28/05/15

VOCABULÁRIO DEMOCRÁTICO Nº2 (V)

(continuação da IV parte)

ELEIÇÕES POPULARES – Termo ilusório. O Povo tem direito de eleger seus Representantes. O Povo não pode errar nesta eleição, etc. Pois veja Vm. aqui que o Povo de Bolonha, Modena, e Ferrára elegeu os seus, porém não elegeu ateus, malvados, nem franchionotes: ei-lo aqui subitamente declarado incapaz de eleger. Anuliam-se as eleições feitas, e pelo bem do mesmo Povo, que não sabe o que se faz, tem a tirania maçônica que tomar o improbo trabalho de fazer umas novas, e verdadeiras eleições á democracia. — Porém, como é isso! O Povo é que tem o direito de eleger.  — Optimamente: porém os tiranos tem o de cassar, e anular as eleições, que o Povo faz. — Senhor, que não concorda a dança com o pandeiro. — Valha-te o diabo agoureiro! Se não concorda, a Filosofia democrática sabe o segredo de fazer concordar. — Por tanto, em resumo de contas, a Soberania do Povo consiste em eleger seus Deputados, e vê-los logo depois anulados, desterrados, e metidos em cárceres? Pois então claro fica demonstrado que a Soberania do Povo democrático é uma coisa bastante irrisória, e fantástica.

CONSTITUIÇÃO – Sempre é a obra mais divina que hão visto os humanos, e em cuja formação tem consumido seu calor vital a moderna Democracia. Sem embargo disto, a uma Constituição democrática sempre acontece a mesma desventura, que ao porco, que um ano nasce, engorda, e é levado ao matadouro. Apenas é dada à luz uma Constituição democrática, eis que em desfilada correm os Filósofos, arqueando as sobrancelhas, e batendo palmas para levantar-lhe o horóscopo. Que coisa tão divina!? A uma voz se grita, ela é o suprassumo da política, o non plus ultra da sabedoria humana, e a fonte perene da felicidade dos Povos. Aceita-se, jura-se sua observância, deve defender-se à custa da vida, e do sangue. Por felicidade nossa todas estas protestações e juramentos democráticos significam menos que nada, uma vez que se não haja de roubar, e assassinar, porque então conservam todo o seu vigor, e inteireza. Porém volte Vm. a folha. Passou já o ano? Pois bem, já o porco está gordo: ao chão com ele. Que desgraça!... A coisa divina, o chefe d’obra, o ápice da bemaventurança de repente se há convertido em uma coisa miserável, em uma sementeira de desventuras para o Povo Soberano! Adeus juramentos!  A obra original vai-se a eito e a esmo, sem o menor perigo do sangue democrático. Concebe-se profundamente uma outra Constituição, tão felicitante (dizem os arquitectos) como a primeira, e debaixo dos mesmos horóscopos. Isso não obstante, toda a Constituição Democrática deve ser sempre imutável, indivisível, eterna, etc. etc. Daqui coligimos o significado de um outro Vocábulo Democrático, que é "ETERNIDADE" (veja-se no fim da Nota que segue.) 

(* Julgamos necessário fazer algumas reflexões sobre esta palavra Constituição, para nós o símbolo da desventura, e da desgraça! ... E para que procedamos com clareza, nós a distinguimos em duas classes "Constituição Democrática" e Constituição Carteira = Em quanto à 1.ª, a experiência tem mostrado ser verdadeiro, o que o Autor diz da sua aparição prodigiosa, dos encômios, que os Filósofos lhe tributam, dos presságios venturosos, que se anunciam, bem como há curta duração de semelhante antro luminoso, que quando parecia difundir mais brilhantes raios, então começa a declinar de seu Zenith, até se ocultar em um horizonte nebuloso, donde quase sempre rompem horrorosas tempestades! E se acaso se não tem acabado em um só ano, como acontece à vida do porco, do segundo até o terceiro não escapa. Os Povos bem instruídos por eles mesmos, e convencidos pela experiência, que os revolucionários não são mais que ladrões, impostores, malvados, que lisonjeiam a classe mais ínfima da Nação, prometendo-lhe coisas grandes, e que depois de a chamarem ao seu partido, se servem dela como degrau para subirem aos lugares e aos empregos, e logo a esmagam debaixo dos mesmos seus próprios pés; eles mesmos tem tomado o partido de lhes darem o pago, e de reduzirem a pó um edifício, que era a obra mais perfeita, que ainda apareceu na Sociedade: protestam, juram os Senhores Deputados, que são os Representantes do Povo, que não querem outra lei senão a Divinal, que não reconhecem outros princípios de direito publico e particular senão as bases da divinal, que não querem outra economia, senão as finanças da Divinal, que não querem outras armas nem tropas, que não sejam cívicas, criadas pela Divinal, e declaram à face do Mundo em o Salão das Necedades, que eles mais valentes que um Cícero, hão de morrer pela liberdade da Pátria, assentados em aquelas cadeiras!!... Bravo! Que valência!! Mas de língua, porque no outro dia evaporam-se: lá se vêm muitos em Vila Franca misturados com o Povo, que gritada = Rei Absoluto = isto é, Rei sem grilhões de pedreiros =, e beijando aquela mão, que desejavam ver cortada bem lhe importam os Povos suas ameaças, e juramentos: se eles tiveram direito para querer a Divinal, tem eles por consequência o direito de a rejeitar, e mandar para o inferno semelhantes Procuradores: cujus est dare, cujus est tollere: e assim acaba quase sempre esta farsa, ou entremezam, em que figuram todos, doidos, e velhacos, e todos eles esfomeados, e ladrões.

(continuação, VI parte)

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