02/02/13

DA OBEDIÊNCIA (III)

(continuação da II parte)



 


LIÇÃO XIV
Da Obediência

Muita adversidade experimentaram os filhos desobedientes, dos quais referiremos alguns exemplos que sirvam para escarmento, como os outros para imitação. Diga-o a maldição que fulminou o velho Noé sobre seu filho Cam pela desobediência que sua geração, e foi a primeira servidão, que se introduziu no mundo, mas também serem seus irmãos melhora dos na herança, e bens: Genesis cap. 9. Diga-o Rúben, que pela desobediência com que tratou a seu pai Jacob perdeu o morgado, o sacerdócio, e o Reino: Genes. cap. 9. Diga-o Absalão, que pela desobediência de seu pai David morreu desastradamente enforcado numa árvore lib. 2 Regum cap. 18. Digam-no aquele sete filhos de quem escreve Santo Agostinho de civitate Dei lib. 2 cap. 8 que sendo amaldiçoados por sua mãe por terem-na injuriado ficaram com um termo de Pelesia tão horrendo, e horrível, que era espanto de quantos os ouviam; e passando-se alguns dias sem passar aquele acoite tão estranho, e não podendo os padecentes sofrer a admiração do povo, se foram desterrados de sua pátria vagando pelo mundo como outro Caim fugindo à vista de seus parentes, e conhecidos.

Dêmos uma vista às histórias humanas, e veremos um pouco do muito que escrevem os historiadores: e diga-o Crano filho do Imperador Cloratarlo, que pagou o haver desobedecido a seu pai com morrer queimado vivo dentro de uma casa com todos os seus filhos, mulher, e criados, como escreve Aimin de gestis Francorum lib. 2 cap. 30. Diga-o D. Sancho filho de D. Jaime I de Aragão, que pagou a rebelião, e desobediência de seu pai morrendo no rio Cinga, que como verdugo o arrebatou com suas ondas sepultando-o nelas desastradamente. Diga-o Salim filho de Bacaleto, que desobediente e rebelado contra seu pai com ambicioso desejo de Reinar lhe apresentou batalha, na qual foi vencido, e poucos anos depois veio a morrer no mesmo lugar. Diga-o Besso, de quem escreve Plutarco in lib. de fera muminum vindicta que matando a seu pai com tanto segredo, que o não viram mais que umas andorinhas, estas o perseguiram em toda a parte chamando-lhe traidor de maneira que a ele lhe veio a crescer tal ódio, que aonde as via tratava de as matar; e sendo repreendido de usar tal tirania, respondeu, que estas andorinhas lhe levantavam um falso testemunho de que havia morto seu pai, de que dando-se conta a ElRei, e examinado Besso, veio a confessar o crime, e foi por ele como merecia castigado. Quais forem os filhos para seus pais, diz o Espírito Santo no cap. 3 do Ecclesiastes, tais serão seus filhos para com eles, o que também conheceu o historiado Romano Lúcio Floro, que disse que naquela moeda em que os filhos pagarem o amor, e obediência devida aos pais, nessa mesma lhe corresponderão seus filhos ao merecido agradecimento: Quequaestipendia parentibus impenderis, eadem a filiisexpecta. Isto se viu experimentado na célebre Cidade de Lisboa, onde um mau filho arrastou por uma escada a baixo a seu pai,mas permitiu Deus que este filho tivesse igual castigo, porque deste mau filho nasceu outro que pondo mãos em seu pai, o levou arrastado da mesma sorte pelo mesmo lugar, até que chegando a certo passo disse, basta filho, basta, que já entendo o castigo da Divina justiça, basta, que até aqui arrastei eu também a meu pai, esta é justíssima providência do Céu, muito bem está ordenado que quem tal fez, que tal pague.

(continuação, aqui)

Sem comentários:

TEXTOS ANTERIORES