12/02/13

O NOSSO REI REQUIÁRIO (II)

REQUIÁRIO DE BRAGA
O PRIMEIRO REI CATÓLICO DO ORBE LATINO

Pelo Dr. Sérgio da Silva Pinto

(continuação da I parte)


2. Vida Externa e Interna do Reino dos Suevos

Depois dum biénio de assolações (409-411), descrito combriamente por Idácio, os Bárbaros repartiram, entre si, as províncias para nelas viverem em paz: os Suevos e os Vândalos Asdingos ocuparam a Galécia; os Alanos, a Lusitânia, talhada pelos Romanos a sul do Douro, e a Cartaginense; e os Vândalos Silingos, a Bética, actual Andaluzia (9).

Na Galécia, região nortenha da Lusitânia primitiva, pré-romana, pré-romana (10), os Suevos estabeleceram-se na parte ocidental e marítima, acantonados sobretudo no Convento bracarense; e os Vândalos Asdingos, na parte leste ou central, dependente de Lugo e Astorga (11).

Em 416-418, os Visigodos, aliados dos Romanos, vêm à Península combater, em nome do Império, os outros Bárbaros. Aniquilam os Silingos e os Alanos. Por seu lado, os Asdingos da Galécia passam à Bética, (419) e pouco depois, capitaneados por Geiserico, o Apóstata, saem para o Norte de África (12). Ficam os Suevos sós em campo, fortalecidos, decerto, pelos restos de Alanos e outros grupos.

O primeiro Rei do Estado suévico da Galécia, Hermerico, governa cerca de 30 anos (13), absorvido em lutas e negociações políticas, para a posse de todo o Ocidente - a Lusitânia, não a diminuída pelos Romanos com a desembração dos territórios galáicos, mas a espontânea sobre toda a orla atlântica. Desiderato alcançado por seu filho Réquila.

É no tempo de Hermerico que o historiador Idácio, Bispo de Chaves e romófilo intransigente (14), passa às Gálias para suplicar aos Romanos que socorram a Hispânia contra os Suevos (15). Entretanto o Rei suevo, "mediante intervenção episcopal", como informa Idácio, (16) concerta a paz com os Galaicos. O Bispo que estava, então, em melhores condições para essa intervenção era Balcónio de Braga,  - o único que mantinha relações directas com os Suevos. Os bispos da Galécia Central (Lugo, Astorga, Chaves) seguiam política pró-romana e anti-suévica; e as dioceses do Porto, Orense e Tui ainda não existiam. Por isso se deve concluir, como algures notámos, que Balcónio foi, nessa altura, o príncipal negociador da paz (17).

Pouco depois, Hermerico enviou aos Romanos o Bispo Sinfósio, que fracassou na sua embaixada (18). Ninguém sabe donde ele era. Reinhart chama-lhe erradamente Bispo de Braga (19). É possível, porém, que estivesse em Braga, deslocado da sua Sé, ou mandado pelos Romanos. Uma coisa é certa: nem ele, nem Idácio, entraram no ajuste de paz entre Suevos e Galaicos. Idácio não podia ser pessoa grata ao Rei suevo, e não se conta a si próprio na referida intervenção episcopal; não fala também em Sinfósio, quando duas linhas adiante o menciona a propósito da sua incumbência junto da Corte dos Romanos. Reforça-se, assim, como é óbvio, a atribuição das negociações a Balcónio.

A Monarquia sueva não era electiva, como brilhantemente o demonstrou Francisco José Velozo,um dos mais seguros historiadores contemporâneos da Alta Idade Média pré-portuguesa (20). "Estava longe de ser um estado bárbaro e caótico, mesmo nos momentos de crise" (21). E, consequentemente, os seus Reis não eram selvagens. Braga, opulentada de monumentos e instituições romanas, tornara-se capital da Nação sueva, como já o provámos (22). Os Reis tinham nela a sua corte, o seu palatium e, o que é mais, o seu thesaurus. Nesta cidade, passados os primeiros anos de violências, os Reis suevos procuram viver em paz com os Galaicos-Romanos: episcopado, aristocracia e povo. "Fazem-se amigos dos Romanos" (leia-se Galaico-Romanos), atesta Orósio. "Trocam a espada pelo arado" e, embora se constituam proprietários de terras, inicialmente na região bracarense, mercê de partilhas ou expropriações impostas aos possessores romanos, estes acham-se agora com maior liberdade do que antes (23).

Em Braga, os Suevos respeitam, quanto podem, a organização romana. Entretanto, pouco a pouco, o Estado suevo integra classes e instituições não suevas. Os nobres das duas raças - magnates suevos e aristocratas romanos, a que está adito o alto clero - cedo se dão as mãos e se entrelaçam na capital do Reino; são, indistintamente, os Principais; e o Rei, o Principal dos Principais, segundo nos elucida Velozo (24).

Os Romanos de Braga tornam-se, assim, os naturais intermediários entre os Suevos e o "Povo" da restante Galécia, ainda não submetida.

Como se vê nada de barbárie ou selvagismo.

Ora, por estas alturas (433 - paz concentrada entre Suevos e Galaicos), o Príncipe Requiário, aclamado Rei em 448, já era de certeza nascido, embora, embora fosse menino. Seu pai é o Princípio Réquila, filho de Hermerico (25).

(continuação, aqui)

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