11/12/14

CONTRA-MINA Nº 42: Reconhecimento a D. Miguel I Dado Pelo Papa Gregório XVI (III)

(continuação da II parte)

Foi certamente Belzebu, ou Satanás quem, à hora da meia-noite, lhes descobriu, que não tinha sido absoluto, porém condicional o Reconhecimento do Senhor D. MIGUEL I pelo S. Padre Gregório XVI, e é habilidade, que só alguns Pedreiros Livres, e alguns Confessores Jansenistas saibam, o que se ignoram absolutamente nas Côrtes de Lisboa, e de Roma. É sabida bem fraca, e bem despropositada, assim como é bem para admirar, que certos ânimos se deixem preocupar de uma Sandice tão absurda e tão depressível... mas em fim é necessário, que o Esquadrão feminil, que trata de piedade, e que tantos serviços há feito à Causa, que não é certamente a Causa de Deus, tome alentos, e não desanime de prosseguir em seu nobre intento de acarretar sobre este Reino, depois da guerra Civil, a inteira destituição do Catolicismo. Mal sabem os meus leitores o quanto eu aborreço as geringonças, e caramunhas destas carpideiras dos males do seu próximo, quando este próximo é Constitucional, e Pedreiro..... Quando é Realista, ainda que o vejam padecer os mais duros, e cruéis tratamentos, ainda que lhes vejam apertar tanto as mãos, que as cordas assentem em carne viva, e já cheguem aos próprios ossos, a nada as brutinhas se movem, e ficando muito enxutas, apenas dizem "Não fosse tolo, quem o mandou figurar em causas políticas, quem não quer ser lobo, não lhe vista a pele etc. etc. etc.," e Adeus caridade Cristã, Adeus moral do Evangelho, que deve ceder toda em benefício dos Pedreiros Livres. É bem para lastimar, que o saudoso Padre Macedo [Pe. José Agostinho de Macedo] não chegasse a dar a última de mão ao prometido quadro das Mulhadas, que só um pincel, que no seu género não tinha, nem pouco, nem muito, que invejasse ao de Rafael de Urbino, seria adequado, para o fazer da maneira que convinha, isto é, por tal arte, que as insulsas, ou perversas Malhadas [em linguagem popular, "malhados" eram os maçons, assim chamados pela cena dos cavalos malhados que quase puseram fim à vida de D. Miguel] se corressem de o ser, e tivessem com o Cervantes Português igual sorte, à que experimentaram os Cavalheiros andantes com o Espanhol. Muitas vezes me lembro, de que estas miseráveis, que são a desonra do seu sexo, e de Portugal, tem lá para si, que o Grande Oriente, em contemplação dos seus grandes serviços, lhes conservará sempre uma Igreja aberta, para elas frequentarem os Sacramentos, e serem Cristãs folgadamente, e à sua contade, ou por efeito de alguma revelação do Diácono Paris contem de certo com a geral conversão dos Pedreiros Livres... Deixemos estas loucas, e desvairadas mulheres, e passemos a coisa mais conveniente para os meus Leitores. Dizia eu no princípio deste Nº 42, que o Reconhecimento do Senhor D. Miguel I pelo S. Padre Gregório XVI era um sucesso da maior importância, considerado Politicamente, ou ainda Historicamente. É necessário, que eu dê alguma razão destes meus dictos.

Milagre de Ourique. Nosso Senhor aparece a D. Afonso I de Portugal
A Igreja de Roma, ainda que goze uma Soberania temporal, de que nunca será esbulhada, sem que logo se arrisquem os interesse da Fé, não tem uma consideração política, que baste, para a fazer independente das grandes Potências Católicas; e por isso tem por costume respeitá-las sem baixeza, e acatá-las sem lisonja, até ao ponto de que tenham algumas, como é notório, o direito de exclusiva nas Eleições dos Sumos Pontífices. Daqui vem igualmente, que tratando-sede Reconhecer um de dois contendores, ou aspirantes a uma Coroa, ele tenha espreitado, e seguido as variedades, e mudanças do Sistema Político da Europa "Se pareceu não atender, como de antes, à Soberania de facto, é por ver, que dificuldades mais graves contrariam as suas antigas ideias.. O Sumo Pontífice é Pai comum de todos os Fiéis, e não olha somente para a felicidade espiritual deste ou daquele Reino Católico da Europa, ou da América; não há um só destes no Mundo, que ele não forceje por conservar, e proteger, para que nunca se retirem do centro da unidade, ou se extraviem do único, e verdadeiro caminho da salvação. Quando os Reis, por uma vingança mal entendida, se resolvem a quebrar com a Igreja de Roma, ou, o que ainda é mais fatal, e pernicioso aos seus melhores interesses, a deixar a Comunhão com aquela Igreja, arrastam consigo os Povos inocentes, e gerações inteiras; e melhor seria para eles o perderem a Coroa temporal, do que esbulharem da Coroa eterna a si próprios, e aos seus infelicíssimos vassalos. Fazem pois o maior serviço aos Reis, e atraem sobre os Povos a maior de todas as calamidades, esses infamente Pedreiros Livres, que depois de terem aprendido, e talvez ensinado, que os Papas nunca se devem fazer Árbitros de Questões Políticas, e de terem explicado no sentido mais lato as Divinas expressões "Regnum meum non est de hoc mundo," criminam todavia os Papas, quando movidos de razões fortíssimas, ou suspendem, ou demoram o Reconhecimento dos Príncipes, que mais desejariam ver firmes, e consolidados na posse de seus Tronos. Quantas vezes depois de azedarem os Príncipes contra o Vigário de Jesus Cristo, e de lho pintarem como o seu maior inimigo, e vendo-se apanhados de súbito pela mais exuberantes provas de uma afeição verdadeiramente Paternal, forcejam por extenuá-las, ou diminuí-las, quando lhes não é dado escurecê-las de todo? O principal fundamento da Monarquia Portuguesa consiste na profissão do Catolicismo puro [milenar, o de sempre], e não mesclado de doutrinas Jansenistas, ou quase Protestantiças [hoje, esse "quase" foi ultrapassado]; mas quem se reputa, e deve reputar como Soberano, ou Cabeça da Igreja? É o Sumo Pontífice; pois eu que vejo quebrada a Linha da Sucessão de tantos Bispos nas Igrejas fundadas pelos Apóstolos, vejo-a sustentada, e nunca interrompida desde S. Pedro até ao Sumo Pontífice Gregório XVI. Logo o Sumo Pontífice é parte essencial na firmeza do Trono Português, e por isso este Reconhecimento do Senhor D. MIGUEL I por aquele S. Padre, é o mais apreciável de todos. Que fui eu dizer? Pois não seria melhor, que fosse Reconhecido por algum Soberano, que em lances de perigo lhe enviasse 30$ homens de auxílio, para rechaçar, e debelar completamente os adversários da Sua Pessoa, e Governo? Tal não dizem, e ainda menos pensam os verdadeiros Portugueses (que somente os que forem Católicos merecem tal nome). Os verdadeiros Portugueses não têm uma só Pátria, que se chama Reino de Portugal, aspiram a outro melhor, que nunca lhes poderá ser, nem franqueada, nem entregue senão pelo Ministério das Chaves de S. Pedro. Desde o princípio da minha carreira Literária tenho eu estranhado muito a opinião, em que somos tidos por vários Escritores estrangeiros, e bem estrangeiros na matéria, que se meteram a tratar, sem o devido conhecimento de causa. Temos na Santa Religião dos nossos Maiores um princípio de força irresistível, com que de ordinário se não conra, e que pesa muito nas balança, quando se trata de avaliar os nossos feitos antigos, e modernos. A História de Portugal, no que toca a milagres, e coisas extraordinárias, em que se apalpa continuamente um braço superior, só é excedida pela História do antigo Testamento; e quem a chamar, ou reduzir às causas naturais, e ordinárias da elevação, e queda dos Impérios, forçosamente há-de enervá-la, e despi-la do mais essencial, a ponto de a tornar um esqueleto mirrado, e informe.

(continuação, IV parte)

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