosas poderem livremente também lograr a solenidade da função, para o que foi mandado tirar a porta do guarda-vento do dito lucutório, onde estiveram as mesmas religiosas encobertas todo o tempo da mesma.

Preparado assim tudo, além da tropa ordinária, que costuma estar na guarda do mosteiro, e da Guarda dos Archeiros, que acompanha a S. Majestade nesta ocasião, comandada pelo Capitão da Guarda Real o Conde de Resende, D. António de Castro, foi mandado vir mais um corpo de 40 soldados de infantaria do Regimento de Peniche, comandado pelo Alferes António da Silva, e outro de cavalaria de 8 soldados do Regimento de Alcântara, comandado, pelo Cabo de Esquadra João Malaquias, para conservarem em paz, e ordem devida o imenso concurso de carruagens, e povo, que neste dia com grande alvoroço concorresse a esta solene função.

Estando ultimamente tudo ordenado, chegaram ao mosteiro Sua Majestade e Altezas às 4 horas e 46 minutos da tarde, acompanhados dos seus respectivos criados; por quanto por camaristas de S. Majestade Fidelíssima vinham os Ex.mos Conde de Vila Flor, e o Marquês de Angeja; do Príncipe, D. Francisco Xavier de Menezes Breiner; por veador da Princesa, D. José Joaquim Lobo da Silveira; do Infante, o Conde de Lumiares Manuel da Cunha; da Infanta, D. Carlota Joaquina, o Conde da Ega; da Infanta D Maria Ana, D. Cristovão Manuel de Vilhena, Veador; a Camareira  Mor, Marquesa de Tancos; a Dama de Honor, a Condessa de Lumiares D. Juliana Xavier Botelho; a Dama D. Teresa Joana de Portugal; da Infanta D. Carlota Joaquina, a Dama da Câmara; da Infanta D. Maria Ana; a Dona da Câmara de S. majestade D. Margarida Sofia de Lacerda Castelo Branco; Açafatas de S. majestade, D. Joana Rita de Lacerda Castelo Branco, e D. Maria Micaela de Lacerda Castelo branco; Açafata da Sereníssima Princesa, D. Maria do Carmo de Lima Botodo: Açafata da Sereníssima Infanta D. Carlota Joaquina, D. Maria Ana Perpétua de Mendonça: Açafata da Sereníssima Infanta D. Maria Ana, D. Maria da Piedade de Lacerda.


Estavam já esperando a Sua Majestade, e Altezas, os Ex.mos Visconde de Vila Nova de Cerveira, como inspector das Reais Obras Públicas, e o Arcebispo de Tesalónica D. Fr. Inácio, Confessor de S. majestade: foram recebidos estes Senhores com as devidas demonstrações de gosto, e da mais fiel vassalagem, correspondendo a tudo S. Majestade com afabilidade mais que ordinária, e entrando deste modo os mesmos Senhores pela portaria de fora, foram conduzidos à dita tribuna, para se dar princípio a esta função.

Havia-se preparado com igual magnificência uma casa no fim do corredor, que vai da portaria para a igreja, donde logo saiu paramentado o Ex.mo. Bispo do Algarve D. José Maria de Melo, da Casa dos Monteiros Mores do Reino e sobrinho da Priora D. Teresa de Jesus, assistido de dois Cónegos da Basílica Patriarcal, paramentados em Diácono e Cónego D. Lourenço de Lencastre, e em Subdiácono seu irmão o Cónego D. Dezidério de Lencastre; dos dois Capelães Fidalgos com exercício neste mosteiro, o Beneficiado João Pinto da Serra, e o Dez.or Manuel Pereira Cidade; dos outros dois Capelães que havia no mesmo mosteiro, o Pe. Zeferino José Leoniza do Poço, e o Pe. José Caetano de Lima, e do Sacristão João Baptista Vito, sendo Mestre de Cerimónias da Patriarcal o Beneficiado José Pedro Gonçalves, o Beneficiado José Rebelo Seabra, ambos Directores da função, e o Beneficiado Teodoro Rodrigues da Costa, assistente.

Altareiros Que Vieram da Patriarcal

O Pe. Teotónio João Antunes, e o Pe. José Nicolau; Acólitos: o Beneficiado Teodoro Pereira Rego, o Pe. Lúcio José de Gouveia, o Pe. Raimundo Nonato, o Pe. João Ribeiro Neves, o Pe. Manuel da Cruz, o Pe. António Pedro de Lima;Tesoureiros: o Pe. José Eloy Vieira, o Pe. José Correia, Capelães Cantores; o Pe. Francisco José da Cruz, o Pe. Bartolomeu Franco, o Pe. Manuel António Xavier, o Pe. Francisco Alvares, o Pe. Estanislau José da Silva, o Pe. Dionísio José Ribeiro, o Pe. Manuel pinto de Bastos, Valério José Freire, António dos Santos Calado, José Joaquim Borges, João Evangelista.


Sacristas

António dos Santo Alves, Joaquim de Morais, Joaquim José da Penha, josé Roberto, José Crispim do Couto, António Gomes Picete, Vicente José e Mateus José da Costa.

Faquinos que conduziram tudo o que foi preciso, Braz Francisco, Luís Manuel: Ajudantes: Lázaro de Lima, António Nunes, e João Francisco.

Por este modo continuou a procissão com cruz diante, até ao dito lugar, onde se achavam os sinos, e se deu princípio à função às 4 horas e 48 minutos da tarde, e findou às 6 horas e 36 minutos: Esta função foi feita na forma ordenada no Pontifical Romano, e com a perfeição que se podia esperar do Ex.mo Bispo sagrante.

Acabada a função, os sinos dirigirão logo as primícias do seu minsit´rio a S. Majestade, que como tais pela mesma Senhora, e Altezas foram atentamente aceitas, dando-se logo repique nos primeiros oito sinos, e depois mais alguns também nos três do relógio.

Sendo assistente a esta função as Ex.mas Marquesa de Alvito, e outras fidalgas da mesma qualidade; o Conde de Val de Reis, e outros fidalgos; o Desembargador Juiz da Coroa José Joaquim Vieira Godinho, e outros muitos ministros; os padres graves da Ordem, e muitos outros de outras ordens, e muitas mais pessoas qualificadas de todas as ordens, e hierarquias; sendo entre todos os actos desta solene função visto com o seu costumado zelo, e actividade o Fiscal da obra Anselmo José da Cruz Sobral, e seus parentes.

Completa pois por este modo a função, Sua majestade e Altezas acompanhados de toda a sua família, se conduziram ao mosteiro, e prostrados no coro diante do altar do Sacramento, renderam ao Altíssimo as devidas graças, sendo tanto antes, como depois, recebidos da Priora e religiosas com as devidas cerimónias, e acatamentos, como era de esperar desta prelada: Todos os Senhores como agradecidos se demoraram no Moteiro largas horas.

Entretanto o Ex.mo. Bispo sagrante com alguns fidalgos mais, e todas as mais pessoas eclesiásticas, que assistiram a esta tão solene função, foram conduzidas pelo mesmo fiscal Anselmo José da Cruz, e por seu filho o Desembargador Sebastião António da Cruz Sobral, às salas do palacete, onde o mesmo fiscal havia antecipadamente mandado preparar um tão grandioso, como delicado refresco; sendo em todos notável o júbilo e satisfação com que solenizaram esta acção, em correspondência da sua Augusta Soberana.

(continuação, parte IX)

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