25/11/14

CARTA DE EMIGRADO - SOBRE O IMPERADOR D. PEDRO I (I)

No jornal anti-liberal "Contra-Mina", de Fr. Fortunato de S. Boaventura, está publicada a carta "Carta de Hum Portuguez Emigrado, Àcerca do Imperador do Brasil, e do Seu Chamado Manifesto - Paris, 20 de Fevereiro de 1832", a qual exponho:

(Reimpressa da que se imprimiu tal e qual em Londres, na Imprensa de P. Thomas)

Paris, 20 de Fevereiro de 1832

Meu bom amigo.

Recebi a sua estimadíssima carta, e com ela um exemplar do chamado Manifesto do ex-Imperador do Brasil, o qual à primeira vista pareceu-me um resumo do Padre Amaro, porém, bem examinado, achei que era mais alguma coisa. A Proclamação, que o acompanha, do mais antigo dos emigrados, é um papel igualmente curioso, e vem aqui mui a propósito, porque sendo um, e outro documento, tanto pela sua natureza, identidade e circunstancias, como pela sua legalidade e efeito, uma e outra mesma coisa, deviam aparecer juntos, para correrem o mundo de mãos dadas. Ninguém poderá, por certo, criticar com razão o autor da Proclamação, ele considerou, e considerou bem "que tanto direito tinha um brasileiro emigrado para fazer um Manifesto, como um emigrante português (ainda que fosse dos mais modernos) para fazer uma Proclamação."

Verdade é que em outro tempo só os Soberanos, e as autoridades constituídas, faziam manifestos e proclamações às Nações, e aos Povos; hoje porém, graças à ilustração do Século, qualquer Astro da Lusitânia, qualquer Amigo do Povo, qualquer Periódico dos Pobres, pode fazer seu manifesto, a sua Proclamação, e dizer nela aos asnos, por quatro pences "eis aqui a tábua da vossa salvação, a restituição do vosso nome, dos vossos foros, da vossa liberdade" que ninguém lhe leva isso a mal.

Mas deixando estes anfíbios políticos, que nunca sabem o que dizem, e o que fazem, seguindo hoje uma opinião, amanhã outra, tratando só dos seus interesses particulares, que é a ordem do dia, e o seu liberalismo; passarei ao meu assunto, que é o ex-Imperador do Brasil, e o seu chamado Manifesto, e não a ridícula entremezada da proclamação que lhe serve de suplemento; sendo todavia para lastimar a fraqueza, e a instabilidade de carácter de certos homens que, trabalhando por ganhar boa reputação, de princípios úteis, e não adversos à sociedade, mostram que não são firmes naqueles princípios, nem dotados dos melhor patriotismo.

Verificou-se finalmente a notícia que lhe dei na minha carta de 31 de Outubro do ano passado. A quasi unanimidade dos emigrados via o mal, apontava os males maiores que se lhes preparavam, e os autores do mal nem por isso persistiam menos em sua empresa! Honra, boa fé, leis, protestos, e juramentos, tudo é calculado aos pés neste momento. E que outra coisa devíamos nós esperar de um punhado de facciosos, e perjuros, tão vis, como infames, tão descarados, como perverso? Que tínhamos a esperar de uma facção que louca, e criminosamente pretende que todos os emigrados arrastem as suas cadeias, e que não hajam mais leis, que as que ela ditar, não para melhorar a nossa sorte, mas para com a capa da felicidade, justiça, independência, liberdade, e outros nomes, roubarem-nos, destruírem-nos, e levarem-nos à última degradação, e desgraça? Sim, meu amigo, correu-se o pano, e apareceu na cena o Iturbidade representa o papel de regente! Ainda agora principia a comédia, que naturalmente acabará em tragédia para o Imperador do Rio, e seus sequazes.

Tratando agora do chamado Manifesto, confesso-lhe que não sei por onde principie, se pela hipocrisia, e maldade, que se encontra em quase todas as suas páginas, se pela perfídia, embuste, contradições, e absurdos, de que está cheio? Principiarei pela perfídia, e contradições; e deixarei para logo a hipocrisia.

Cessa o ex-Imperador do Brasil de ser Rei em virtude da Carta constitucional; morre politicamente para nós em virtude da sua formal abdicação, aparece regente, e quer ser aclamado Rei, sem subversão da Carta.

Aniquila a Carta, que prometeu guardar, fazendo-se Regente; e recorre no seu chamado manifesto aos dois Protestos que fizeram os seus Plenipotenciários, quando Imperador, contra a abolição das instituições consignadas na Carta! (Bem rebatidas e pulverizados foram na G. de Lisboa.)

(continuação, II parte)

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