22/02/11

A TAXA DE "ANALFABETOS QUE SABEM LER" CRESCE

Agradeço a quem me enviou este interessante texto que tão bem um tipo de mentalidade produto do nosso tempo. Os professores foram formados como alunos do mesmo sistema de ensino. Há uma "ideologia" na base da argumentação e orientação destes agentes de deformação ("formação"), que contrasta com tudo aquilo que temos herdado da nossa antiga civilização europeia (e católica):


ANALFABETISMO E ILITERACIA


   Na minha última crónica prometi voltar ao assunto do analfabetismo em Portugal, lepra que resiste a todos os tratamentos.

   Mau grado o desaparecimento dos constrangimentos que impediam as mulheres e os camponeses de acederem ao ensino e os milhões que actualmente são afectados a esta fatia do fisco, o panorama ainda não é muito risonho. Nem com as folclóricas campanhas de alfabetização do PREC esta chaga se curou. Em Fevereiro deste ano de 2010, segundo dados do INE, cifra-se ainda acima de 9% o número de cidadãos de idade superior a 10 anos que não sabem ler, o que dá o número de um milhão de analfabetos.

   Modernamente, porém, surgiu outra mazela que supera em gravidade este ainda elevado número de analfabetos: os falsos alfabetizados, isto é, indivíduos que sabem ler mas não são capazes de perceber o que lêem ou de traduzir por escrito o que sabem: aquilo a que se chama iliteracia.


   Segundo um artigo assinado pelo jornalista Luís Rodrigues há pouco mais de um ano, o panorama é este: “É possível a um aluno passar de ano sem ter estudado nada e, depois, tirar um curso superior numa privada qualquer. Como, após o acordo de Bolonha a que Portugal aderiu, uma licenciatura é equiparada a um mestrado, hoje é possível ser mestre sem saber ler nem escrever”.

    Na “escola antiga”, ensinava-se a interpretar o que se lia. E nas provas orais do “exame” – palavra em vias de extinção no léxico escolar – não obtinha aprovação aluno que mostrasse não saber interpretar um texto do seu livro de leitura. De acordo com a moderna filosofia do ensino, não se deve exigir nada aos alunos que não lhes apeteça fazer. Dito de outro modo, a aprendizagem não passa de uma brincadeira e nada de exigir esforço aos alunos. O articulista Manuel António de Pina, no Jornal de Notícias de 18 do corrente, inicia assim a sua crónica: Os pais deviam ensinar aos filhos que, ao contrário do que os professores antigos ainda ensinam na escola, não é com estudo e trabalho ou com mérito que se vai longe na vida. Que comentários merece tal situação? Socorro-me de um livrinho da autoria de Maria do Carmo Vieira – O ENSINO DO PORTUGUÊS, Junho de 2010 – do qual respigo apenas dois ou três comentários para que o leitor menos familiarizado com a aberração que é o ensino hoje, em Portugal, faça uma ideia do que se passa: Ainda que os mentores desta nova reforma (2003/4) justifiquem terem as alterações sido efectuadas em nome dos “interesses dos alunos”, estes são, na verdade, as vítimas porquanto iludidos por um sistema de facilidade que apaga o esforço, o espírito de sacrifício e a força de vontade, inerentes ao acto de aprender, criando-lhes a ilusão do êxito […] Correndo o risco de me alongar demais, não resisto a transcrever ainda este eloquente episódio ocorrido com a Autora do referido livro: Foram os professores convocados, certo dia, para ouvir um grupo de colegas, destacados do Ministério de Educação os quais, na introdução feita, se apresentaram como mensageiros de uma “nova metodologia pedagógica”. Para ser mais explícito nos objectivos, um desses professores interpelou-nos: “Colegas, imaginem que estão numa sala de aula, o dia está radioso e um aluno, depois de olhar lá para fora, sugere que vão para o recreio jogar futebol. Perante o silêncio, resultante da estranheza, foi o colega que, impaciente, adiantou a resposta: “Se fosse um professor tradicional, preocupado apenas em adiantar a matéria, contrariaria o aluno dizendo-lhe, que quando tocasse para o intervalo, teria tempo de jogar futebol com os colegas. Pelo contrário, se fosse um professor compreensivo e atento aos aspectos pedagógicos, aceitaria de bom grado a proposta, convidando a turma a participar nesse convívio tão necessário à aproximação professor-aluno”.

     Comentários? Se é para aprender a dar pontapés na bola que a Escola serve, acho que se podia acabar em bloco com o ensino oficial em Portugal, incluindo Ministério e Ministros, salas de aula, cantinas escolares, professores, auxiliares de educação, os próprios alunos e outras muitas despesas que o funcionamento de tão complexa “máquina” pressupõe. E trocar tudo isto por terraplenos onde os jovens apenas teriam de obedecer ao apito de um qualquer Tiririca fantasiado de treinador. Sem dúvida que alguns génios da bola haviam de surgir. Para os alunos que quiserem aprender a sério e os pais tiverem meios para investir nos filhos, deixava-se isso nas mãos do ensino particular com despesas à sua custa. Em poucos anos o Estado poupava para tapar o buraco financeiro do País; e o ensino – ensino a sério – ganharia largamente em qualidade. O resto – quantidade sem qualidade – não merece desperdícios. Escola que não cultiva valores, que não prepara para o desempenho de funções com responsabilidade e competência, de que serve? Para os cidadãos que, no devido tempo, deviam ter aprendido e não quiseram aprender, o nosso Governo inventou agora as chamadas “novas oportunidades”. No Diário de Notícias do dia 26 de Setembro passado, o sociólogo Alberto Gonçalves, referindo-se ao oportunismo destas oportunidades, leva a caricatura a este ponto: "Por que é que não se saltam as novas oportunidades e se distribuem doutoramentos aos recém-nascidos”?

    Quanto tempo e dinheiro se não pouparia também aqui? E assim se passa o tempo a brincar com coisas sérias.
                                                                                              
ANTÓNIO MATOSO

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