10/02/13

A RESPEITO DE S. PEDRO DE RATES (III)

Martírio de S. Pedro de Rates
"É certo que S. Tiago Zebedeu veio a Hespanha [entenda-se "Hespanha" como "Península Ibérica", e não "Espanha" reino] pregar as verdades Católicas, e a desterrar dela como a clara luz do Evangelho as densas e obscuras trevas em que toda ela vivia; e também o é de que S. Pedro de Rates foi seu Discípulo e o primeiro Bispo que se fez na mesma Hespanha [entenda-se "Península Ibérica"]. Muitas são as opiniões que seguem os eclesiásticos escritores sobre o nascimento de S. Pedro de Rates. Dizem uns que fora natural da França segundo Roberto Cláudio, Presebitro de Longres, que lhe dá como pátria a Cidade de Limoges que, por outro nome, se lhe chama "Rutiastum" conforme Júlio César, Ptolomeu, e por isso se equivocaram com o apelido de "Rates" e com outro Arcebispo de Braga Francês do mesmo nome (...) o qual é S. Pedro Julião. O Beato Caledónio Arcebispo de Braga, e Juliano Arcipreste de Toledo, tratam-no por cidadão de Braga, e ouros muitos o seguem. Flávio Destro acrescenta, que era um dos Aduanas que se acharam em Jerusalém quando Cristo nosso Senhor padeceu, e que depois de receber o baptismo fora o primeiro Discípulo que tivera S. Tiago Apóstolo; o qual o mandara por seu Percurso para Hespanha [entenda-se "Península Ibérica"].

Segundo outros autores nasceu S. Pedro de Rates na província da Continuação Palestina, onde teve por pai a Urias, aquele profeta que mandou matar opiniões. o Rei Joaquim por lhe pregar coisas de que não gostava, repreendendo-o dos descuidos da morte com que vivia e, sendo assim, foi o nosso santo um daqueles que pelos anos da criação do mundo de quatro mil e setecentos e quarenta e três se desterraram da Babilónia por ordem de Nabuco Donosor, ordenando-o assim a Divina Providência, para que aqueles misérrimos cativos com quem se consolar na desconsolação grande que lhes resultava de se verem privados de seus bens, e desterrados de suas pátrias. Se teve outro nome próprio, e qual ele fosse, não é fácil de averiguar, pois nenhum autor o escreve afirmando muitos que lhe chamavam comummente Malaquias o Velho, ou Samuel o Moço, apelidos que lhe davam por ele se fazer benemérito, assim pela integridade dos seus costumes, e angélico semblante, como pela semelhança que tinha na santidade e no dom da profecia com aqueles santos profetas.

S. Cicilio, discípulo de S. Tiago maior e primeiro Bispo eliberetano, no livro que escreve (se não é apócrifo), a que deu o título "Liber Primus Bonitatum S. Jacobi etc.", refere que S. Tiago Zebedeu, Irmão de S. João Evangelista, saíra de Jerusalém por mandado da Virgem N. Senhora para pregar em Hespanha [entenda-se "Península Ibérica"] poucos dias depois que o Espírito Santo descera sobre o Colégio Apostólico, levando consigo um livro que a mesma Senhora lhe dera escrito na língua arábica e, que quando lho dera, lhe disse: Não pregasse em Hespanha [entenda-se Península Ibérica"], senão depois que ressuscitasse a um defunto que havia de estar enterrado num monte. Diz mais, que S. Tiago se metera com uns discípulos num baixel de que fora de piloto o Arcanjo S. Rafael e que por isso chegara brevemente à nossa Hespanha [entenda-se "Península Ibérica"]e desembarcara num porto não longe de Almeria, donde fora por terra à Cidade de Gaudix (então colónia Romana chamada Acei] e que comendo nela, sem receber dano algum de seus moradores, passara avante e chegasse à Cidade de Ilipula, nome que corresponde ao de Helipoleos referido nas Divinas letras, a qual fica em oito léguas de distância da dita Cidade.

Prossegue a narrativa do sobredito livro dizendo que quando chegara àquela cidade não entrara nela, por lho impedir o grande cansaço que lhe havia ocasionado o caminho, mas que subira ao monte Ilipulitano com o intento de recostar-se e de dar algum refrigério e alívio à sua fadiga; que trazia consigo um cão pastoril que lhe servia de alforge, em que tinha o sobredito livro que a Virgem N. Senhora lhe havia dado, e outras coisas necessárias para a administração dos Sacramentos que assim que o tirara do alforge se abria de repente a terra e saíra pela abertura dela um homem estendendo os braços, esfregando os olhos, e fazendo as demonstrações que costuma fazer quem desperta de um longo e profundo sono. Dizia mais, que entendendo o santo Apóstolo que dali mandava a Virgem N. Senhora começasse a pregar, enviára à Cidade alguns discípulos para que o fizessem, dando notícia de Cristo nosso bem e da sua sagrada Lei. Isto tudo refere S. Cicílio naquele celebrado livro a respeito deste defunto o qual, segundo Santo Atanásio Bispo de Saragoça, é o nosso S. Pedro de Rates que, por seu contemporâneo e por testemunha de vista, se lhe deve dar o maior crédito, a serem seus os fragmentos que correm em seu nome nos quais diz: Eu conheci a S. Pedro Bispo de Braga a quem, sendo um dos Profetas antigos, ressuscitou S. Tiago filho de Zebedeu meu Mestre. Este tinha vindo com as doze tribos que de Jerusalém mandara Nabuco Donosor a Hespanha [entenda-se "Península Ibérica"], sendo Capitão Nabuco-Cerdam, ou Pirro, Prefeito dos Hespanhois [estamos certamente na região entre Braga e Compostela]. Chamou-se este Profeta Samuel o Moço, ou Malaquias o Velho, pela gravidade de seus costumes e formosura do seu rosto. Foi filho de Urias Profeta. Feito Bispo converteu muitos Judeus à Fé, dizendo que ele [?]era com seus antecessores e lhes préegara e morrera vinte anos depois de chegarem a Hespanha [entenda-se "Península Ibérica"]. Este varão Apostólico, recebendo de S. Tiago as Instituições Apostólicas, o Evangelho e Ordem de celebrar Missa, e os mais Sacramentos, veio a Braga: escreveu muitas cartas cheias de espírito apostólico das Igrejas em que pôs Bispos, como foram Iria Flávia, Amfilóquia, Eninio, e o Porto, onde pôs a S. Basílio seu discípulo, (o qual depois de seu martírio lhe sucedeu em Braga) e pôs em Tui a Epitácio. Estes varões divinos e verdadeiramente Apostólicos não se deixavam estar sempre num mesmo lugar, mas à imitação dos Apóstolos discorriam por todos aqueles onde os levava o Espírito Santo. Como Epitácio que não só prégou em Tui senão também em Ambrácia, cidade Lusitana: ilustrando todos sua pregação com milagres e variedade de línguas. Nem ele saiam sós a pregar o Evangelho, mas levavam consigo muitos discípulos, à imitação de Cristo, S. Pedro, S. Tiago e mais Apóstolos. Até aqui Santo Atanásio.

Se muitos Autores escrevem por infalível a ressurreição de S. Pedro de Rates, não são poucos os que não acreditam não dando mais razão porém que a de ser desnecessário um tão grande prodígio: não advertindo, que com ele se manifestaram melhor e se faziam mais resplandecentes as maravilhas de Deus querendo que um defunto sepultado de mais de seiscentos anos introduzisse a verdade do Evangelho e desterrasse a idolatria que tão radicada estaca nos tenazes corações dos bárbaros, e indómitos Hespanhois [entenda-se os "povos da Península Ibérica"] e fosse Primaz de toda a Hespanha [entenda-se "Península Ibérica"], apóstolo da nossa Lusitânia, substituto de seu sagrado Mestre S. Tiago, honra dos Pontífices, Pastor resplandecente, âncora da Fé, e finalmente Doutor, e protomártir ilustre das Hespanhas [entenda-se "conjunto de povos e reinos da Península Ibérica"]."

(terá continuação s.D.q.)303

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