04/11/13

"DEFEZA DE PORTUGAL" (1831) - Que Revolução Queriam Em Portugal (III b)

(continuação da parte a)

Luís XVII, de França
Todos sabem, ou dizem que sabem o que queriam os revolucionários, ou pedreiros de Portugal no ano de 1817. Mas eu não sei; o que sei é que os justiçados o foram justamente por tramarem contra o Trono, e contra o Estado. Mas como queriam eles dispor o Trono, e de Portugal? A quem queriam eles cometer, e cometiam à sobra da soberania? Não sei; perguntei, indaguei, e li o que se imprimiu, e o que se deixou de imprimir a este respeito; e só deu grande luz a estas minhas ideias aquela célebre resposta do Marechal Beresford ao Secretário do Governo de Portugal de que não respondia pela tranquilidade do Exército para prender mações, porque entre eles se achavam os mais distintos oficiais, que haviam combatido com a maior coragem pela salvação de Portugal na Guerra Peninsular. Nestas palavras pouco mais, ou menos foi concebida aquela resposta, que se imprimiu num desses folhetos do dia, que eu leio quando não tenho de que me entreter, e depois de lidos lhes dou o destino, que no meu conceito se merecem a maior parte desses opúsculos, em que a verdade aparece sufocada pelas paixões, e pelo rebuço. Todavia incerto me deixa esta resposta de se o Marechal fez aquela imputação à oficialidade do Exército português para salvar uns poucos de conscriptos nas lojas maçónicas inglesas, ou se na verdade eram muitos os oficiais maçons. Se atendo ao que o Exército praticou no ano de 1820, esta segunda explicação parece mais certa; se olho ao movimento de conversão, que fez no ano de 1823, e a todos os que pratica debaixo do comando do Augusto Soberano, que felizmente rege, a primeira interpretação é mais suave. Para entender porém que era o que pretendiam os pedreiros em Portugal no ano de 1817, poderá servir a explicação, que os mesmos pedreiros deram a esse movimento subversivo, tumultuoso, revolucionário, e desorganizado de 1820, se eles seguiram o mesmo plano de 1817. Ao menos uma grande parte deles aplaudiu por mártires da pátria os justiçados conspiradores do ano de 1817, e assim mesmo foram apregoados desde um púlpito por um orador que devera ser cristão; mas a cadeira do Evangelho tem disto muitas vezes ocupada por pedreiros, e assim é como a impiedade tem sido santificada na presença dos fiéis, que de antes não estavam acostumados a ouvir senão - adoração a Deus - obediência ao Rei - submissão às autoridade, que administram em nome do Rei. Mas os meus leitores não gostarão de tantas digressões: querem ver tudo de um só golpe de vista, não sendo possível na verdade abranger todas as maliciosas manobras do maçonismo, sem que sejam seguidas de perto gradualmente, vendo-as na sua complicada, e embrulhada ramificação: porém eu lhes faço a vontade, e passo em silêncio, ou como gato por brasa na notícia, que acaba de dar-me um jornaleiro da minha aldeia, de que a Inglaterra, e a França fizeram entre si aliança ofensiva, e defensiva contra a Rússia. Homem, lhe disse eu, quem lhe deu essa notícias? Foi, me respondeu ele, um caixeiro do Porto, vendendo-me um pouco de linha, que eu lhe comprei para a minha Maria fiar. Então lhe repliquei eu: "pois fie a sua Maria, e trabalhe vossa mercê com a sua enxada, e não lhe lembre a Inglaterra, nem a França, nem a Rússia, que esses homens de lá não se lembram dos de cá senão para tirar-lhes o dinheiro, ou trocar o seu linho, as suas chitas, e os seus panos pelos vinténs, que ganha a sua Maria fiando, e vossa mercê trabalhando: a Inglaterra, e a França tão depressa se fazem amigas, como inimigas: logo que a Inglaterra lhe não fizer contra essa amizade, troca-a imediatamente por pólvora, e bala. Mas vejam os meus leitores a mania dos caixeiros do Porto em procurar saber essas notícias, e em passá-las para os campos, tendo por este meio em inquietação a lavoura, e os lavradores. Na aplicação de cada um às suas ocupações, e aos mestres da sua vida, deixando os negócios políticos ao cuidado do Governo, consiste uma parte da Defeza de Portugal. Basta.

Pois os pedreiros de Portugal no ano de 1820, que esta era a matéria que eu tinha entre mãos, disseram no seu alarmante, e encantador grito de 24 de Agosto dado no Campo de Sto. Ovídio no Porto, e repetido sucessivamente por todo o Portugal, que pretendiam que o Senhor Rei D. João VI regressassem do Brasil, e se fixasse em Lisboa, Metrópole de todos os domínios portugueses, e que aí jurasse guardar, e que agradasse aos povos a suas regalias, foros, e privilégios, para ele também ser jurado, e reconhecido Rei de Portugal; e por quando ainda o não havia feito, para remediar tão grandes mada maioria do povo português, ou a amizade é uma quimera.

Como quer que isso seja, os pedreiros de Portugal no ano de 1820, e 1821, fizeram o que quiseram, ou o que puderam: insultaram o Rei, zombaram da nação, e dispuseram dos seus cabedais, como se fossem só deles. Disseram então que haviam mandado um milhão de cruzados aos pedreiros da França para sublevarem os povos daquele reino contra Luís XVIII. - Este boato não careceu de fundamento, porque lá se veio o General Briton insurgir-se contra o Governo de Luís XVIII; e na verdade não sei com que pretexto, porque tolerância civil, e religiosa, e constituição lá havia, e bem liberal; devia ser para acabar com Luís XVIII, assim como acabaram com Luís XVI, e agora com Carlos X. O certo é que em França começou o extermínio dos Bourbons; e na Itália, Espanha, e Portugal devia consumar-se esta inaudíta, cruel, e horrorosa empresa do maçonismo. Mas eu não lancei mão da pena senão para a Defeza de Portugal, e esta consiste na firmíssima adesão aos Bourbons [questionável], sem intrometer-se, no que vai nos outros países, onde as causas vão, e vêm, e andam em perpétuo movimento, em quanto Deus não dá descanso e paz ao mundo.

Devo pois dizer o como os pedreiros de Portugal desempenharam a sua palavra de convocar Côrtes; mas eles não guardam palavra; e assim mostrarei que eles não queriam Rei, nem Côrtes, que é uma premissa para dela tirar a consequência de que não é possível saber-se o que os pedreiros pretendem; não pelas suas palavras, porque as não guardam, não pelas suas obras, porque se desmentem: repito, sempre estúpidos, sempres velhacos, eles carecem de pau para serem ensinados, e para serem corrigidos. Eu entrego o pau aos povos para defenderem a Portugal de pedreiros, e aparo a pena para a defesa dos povos, instruindo-os, e convencendo-osde que os pedreiros só tratam de se enriquecer à custa dos mesmo povos, o que hei-de demonstrar no número seguinte.

Rebordosa 21 de Agosto de 1831.

Alvito Buela Pereira de Miranda.

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