Para ilustrar a troca de ideias decorridas na caixa de mensagens do artigo anterior, deixo um artigo redigido pelo Rev. Pe. Christian Bouchacourt, Director do Distrito da América do Sul da FSSPX, e publicado na revista oficial do mesmo Distrito "Jesus Christus" (ano XX, nº 121, Janeiro/Fevereiro de 2009):
"E AGORA?
Parece que não se leu ou não se escreveu a propósito do decreto que Roma publicou em 21 de Janeiro passado sobre a "excomunhão" que afectava os quatro Bispos da Fraternidade desde 1988! A publicação deste documento, que embora imperfeito, constitui um acto corajoso do Papa Bento XVI, cujas consequências convêm analisar agora, depois da tormenta mediática tranquilizar um pouco.
Antes de mais existe um facto histórico: a 1 de Julho de 1988, o então Perfeito da Congregação para os Bispos publicou um decreto de excomunhão contra Monsenhor Marcel Lefebvre, Monsenhor António de Castro Mayer e os quatro Bispos da Fraternidade Sacerdotal S. Pio X que tinham sido consagrados por eles, informando-os, à própria Fraternidade e suas obras.
Certamente, como disse frequentemente Monsenhor Bernard Fellay, Superior Geral, esta censura é nula, tanto perante Deus como segundo o direito canónico, de modo que não temos necessidade de ser absolvidos, e que não existe. Contudo, no decreto de 21 de Janeiro de 2009 é bem-vindo porquê de facto a Tradição estava realmente excomungada pelo antigo direito.
Assim, quanta gente, carente das claridades necessárias, atemorizou-se por esta sentença e não se atrevia a passar as portas das nossas capelas e igrejas durante mais de vinte anos! Este direito é bastante deplorável no que respeita a não ter declarado nulo o de 1988; mas, por outro lado, é compreensível que Roma devesse guardar a compostura e não desdizer-se, dando aso a minguar mais uma autoridade que já está colocada no banco dos réus.
A nossa alegria, contudo, não está completa, porque nosso Fundador, Monsenhor Lefebvre, não foi explicitamente reabilitado; assim o fez notar Monsenhor Fellay na sua carta aos fieis de 24 de Janeiro passado, na qual aguardava a "sua eminente reabilitação".
O desejo que expressa este decreto no que toca ao querer abordar a questão doutrina, ou seja, o tema de fundo que nos opõe a Roma desde há quase quarenta anos, é uma resposta a uma condição colocada por Monsenhor Lefebvre no dia seguinte às consagrações e que expressava nestes termos:
"Se querem que voltemos a falar, nesse momento serei eu quem porei as condições (...) Eu situarei a questão a nível doutrinal: Estão de acordo com as grandes encíclicas de todos os Papas precedentes? Estão de acordo com "Quanta Cura" de Pio X, "Immortale Dei" e "Libertas" de Leão XIII, "Pascendi" de S. Pio X, "Quas Primas" de Pio XI e "Humani Generis" de Pio XII? Estão em plena comunhão com este Papas e suas afirmações? Aceitam o juramento anti-modernista? Estão a favor do Reinado Social de Nosso Senhor Jesus Cristo? Se não aceitam a doutrina dos vossos predecessores, é inútil falar".1
Depois de ter esperado mais de 20 anos, é o próprio Papa quem convoca estas discussões doutrinais:
"Até que as questões relativas à doutrina não se aclarem, a Fraternidade não tem nenhum estado canónico na Igreja , e seus ministros, não obstante foram libertados da sanção sanção eclesiástica, não exercem legitimamente ministério algum na Igreja" 2
Bento XVI recorda que:
"Quem quer ser obediente ao Concílio, deve aceitar a fé professada ao longo dos séculos e não pode cortar as raizes das quais vive a árvore". 3
Desta maneira, o problema ficou apresentado com exactidão. O Papa ensina que existe continuidade entre os concílios anteriores e o Concílio Vaticano II, enquanto que a Fraternidade S. Pio X afirma que o último concílio está em flagrante ruptura com a Tradição.
Monsenhor Fellay, como digno sucessor de Monsenhor Lefebvre, deseja que os textos conciliares sejam passados pelo crivo da Tradição:
"Longe de querer deter a Tradição em 1962, desejamos considerar o Concílio Vaticano II e o ensinamento pós-conciliar à luz desta Tradição que S- Vicente de Lérins definiu como "o que sempre foi acreditado, por todos e em todas as partes" (O Conmonitório), sem ruptura e segundo um desenvolvimento perfeitamente homogéneo. Só assim poderemos contribuir eficazmente para a evangelização que pediu o Salvador". 4
Deste modo sairão à luz todas as ambiguidades e erros que pululam em muitos textos conciliares.
Teremos que estar convencidos de que o fim primeiro das discussões da Fraternidade S. Pio X com Roma não radica na obtenção de um estatuto canónico para ela mesma mas sim na realização de um serviço a favor da Igreja, ajudando as autoridades eclesiásticas a que voltem à Tradição. A questão canónica, que tem a sua importância, não será abordada senão quando estiverem assentes as bases desta restauração. A Fraternidade Sacerdotal S. Pio X não trabalha para ela mesma senão para a Igreja!
Alguém poderia objectar o seguinte: Por acaso não é utópico e ingénuo querer esperar tal reabilitação da Tradição na Igreja, considerando o quanto o modernismo se enquistou em Roma?
Pensar desta maneira implicaria esquecer que a Igreja é divina tanto na sua origem como na sua constituição. Podemos esperar, com efeito, que Deus recompensará o inegável valor que Bento XVI manifestou concedendo os pressupostos que solicitava à Fraternidade, y que os dotará das forças e luzes necessárias para concretar uma restauração que parece impossível do ponto de vista humano. Quanto tempo levará isso? Apenas Deus o sabe! Recordaremos contudo que quando S. Pedro tinha sido colocado na prisão "a Igreja orava incessantemente por ele" 5 e que uma inesperada libertação sumiu a seus discípulos "estupefactos" 6, precisamente porque era imprevisível.
É importante considerar também as reacções furiosas dos que enfrentam a Tradição como resultado da publicação do Motu Proprio que reabilita a Missa de S. Pio V e do decreto sobre as supostas excomunhões. Gerou uma incrível oposição não só contra a Fraternidade Sacerdotal S. Pio X senão também contra o papado e foi levada adiante por todo o episcopado, como foi o caso do da Alemanha.
É claro que quanto mais o Papa quisesse afastar-se do espírito do mundo e de seus princípios para acercar-se à Tradição católica, outro tanto terá de sofrer a perseguição de Nosso Senhor Jesus Cristo predisse a seus Apóstolos na quinta-feira Santa:
"Se o mundo vos odeia, sabei que antes Me odiou (...) Se Me perseguiram, também vos perseguirão". 7
Os acontecimento recentes lançam um brecha de luz sobre a profecia da Virgem de Fátima:
"O Papa terá muito que sofrer"
A Fraternidade conhece estas perseguições há 30 anos e talvez ajudem o Papa a pensar, agora que ele mesmo se encontra no meio da tempestade.
Que acontecerá agora? Já veremos que forma concreta tomarão estas discussões doutrinais. É evidente que a Fraternidade S. Pio X conservará a liberdade de palavra, a qual não deixou de exercer desde a sua fundação. Continuaremos defendendo a Tradição, seguiremos denunciando os erros do modernismo que corrói a Igreja no seu próprio interior, e prosseguiremos trabalhando pelo restabelecimento do reino de Cristo Rei.
Que acontecerá agora? Já veremos que forma concreta tomarão estas discussões doutrinais. É evidente que a Fraternidade S. Pio X conservará a liberdade de palavra, a qual não deixou de exercer desde a sua fundação. Continuaremos defendendo a Tradição, seguiremos denunciando os erros do modernismo que corrói a Igreja no seu próprio interior, e prosseguiremos trabalhando pelo restabelecimento do reino de Cristo Rei.
Neste contexto cada um deve conservar o seu posto, convencido de que os superiores são os únicos que têm as graças de estado para guiar-nos nas numerosas emboscadas que nos rodeiam. Saibamos que têm consciência ante Deus dos deveres que lhes incumbe, nas lides de ajudar Roma a voltar à Tradição graças a estas discussões doutrinais que se anunciam. Rezemos por eles, cooperemos com eles com os nossos sacrifícios e renovemos-lhes a nossa confiança. Deixemos de lado os rumores e não reparemos mais que nos textos oficiais publicados pela Fraternidade, em vez dos comentários mais ou menos duvidosos que se publicam na Internet ou noutras partes.
Acabámos de terminar a Semana Santa, em cujo percurso seguimos de perto de Cristo sofredor, morto e sepultado até à sua gloriosa ressurreição. A Igreja, que é "Cristo continuado", também sofre, tem seu Calvário, e é crucificada por inimigos que queriam leva-a ao sepulcro. Convença-mo-nos que esta paixão também chega ao seu fim. Ela dependerá de Deus; Ele saberá acolher nossas preces e sacrifícios. Rezemos pelo Santo Padre e pelos superiores da Fraternidade Sacerdotal S. Pio X, Não é de católicos desesperar! Afastemos a suspeita, os rumores mortificantes, recordemos que Cristo está junto à Igreja e especialmente junto ao seu Vigário até ao fim dos tempos, e que orou poe ele "para que sua Fé não desfaleça". 8 Isto é de Fé.
Que Deus vos abençoe."
Padre Christian Bouchacourt
Superior de Distrito da América do Sul
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