04/02/11

"FREUD EM CIFRA" IV


(continuação do "Freud em Cifra" III)





4º) O Subconsciente

Chama-mo-lo assim, porque designação "O Inconsciente " de Freud não foi recebido pelos psicólogos, por ambiguidade.

Significa aquilo-que-está-sob-a-consciência; e designa uma realidade psíquica complexa, que ingressa desde as condutas mais normais: como a percepção consciente. Os psicólogos "estructuristas" ("Gesthalt-psychologie") provaram com muitas experiências e análises, no campo da percepção sensível, a intervenção forçada de elementos subconscientes: que se dividem nos capítulos de "significação" (intervenção de elementos intelectuais e mnemónicos) e a "estima" (intervenção do afectivo-volitivo). A velha doutrina aristotélica ensinava o mesmo com outras palavras: a "vis aestimativa" e a "conversio ad phanásmata".

Tomemos um exemplo mais à mão: nesta página, se fixarmos o olhar no "S" de "Subconsciência", e depois invertermos a página e olharmos novamente, teremos um resultado inesperado: primeiro a haste (olho) mais alta parecerá maior; e a que agora está mais alta (que antes era a que estava em baixo) também parecerá maior: um elemento subconsciente opera na minha visão. Igualmente em todas as "ilusões ópticas"; o bastão na água "quebrado"; os olhos do retrato que me seguem esteja eu em qualquer ponto da sala; os desenhos de círculos, cubos ou escadarias que aduzem os "gesthaltistas", etc.

Deste fenómeno, o mais simples revelador  do Subconsciente, passemos brevemente a outros mais complexos, sempre por via de exemplos: os lapsus ou actos falhados, de memória, verbais, escritos ou gestuais e  suas causas; todos os chamados "palpites" ou "intuições" ou "acertos intuitivos" até chegar à decantada "inspiração" artística; as estranhas construções fantasmagóricas dos sonhos; as distracções, até chegar ao êxtase; o sonambulismo e a hipnose; os acidentes de "ausências" e "fugas" dos epilépticos; os casos de desdobramento de personalidade ("depersonalização") no histerismo agravado; essa espécie de invasão caótica de imagens e afectos parasitas na mente, que constituem a psicose "confusão mental"; e a tirania da mente por uma noção e um afecto egolátricos desdobrados, que inflige a "paranóia"... todos são fenómenos que revelam a existência deste palco de fundo psíquico; não em forma de depósito, como concebem filósofos de segunda; mas em forma organizada e ainda sistematizada. Sem subconsciência não poderíamos nem ler inglês, nem andar em  bicicleta: pois ela guarda os "hábitus".

A subconsciência é o "Isso" ou o "Loque" ("Das Es"). Freud distingue na consciência três estratos: o Isso, o Eu e  o Supereu; que corresponderiam à Subconsciência  , Consciência Pessoal e Consciência Social da psicologia clássica, se Freud não caluniasse a Subconsciência e à Consciência Social. Mas apesar das cores ferozes com que os psicanalistas pintam a Subconsciência ("o Isso é repelido, activo, bestial, infantil, ilógico e sexual", Jones "Psychanalise", pag.123) podemos afirmar dela que não é um caso confuso e maligno, que não é cega nem imoral, que entende incluso a linguagem abstracta, e que é domável; e até certo ponto, educável.

Na subconsciência com suas "constelações" (produtor de imagens) "complexos" (constelação carregada de afecto) "sistematizações" (ou seja, deselegante verbo, "co-consciências") etc. os psiquiatras averiguam hoje  as causas e os remédios das neuroses psicógenas. Nesses (uf!) "co-consciências", espécie de personagens-larva, reprimidas ou não, que os novelistas bem conhecem, está a explicação do fenómeno patológico da "dispersão", também mal denominado de "dupla personalidade" ou "desdobramento". Dito de forma breve,  o histérico agravado vive (e não escreve) sua novela com as receptivas personagens auto-latentes, em virtude do "pithiatismo" do carácter do histérico (Babinsky).

Ou seja, a vontade direccional  ou força estrutural escasseia para reduzir a uma unidade suficiente os dois sistemas caracterológicos antagónicos; e assim surgem, por exemplo, mediante a amnésia histérica, a "Félida Uno" e "Félida Dois" do Dr. Azam, o primeiro que estudou o fenómeno... bastante mal. De maneira que longe de ter duas ou uma trindade de pessoas em si, pode dizer-se que o doente tem menos que uma.

Confirmando, acrescenta que a psicologia clássica não desconheceu de todo a Subconsciência, mas a supôs e até a estudou em muitas partes (reminiscência, instinto - "vis aestimativa" - intelecto agente, "espécies", "hábitos" , "operatio per modum naturae", consciência directa ou implícita, parte afectiva das virtudes, etc.) ainda que sem esse nome, nem "per modum unis". Em geral, a  escolástica considerou a Subconsciência apenas na esfera intelectual.

Se o Complexo de Édipo é o "descobrimento" (?) mais horrendo de Freud, a Subconsciência é o mais legítimo. O primeiro é uma invenção, o segundo é uma constatação.

Sem comentários:

TEXTOS ANTERIORES