Que cidades e vilas pretendem ser pátria de S. Dâmaso.
1. Trataremos agora da pátria de S. Dâmaso que por falta de escritores antigos ficou escurecida. Este santo Papa foi Hespanhol [entenda-se “da Península Ibérica”], como afirma o Breviário Romano (Brev, R. in Damaso), sobre cuja pátria se levantou outra contenda, como já houve sobre a de Homero entre as sete cidades, de que Aulo Gelio faz menção (Gellius noct. Attic. Lib. 3. 6. II). As que sobre Dâmaso contendem são cinco, que logo nomearei com os fundamentos, que cada uma tem para si. Primeiramente, diz Lúscio Marineo (Marineo de Las Cosas Memorables de Hesp. I. 2 in fine, Illescas. en Dâmaso Beuter p.1 cap. 25) que, segundo a opinião de muitos, este santo nasceu em Madrid e, acrescenta Illescas, que na Igreja de S. Salvador daquela vila está uma letra [inscrição, carta ou documento] que o diz. O doutor Beuter na sua crónica geral de Hespanha [entenda-se “ da península Ibérica”] o faz natural de Tarragona, cidade antiga, e nobre de Catalunha. O Padre frei Bernardo de Braga homem diligente, e curioso, afirma, que é natural de Citánia, no termo que agora é de Guimarães, e diz que assim o canta a Igreja de Braga e que o traz Vaseo na sua crónica de Hespanha [entenda-se “da Península Ibérica]. O que tudo consta de uma carta que ele me ofereceu, remetendo-me a outra obra onde diz que o mostra.
2. Onuphrio Veronense (Onuphr. I. 2 de Rom. Pontif.), autor grave, no livro dos Pontífices Romanos fa-lo Lusitano, Egitaniense, por estas palavras:
“Sanctus Damasus Antonii filius, Egitanensis, Lusitanus, Hispanus”.
Acerca desta cidade Egitaniense, Gaspar Barreiros (Gaspar Bar. III. De Badajoz) na sua Chorographia diz que na Lusitânia houve uma cidade chamada Igaedita, a qual na repartição dos Bispos, que fez el’Rei Vuamba, é chamada por corrupção Odónia, e Edanhas, cujo Bispado se mudou para a cidade da Guarda, onde hoje se preserva com o mesmo nome Igaeditanense. Vaseo (Vaseus (…) I (…) Cap 20) também fala desta cidade por estas palavras:
“Episcopatus Egitanus: Scribendum erat Igaditanus, ut antiqua monumenta declarant. Igadita civitas erat Lusitanie, nunc vicus obscurus, Edania dictus, Episcopalis sedes in Guardiam civitatem translata est.”
Quer dizer, Bispado Egitano. Houvera-se de especular Egaeditano, como declaram memórias antigas, Igaedita era cidade Lusitana, mas agora é uma aldeia de pequeno nome chamada Edanha [Idanha]. E a cadeira Episcopal, que nela estava, passou para a Guarda. Morales tratando dos Bispos, que estiveram no segundo concílio Bracarense diz assim:
“Adotio da cidade de Igaditana, que ia se disse foi em Portugal, onde hora està o lugar chamado Idanha-a-velha.”
3. Raphael Volaterrano, na sua Geographia, chama a esta cidade Egitania e daqui vem o adjectivo Egitanense [egitaniense], que Onuphrio traz, assim que faz a Dâmaso natural da antiga Idanha, Este autor foi homem doutíssimo, e de raríssima curiosidade e diligência, como em suas obras se vê, o qual para fazer o seu livro dos Pontífices Romanos buscou e revolveu todos os templos, livrarias, e cartórios de Roma. E certo é que Dâmaso foi eleito papa em Roma, e nela teve sua mãe e irmã, e possível é que deles mesmos saísse a notícia de sua pátria. E lembro ao leitor que aquela autoridade de Onuphrio, em que faz a Dâmaso Egitanens [egitaniense], anda nos exemplares deste autor impressos em Veneza no ano do Senhor 1557. E em outros não anda, senão de alguns homens que quererem emendar a lição de Ohuphrio por Vaseo, e por outros, que o seguem. E em outros não anda uma coisa nem outra, porque vendo os impressores esta variedade, e não determinando qual era a verdadeira lição de Onuphrio, deixaram em branco este lugar no que toca à pátria de S. Dâmaso. Mas a verdadeira é a que nós alegamos da impressão de Veneza, com que concorda João Batista de Cavallieri nas suas imagens dos Papas, onde tratando de S. Dâmaso diz assim:
“Sanctus Damasus Antonii filius, Egitanensis, Lusitanus, Hispanus S.R.E. diaconus Cardinalis à Papa Libério factus etc.
(a continuar)
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