(continuação da II parte)
11. Sem Religião não há Estados. O Príncipe governa nos corpos ("nemo rex perinde animis imperare potest", Cícero), ninguém se castiga nos Tribunais por pecados de pensamento, cogitationis nemo poenam patitur: Deus tem o império dos espíritos. A obediência do corpo é bem frágil, senão é acompanhada da do espírito. Todo o Cidadão, que não obedece ao seu Rei por obrigação, é mau vassalo pronto a sacudir o jugo à primeira esperança de impunidade. Um dos maiores Reis da nossa Monarquia tocou-se desta verdade, quando dizia num dos seus capitulares: "Não podemos compreender, como homens que desobedecem a Deus, e aos seus Pastores, nos possam ser fiéis ("nulo pacto agnoscere possumus qualiter nobis fideles existere possunt, qui Deo infideles, et suis Sacerdotibus inabedientes apparuerint". Carlos Magno, in select. cappitul. tam 2 Conc. Gall. Tit. I cap. 2). Um povo ímpio é inimigo do trono.
12. Tal é a conexão admirável estabelecida pela Providência, entre a Religião, e a Sociedade (veja-se as Actas da Assembleia do Clero no ano de 1765), de maneira que a felicidade dos Estados depende necessariamente da observância das leis Divinas. O espírito de subordinação, e de obediência que faz os filhos de Deus, faz também vassalos fiéis; e a mesma liberdade de pensar, que gera sistemas irreligiosos, arruína os fundamentos do trono, e da autoridade. Sim, o mesmo espírito que se atreve a perguntar ao Céu, e a pedir-lhe conta dos seus passos, dos seus juízos, e dos seus oráculos, não receará perguntar aos Soberanos da terra, a sujeitar a exame os títulos do seu poder, a discutir os seus direitos, e os princípios da obediência que lhes é devida.
13. Suponhamos, numa cadeira de Paris, um Orador educado na escola do Patriarca dos ímpios do tempo, que assoalha diante de um povo numeroso esta singular doutrina: "Escutai, Senhores, e atendei: Os Soberanos são incapazes de amar, de conhecer, e de recompensar o merecimento, e a virtude. A sua ciência está em ser injusto a favor das leis; a sua arte consiste em oprimir a terra; são bárbaros moles, animais porque os que defendem a pátria, por seu respeito loucamente se degolam, eles são os que devem ser castigados pessoalmente, e não as tropas, que assolam os campos; finalmente aquele homem, que o povo lhe parecer pôr sobre o trono, com mais justo título o gozará, do que aquele, que ocupar pelo direito do nascimento." (todos estes horrores se acham espalhados nas Obras de M. de Voltaire). Se esse Orador achasse ouvintes dóceis, diria eu a vossa Majestade: Ó grande Rei! desconfiai do vosso trono, temei que uma mão temerária iludida por estes sediciosos discursos, vos não arranque a coroa da cabeça; temei mais..... Mas que digo eu? Segurai-vos: a Religião, que vós protegeis, fala outra linguagem aos fossos vassalos. Meus filhos, lhe diz ela, o poder do vosso Príncipe vem de Deus, de quem emana todo o poder. Quem desobedece aos Soberanos, desobedece às ordens do mesmo Deus. Vós lhe deveis obedecer, não só por temor, mas ainda por consciência (Rom. 13. v. 1.2.5). Dais a César, o que é de César, e a Deus o que é de Deus (Mat. c. 22. v. 12) . Sede sujeitos ao Rei, que domina sobre todos, e aos seus Ministros, como enviados por ele para proteger o bem, castigar o mal, porque esta é a ordem da Providência (Patr. C. 2 v. 14). Estas são, ó Rei, as lições, com que a Religião estabelece o vosso trono na mesma consciência dos vossos vassalos!
14. Debalde se estabeleceram sistemas de Política, se a Religião lhe não firma a base. Ela é a alma dos Impérios; sem ela são edificados no ar, que o vento das paixões abala de contínuo, e destrói (omnia Religione inoventur. Cícero 5 in Verr.).
15. Não pode um Estado subsistir sem obediência às leis: ora só a Religião a pode persuadir aos Cidadãos. Os Filósofos podem propor belas leis aos povos "mas diz um antigo Padre, estes preceitos não têm força, porque são humanos, e lhes falta uma autoridade superior, que é a de Deus. Ninguém o crê, porque aquele que escuta, julga-se tanto como o que governa." É próprio da Divindade das força às leis humanas, mandando aos Cidadãos obedecer aos Soberanos.
16. A superstição mesmo é menos prejudicial ao Estado, que a Irreligião. Seja a prova M. de Voltaire. A verdade muitas vezes escapa a estes Espíritos Fortes. Quando os homens, diz ele (Tratado da Tolerância), não têm noções sólidas da Divindade, as ideias falsas as suprem, como nos desditosos tempos, em que se trafica com a falsa moeda, quando não há a boa. O Pagão teme cometer um crime, para não ser castigado pelos falsos deuses: o Malabar teme ser castigado pelo seu Pagode. Em toda a parte, onde houver uma sociedade estabelecida, lhe é necessária uma Religião. As leis vigiam sobre os crimes públicos, e a Religião sobre os crimes ocultos.
17. A Religião é o freio mais poderoso para fixar a desinquietação do povo, e mantê-lo numa justa subordinação ao seu Soberano. A Irreligião pelo contrário persuade a revolução, fazendo passar os Príncipes por Tiranos. Verdade reconhecida pelos maiores Políticos da antiguidade. A ignorância do verdadeiro Deus, diz um deles, é a peste mais perigosa de todas as Repúblicas. Quem refuta a Religião, arranca os fundamentos da Sociedade humana. Todo o homem ímpio deve pois ser olhado, como inimigo do Estado.
18. Dizer que a Religião não é um motivo capaz de reprimir, porque nem sempre reprime, é o mesmo que dizer que as leis civís não são (Montesquieu) próprias para conter os homens. O remédio não deixa de ser eficaz, porque nem sempre cura. O efeito pode faltar por outra razão, sem ser pela fraqueza da causa.
(a continuar)
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