09/03/15

CARAMUEL DESILUDIDO - Prólogo (I)

Em defesa da honra de Portugal:

JUAN CARAMUEL
LOBKOWITZ

Religioso de La Orden de Cister Abbad de Melrosa, etc.

CONVENCIDO en su libro intitulado, Philippiis prudens Caroli V Imper. filius, Lusitaniae, etc. Legitimum Rex demonstratum. Impresso en el año de 1639.

Y
En su respuesta al manifiesto del Reyno de Portugal, Impressa en este año 1642

DEDICADO

A Don Anton. d'Almada embaixador extraordinário del sereníssimo Principe DON JUAN Rei de Portugal, al serenissimo Principe CARLOS Rey de la Gran Bretaña.

POR

El Dotor ANTÓNIO DE SOUSA DE MACEDO, del supremo Senado de Justicia de su Magestad de Portugal; y su Residente por la Embaxada ordinaria junto a la persona de su Magestad de la Gran Bretaña.



EN LONDRES
Impresso, por Ric. Herne, An. Dom. 1642





A
Dom Antão D'Almada,

Embaixador extraordinário DelRei nosso Senhor em Inglaterra.

A Liberdade, que a pátria deve a V. Excel. na restituição de seu legítimo Rei, fica mais gloriosa justificada pela boca de seus inimigos; o mais pertinaz foi até agora João Caramuel; mas, já convencido da verdade, vem confessar seu erro diante de V. Excel.ª; para que pois V. Excel.ª que deu tão feliz princípio, e tão memorável execução àquela empresa, lhe ponha também este último esmolete, e lhe chamemos obra a toda a sua. Ele se convenceu a si mesmo, como com evidência mostra o papel presente; a mim se deve só a vontade com que desejo fazer avantajados serviços a S. Majestade dedicar maiores trabalhos a v. Excel.ª a qual espero empregar em outras ocasiões, pois nesta me faltou matéria, para satisfazer a minha obrigação. Em Londres, etc.

António de Sousa
de Macedo.


Prólogo

Num livro que chegou ás minhas mãos, intitulado "Respuesta al manifiesto del Reyno de Portugal; por D. Juam Caramuel Lobkowitz, etc.", é visto que seu Autor se queixa em geral dos Portugueses, e em particular de mim, porque não respondíamos a outro livro que tinha impressso no ano de 1639, ao qual chamou "Philippus prudens Lusitaniae, etc., Legitimus Rex demonstratus." Parece-me que esta fama ganha do Maquiavélico aconteceu pelos muitos que escreveram contra ele. Contudo, por não parecer soberba o desprezá-lo, e porque procuro sempre atalhar as queixas que de mim possa haver, me dispus neste breve tratado a responder a ambos, os referidos de Caramuel (que contem tudo a mesma coisa), e porque neles há pontos cuja censura no tinha lugar nos discursos seguintes, e quero dizer tudo o que reparo para dar inteira satisfação à sua queixa, os haverei de referir então aqui.

Não me detenho em censurar a maneira como repartiu o seu Philippe, uma vez por títulos, outra por questões; ou por §§; seja por disputas, intercalando artigos, separando objecções, fazendo notas, dividindo conclusões; e finalmente recompilando naquele livro todas as maneiras de escrever tudo o que se achar no mundo, o que se torna um labirinto tão intrincado que não há fio que possa servir de guia.

Na divisão no fútil Livro I, tanto num e noutro tratado, que passa em notícias gerais os Reis Portugueses, não necessárias para o intento.

Deixo o extraordinário de referir sempre os Fernandos por, Ferrandos, que, se em Latim pode passar, mas no romance é uma impertinência.

Pecados veniais são aqueles e outros, que à vista dos mortais quase não parecem; vejamos estes.

Inadvertência escusada foi ter escrito o seu Philippe para justificar a ocupação da Coroa que o Rei Católico possuía há sessenta anos; quando tinha sido bem mais útil um livro escrito com advertências para o bem governar. E forma-se a culpa da ocasião que o moveu a escrever, querendo persuadir de que o seu Rei tinha direito contra aqueles que temia que murmurassem: que, confiada a Justiça, estes temores não podem ser imaginados senão pelo desespero de tiranos, e usurpadores, que têm sempre diante dos olhos o inoportuno objecto do seu crime, e temem tudo aquilo que merecem (como elegantemente notou o senhor Lesfargues no livro I da Vida Del Grande Alexandro). E deste modo fez tirano e usurpador ao seu Rei; o qual nem devia pensar.

Nesta resposta (pág. 17) comentando o manifesto de Portugal, argui que nosso sereníssimo Rei retirou o tribunal da Santa Inquisição dos seus reinos (se é assim, ou não, não o direi agora); vá Portugal prégar as opiniões que ele escreveu nos seus livros a respeito da Religião, e logo verá se ela existe, ou não. Só advirto que nisto segue a má razão de estado dos ministros Castelhanos que, desesperados de outro caminho, solicitam o ódio dos Católicos contra Portugal, publicando por várias partes, e particularmente na Alemanha entre ignorantes que deixámos a santa Fé da Igreja Romana; néscio que (sem que seus falseadores possam pôr uma pequena mácula no esplendor da religião Portuguesa) acrescentam a ocasião que teve Bocalino en la pietra del parangone (Cap. 4) para dizer da Monarquia Espanhola: "Avanza ogni altra reyna, etc presente, etc. passata nel saper con il manto di doppio brancato ricoprir ogni suo ancorche diabolico interesse.", e no capítulo 3 "Gli uomini tutti vennero in chiara cognitione gli Spagnuoli essere stati primi auttori di quell incendio Francese, che con speciocissimi pretesti di religione, etc. di caritá al mondo tutto s'eran Sforzati dare ad intendere e di voler ismorzare.". E aumentam os motivos com que H. de Rohan, no livro de l'interest des Princes, et Estats discurso 1, referindo as traças de que usa o interesse de Espanha, escreve "La primiere est foundee sur la religion, comme celle qui par consdience fait entreprendre toutes choses aux peuples, il faut tesmoigner um grand zele á la Catholique, a fin de servir d'elle en ses deffeins". E justificam as causas com que o Autor de Catalonia interum ad Lilia perfugiens, § o beatior Fernande, exclama que os Castelhanos por próprio interesse de estado atropelam divino, e humano, simulato religionis conservandae, aut propagandae pretextu; fovendo tamen haerosticos in Francia, utendo Anglis in schismatis ipsius exordio ad Galliae imperium Christianissimum destruendum, et permittendo ut interiu Lutherani in Germania publice praedicarent; unde te, sucessores que tuos Catholici Regis nomen, non propter Religionem, sed ad regni uneversalis ambitionem assumpsisse multi suspicantur. Dixit quae apposite historiae scriptor aliquis instructissimus, regna quaedam ultimo saeculo haeresibus fuisse infecta, sed Hispaniam esse pessima imperii corrumptam ratione, ejusque salutem multo difficilior em videri". Oh, já não néscios, senão maliciosos ministros, que tão infamemente dais ocasião a que maus afectos se atrevam à Cristandade incorruptível de toda a Espanha! Ladrem os apaixonados e estrangeiros quanto queiram, que o Católico zelo dos Reis Castelhanos é Olimpo superior a tais tempestades; e só fica denegrido quem dá causa a calúnias semelhantes.

Miseravelmente erra nas histórias portugueses mais notáveis. No seu Philippe em um dos proémios que ele intitulou "Occasio scribendi: versic. Ioannes tertius", diz: Ioannes 3. Lusitanicas quinas (sic ipsi nominant) septem Castellis circum cinxit, Sacramenta Ecclesiae Catholicae singnificantibus. Sendo coisa tão sabida que o Rei D. Afonso III colocou os Castelos trezentos anos antes pelo Reino do Algarve; e assim o mesmo Caramuel olvidado de si, nas esfigies que ali traz dos Reis Portugueses, pinta o próprio Rei D. Afonso, e depois à Rainha Santa Isabel; e ao Rei D. João II com os Castelos, nos escudos das suas armas.

No mesmo Philippe (livro 1), título "Fernandus I", escreve: "Infans Joanes magistre Avi sensium caliditate Reginae Leonorae persuasus uxorem suam esse adulteram leviter credidit, inque Comimbricendi vitate violenta manus interemit"; Sendo que o Infante que matou a sua mulher não foi o Mestre de Avis, senão seu irmão que também se chamava João filho do Rei D. Pedro, e de D. Inês de Castro; como disse o mesmo Caramuel encontrando-se (livro 3, disp. um q. 2 art. i n12) ibi: "ex pulcherrima Agnete succepit Alfonsum qui puer obiit; Ioannem de Portugal qui duxit D. Mariam Tellez, Reginae Leonorae sororem, hujus Regionae consilio Ioannes occidit Mariam." E repete-o (livro 3 disp. um q. 3 n.19) na segunda impressão e emendara esta contrariedade.

No mesmo livro I (título Joannes I: versic, fuerat) diz do Rei D. João I que, erat Diaconus, escutou que o Sumo Pontífice o tinha dispensado para casar (pelo voto que tinha, como os outros Cavaleiros de ordens militares naquele tempo, por ser Mestre de Avis; ) e pensa que é porque tinha ordens de Evangelho.

No mesmo tratado, no livro V, in procem (§ 1 n 3), diz: habuit etiam Emanuel Infantem Henricum Cistersiensem monarchum S. R. E. Cardinalem, etc.. E outra vez no § 2 in rincip. começa assim: Superstite Monacho Rege; nempe Henrico. O pobre religioso escutou que o Rei D. Henrique tinha sido Abade de Alcobaça, no mosteiro de Cister, e pensou que aquela Abadia era como a sua, de Melrosa; e segundo isso dirá também que era Monge Cisterciense o Cardeal Infante D. Fernando porque foi também Abade de Alcobaça.

Mas como pode saber o que passou em Portugal noutro tempo quem ignora o que hoje passa? Na resposta ao manifesto no começo, al que Leyere, por fingir que muita nobreza de Portugal sustentou nesta ocasião as partes do Rei de Castela, em companhia de poucos nomes que foram infiéis à sua pátria (que é impossível faltar alguns em caso semelhante) calúnia outra sem-razão, e nomeia muitos de qualidade muito diferente confundindo tudo com ignorância notável.

(continuação, II parte)

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