03/01/15

HARMONIA POLÍTICA DOS DOCUMENTOS DIVINOS (I)

Já há tempos que estou para publicar quanto possa da  obra intitulada "Armonia Politica Dos documentos Divinos com as conveniencias d'Estado. Exemplar de Principas No Governo dos gloriosissimos Reys de Portugal. A Serenissimo Principe Dom Theodosio nosso Senhor.", de 1551, da autoria de António de Sousa de Macedo, também autor da "Flores de Hespanha". Esta obra pode talvez corrigir más interpretações hoje feitas, e não têm faltado defensores monárquicos, dizendo-se "tradicionalistas", que erram muito na sua causa pôr colocá-la mais alto que a doutrina e filosofia católicas tradicionais.

Em tempo de revoluções liberais, os católicos que se negaram a abandonar parte da doutrina ou pensamento católicos, ou se negaram a deturpá-los, foram chamados "tradicionalistas" por distinção aos liberais, fenómeno que se veio também a repetir posteriormente algumas vezes, e até aos nossos dias. Tal como no séc. XIX houve gradual divisão no seio da sociedade católica (e daí o liberalismo ter avançado), agora não haveria motivo algum para julgar que, na intenção de hoje se ser "tradicionalista" (como aqueles nossos antepassados que na hora da luta se juntaram ao Senhor D. Miguel I) não houvesse também divisão à custa dos mesmos erros.

O conhecimento do pensamento católico e doutrina católica, milenares (não confundir com a salada "pós-conciliar"), dão o entendimento daquilo que os nossos ilustres antigos entenderam, alcançaram, produziram. Claro, o conhecimento teórico será pouco, o conhecimento justo virá com a prática dos mesmos preceitos e virtudes, o tomar verdadeiramente a doutrina, os escritos dos santos, os sacramentos, .... a Fé esclarecida...!

Vamos à obra:

PARTE I
DA JUSTIÇA PARA COM DEUS

Parágrafo I
Religião

Para com Deus pede a justiça no Príncipe Religião; dando-lhe a Política Divina no Deuteronómio este documento :

"Depois que o Rei se assenta no trono de seu Reino, trasladará para si a lei santa num volume, e a terá consigo, e lerá cada dia, para que aprenda a temer ao Senhor seu Deus, e guardar suas palavras, e cerimónias que são mandadas na lei." (Deuter. 17 n. 18 & amp; 19)

1. A Religião [lembrar que a Santa Igreja ensina que uma coisa é a Religião, e outra são as falsas religiões, não havendo outra Religião propriamente dita que o Catolicismo, e que não há outro verdadeiro Cristianismo fora da Santa Igreja. Também se costumam chamar "religiões" às ordens religiosas da Santa Igreja], a que o direito das gentes obriga todos os homens, é divida maior dos Reis, não só porque devendo eles preceder aos mais nas virtudes, é justo que precedam principalmente nesta cabeça de todas; mas também, porque, havendo saído de Deus, por quem reinam, é curso natural, que, para continuarem, tornarem a sua origem, como os rios ao mar; sendo substitutos de Deus, devem reinar só para ele, por não serem rebeldes: recebendo de Deus a jurisdição têm dele particular dependência conforme a direito: e exaltando-os Deus, foram obrigados a humilhar-se-lhe mais, sob pena de ingratidão. 

2. Esta virtude abraçada só em particular, é excelente prémio de si mesma. Para os que o buscam, temporal, o principal consiste em que Deus favorece mais os que o veneram muito, e assim dá fins gloriosos a suas acções; mas para, tratar dos frutos da Religião por consequências humanas, segundo meu assunto, é necessário que a do Príncipe seja conhecida em público. Vejamos por qual meio.

MEIO PARA O PRÍNCIPE
Ser Conhecido por Religioso.

3. A Política divina adverte por Job que "a esperança do hipócrita perecerá"; ninguém pode muito tempo trazer máscara; o fingido torna ao natural: a atenção não se conserva, uma acção simples destruirá a máquina do fingimento. A hipocrisia é uma mentira que cedo ou tarde fala verdade contra si; uma luz falsa que, depois de haver enganado nossos olhos, mostra caindo, que avaliávamos por estrela, o que era vapor; e assim não funda estável quem libra o crédito no aparente.

4. A verdadeira Religião, ensina o Eclesiástico, é a que justifica, pois as minas de ouro, e as veias da água lançam das entranhas da terra sinais pelos quais são conhecidas;é impossível que a luz da Religião, não lance da alma resplendores que a manifestem; e mais sendo próprio da grande fortuna do Príncipe não ter qualidade escondida, é logo o meio certo para se mostrar Religioso, ser o que deseja parecer; e meio mais suave; porque mais fácil é ser bom, que parecê-lo, pois o ser depende da verdade, o parecer, do engano, que é mais penoso; melhor se cuida da obrigação própria, que da opinião alheia, pois aquela está na mão de cada um: esta no arbítrio de outrem.

5. Assim o fizeram os Sereníssimos Reis de Portugal; alheios de hipocrisia, foram no interior, o que no exterior deviam parecer; por santos qualificou Deus com milagres a D. Afonso Henriques, D. Sancho I, e D. João II; por virtuosos com insignes sucessos aos outros Reis; e para conservarem a Religião pura ["pureza da fé"], estabeleceram em seus Estados o Tribunal santo da Inquisição, sem respeitarem as utilidades aparentes que ele lhes desvia.

(continuação, II parte)

2 comentários:

Rafaela P.S. disse...

O texto unido ao seu comentário complementaram-se. Ótimo!

anónimo disse...

Obrigado por comentar.

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