18/01/15

CONTRA-MINA Nº 12: Liberalismo Contra a Restauração de Luís XVIII ... (I)

CONTRA-MINA
Periódico Moral, e Político,

por

Fr. Fortunato de S. Boaventura,
Monge de Alcobaça.

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Nº 12
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O medonho Fantasma se esvaece,
O dia torna, e a sombra se dissipa;
Os Insectos feíssimos de chofre
Entram no poço do afumado Inferno:
Eternamente a tampa se aferrolha.
No meio do clarão vejo no Trono,
Cercado de esplendor, MIGUEL PRIMEIRO.
(Macedo, Viagem Estática ao Templo da Sabedoria, pág. 141)
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Esforços da Impiedade, ou Liberalismo Para Anular os Efeitos da Milagrosa Restauração de Luís XVIII

"Luís XVIII, restituído por 700 mil homens armados ao Trono de seus Maiores, só deveria Reinar como tinham Reinado os seus antepassados, e nunca deveria ter sacrificado ao gosto inglês das suas Câmaras o interesse da sua Família, e a prosperidade da nação ["Reino"] da França. Quando ele sancionou com a sua aprovação a Liberdade de Imprensa, descarregou o primeiro golpe de machado sobre o tronco da Legitimidade, e apressou, quanto nele era, a sua própria desentronização, e a dos seus mais próximos Sucessores. Se toda a Europa em armas ditou leis à França, e humilhou as Águias do Império Francês, não menos temerosas, e formidáveis para as nações, de que tinham sido as Romanas, é certíssimo, que poderia levar ao fim a obra mui felizmente começada, se por acaso não prevalecesse em certo Gabinete a influência das doutrinas Liberais, e o desejo, a meu ver insensato, de se cumprir a ideia primordial do Ministro Pitt; como se fôra possível, que todas as nações da Europa se amoldassem à Constituição Inglesa!

Fosse porém muito embora, ou político, ou necessário, que não se exasperassem os ânimos de uma povoação de trinta milhões de habitantes, e que uma Família até esse tempo errante, e vagabunda, e talvez sem outra esperança, que não fosse a de imediatos auxílios do Céu, houvesse de ceder uma boa porção de suas essenciais prerogativas, para melhor, e mais facilmente se assegurar a paz do mundo; porém logo que raiaram os cem dias, e que o Trono de S. Luís tornou a ficar vago, quase sem o menor indício de resistência desses milhões de habitantes, que até ai juravam morrer em defesa do Rei Legítimo, parece que esta nova, e cada vez mais persuasiva lição da adversidade deveria abrir os olhos de Luís XVIII, e das Potências da Europa, outra vez influentes na própria Capital, e destinos da França. Para que deixar tão cheio de vida, e forças um corpo, que nem cede, nem cederá nunca senão a outras maiores? Deviam contar, que a França acharia em si própria mui fáceis remédios, não só para estancar o sangue, que lhe tiravam, mas também para adquirir, em menos anos do que foram os da sua ocupação pelos Exércitos inimigos, muito maior cópia de santue, do que fôra o perdido. Esta tão boa ocasião, já não digo de se coarctar, ou reprimir, mas de se cortar pela raiz a Liberdade de imprensa! Sofram os meus leitores, que eu me explique nesta grande questão, mais como religioso do que como político. Não entendo que seja possível, que um Rei Cristianíssimo, ficando tal, como efectivamente soa este glorioso título, possa admitir a Liberdade de Imprensa, que de necessidade traz consigo as horrorosas consequências, de que abaixo tratarei... Não me armo com isto em Juiz, ou Árbitro dos Soberanos: expresso, sem os ofender, o que sinto em minha consciência, e já agora assim espero acabar os meus dias.

E que direi da suma indulgência de Luís XVIII para com os rebeldes?Concede-lhes uma inteira amnistia.... (nunca se gastou melhor cera com defuntos mais ruins!) e pela sua vontade quisera perdoar mais outra vez aos que tinham condenado à pena última o desgraçado Luís XVI!.... Foram as Câmaras, e não ele quem exceptuou os Regicidas!! Ah! dispensem-me os leitores certa ordem, que eu me proponha seguir em minhas ideias, pois aqui não é fácil, que eu resista a um súbito, e fortíssimo desejo de lhes interromper o fio.... Um Decreto de amnistia geral concedida no séc. XIX, e concedida a Liberais, ou Pedreiros, faz um sentido equivalente a estas clausulas.... Vendo que não fostes bem sucedidos na vossa empresa, e lastimando a vossa desgraça, eu vos concedo agora o tempo necessário, para que restaureis as vossas perdas, torneis a concentrar as vossas perdas, torneis a concentrar as vossas forças, e vos prepareis ocultamente para algum dia cairedes de chofre em cima dos defensores do Altar, e do Trono, nem podem fazer senão à voz do Soberano. Não obstante a prova antecedente, e claríssima de que todas as amnistias, que até hoje vos foram concedidas, somente vos fizeram cada vez mais atrevidos, e pertinazes em o vosso sistema, hei-de esquecer-me de todo o mal, que tendes feito, porque desta vez chorareis de arrependimentos, e nunca mais tornareis a fazer outra... Basta, basta, que já foi corte demasiado (já, digo, nas minhas ideias, que nos Pedreiros tudo é pouco.)

A estas beneficentíssimas providências de Luís XVIII seguiu-se aquele dizer "o amalgamento dos partidos" Ficarão à testa das Repartições, ou tendo nelas uma parte não secundária, mas principal, as mesmas figuras, que tinham representado os mais hediondos papeis nos diversos Governos da França; e com estes elementos assim disparatados, e heterogeneos é que se pretendeu consolidar o Trono de S. Luís! Os Liceus, e Colégios, em que não basta renovar o toque dos sinos, ou campainhas, e desterrar os tambores, que isso é o menos, ficarão quase sem a mais leve diferença do que antes eram. Trabalhou-se incessantemente por desviar as Corporações Religiosas do ensino da mocidade, desfechando a tormenta sobre os Padres das Escolas Pias, e ainda com mais força sobre os Jesuítas...... Ao ver estes em França trepidou o já triunfante Liberalismo, e arrancando um gemido ab imo pectore, chamou às armas toda a Confraria, à qual pertenceu o segredo, que o trazia perplexo, confuso, e atormentado, como se lhe dissera.... "Se os Jesuítas vão educar a mocidade Francesa temos Cristãos inumeráveis em França, consguintemente adversários nossos também inumeráveis... É necessário acudir-lhes a tempo, se não, choraremos sem remédio a queda total do sistema."

É um Rei, que os chamara, que os protegia, e que neles considerava um dos esteios principais do seu Trono, viu-se obrigado a expulsá-los da França! Respirou por certo o Liberalismo com esta desejada expulsão, e como senhor, que era de todas as molas, que sustentam, e dirigem a máquina do Estado, e principalmente de todos os corações da estudiosa mocidade, fez todos os dias novos prosélitos, e achou-se em 1830 com uma força respeitável à sua disposição, e pronta a investir à primeira voz, e derrubar o Trono de S. Luís. Em vão o famoso Abade La Mennais, a quem os Pedreiros Franceses chamam "Santo Padre dos Molinistas e Ultramontanos", avisou a França inteira do preciício, em que fatalmente se despenhava; em vão alguns Prelados Franceses, com o Cardeal de Clermont à sua frente, expuseram humildemente ao Rei Cristianísssimo, em 1828, os seus bem fundados temores; nem aquele, nem estes defensores da boa Causa foram atendidos; pois o Liberalismo em tais circunstâncias sabe o como, e quando há de impingir a nota de rebeldes, e atentadores contra as Liberdades Galicanas aos Sacerdotes, e Bispos, que mais acatamento, e submissão professarem à Sagrada Pessoa do seu Monarca.

Lamennais
Assim mesmo desatendidos não esmoreceram, antes faziam sem diferença do passado, o que neles era, para manterem o Trono de S. Luís; porém tudo era baldado, e só lembraria o remédio heroico, e decisivo, quando havia de trazer a morte... Pareceu coisa estranha, e mui desusada, que uma Nação aparecesse quase toda Liberal.... que surdissem como debaixo da terra milhares de esquadrões armados, que soubessem enrostar as mais bem disciplinadas tropas; mas quem olhar imparcialmente para a ocasião, que tiveram os Liberais Franceses de minarem o edifício, de trabalharem a coberto de inquietações, e surpresas, no espaço de quinze anos, em que mais de uma vez aprenderam nas concessões, que se lhes faziam, quando era o medo, que eles inspiravam, e quão pouco disputada seria a victoria, quando encetassem a peleja, só terá de admirar, que esta segunda revolução se demorasse até 1830. Ora neste empenho, que era sabido em França, que nem se atalhava, nem já se podia atalhar, foi o Liberalismo poderosamente auxiliado pela sua íntima, e poderosíssima Aliada a "Liberdade de Imprensa" e aqui mesmo vou dar uma noção breve de seus serviços à Revolução de 1830.

(continuação, II parte)

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