Todavia evitais o excesso de
negar explicitamente a vida futura. Admiti-la em desejos, aspirações e linguagem;
mas doutrinalmente a rejeitais. Conheceis que o nega-la em absoluto é um ataque
a Deus e ao homem. Mas deixais por isso de afrontar o ser supremos, proibindo-O
de sair das leis gerais deste mundo, e de modificar os seus primeiros actos, e
negando-lhe o direito de mostrar às suas criaturas, já deste mundo, o fim
sobrenatural que lhes destina? A natureza é Deus, o sobrenatural é também Deus.
A lei geral é Deus, e o benefício particular, o favor extraordinário, Deus é
também sempre. Não se compadece com a razão que Deus dê ao homem a ordem
sobrenatural: que lhe dê, por gratuita bondade, mais que o pontualmente
necessário à sua existência terrestre; que o beneficie com felicidade superior
ao estado de simples natureza? Mas que razão há para que se desautorize Deus de
tão nobres atributos para ele, e de tão favoráveis para o homem?
Negar, portanto, o sobrenatural,
e ir de encontro a quanto os homens pensaram, acreditaram, e esperaram; é
impugnar-lhes as mais altas aspirações, as mais poderosas faculdades, imaginação,
consciência, e razão, que também fazem parte de sua natureza evidentemente. É
derruir as leis de seu ser, como pretexto de as resolver. É envilecer-lhe o presente,
e denegar-lhe o porvir. É secar-lhe na alma a fonte do grandioso, puro,
generoso e desinteressado. É, por derradeiro, suprimir o problema para o não
resolver.
Bonissimamente compreendera a
força destes princípios e consequências o insigne escritor que designou “como
questão capital a debatida entre os que reconhecem e os que não reconhecem
ordem sobrenatural, certa e soberana, bem que impenetrável à razão do homem;
questão ventilada entre o supernaturalismo
e o racionalismo. De um lado, incrédulos,
panteístas, cépticos de todos os feitios, e racionalistas. Do outro lado,
cristãos. Os melhores de entre os primeiros deixam subsistir no mundo a estátua
de Deus, se podemos empregar semelhante expressão; mas somente estátua, uma imagem,
um mármore. Deus não está aí nisso. Comente os cristãos têm o Deus vivo”.
(Guizot. Meditações e est. Moraes, Pref, pag. 1)
Assim como filósofo entende com
referência a Deus, o intendemos com a imoralidade e vida futura!
Observação curiosa é essa da
confrontação dos diversos sistemas que não admitem a verdade completa! Conformidade
que lhes argue o erro, e mostra a incerteza de sua direcção, e a fragilidade de
tudo que não assenta sobre bases fixas e inconcussas! Porque, observai que
propriamente as escolhas, que professam doutrinas sãs e elevadas sobre outros
pontos, logo que se declaram inimigos do sobrenatural, submetem-se à justa
arguição de M. Guizot, como as outras que, à míngua de vontade ou força, não se
elevam a considerações nem aceitam leis superiores às do mundo.
Dois sistemas, que
particularmente vamos estudar, combatem hoje em dia toda a espécie de
sobrenatural, e deste antagonismo fundaram doutrina. Pertencem uns ao
racionalismo puro, admitem unicamente a razão como supremo fim, e, mediante uma
crítica desassombrada, tocaram o nominalismo sem fundamento nem realidade.
Outros, restinguem-se ao positivismo, só reconhecem concepções materiais,
aplicações puramente sensíveis, e fazem da terra ponto de partida como termo
único de seus esforços."
(Leia a primeira parte do texto, AQUI)
(Leia a primeira parte do texto, AQUI)
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