APÊNDICE
Não desagradará aos Leitores ler um retalho do grande Edmund Burke, extraído dos seus Pensamentos, sobre a proposta de paz entre a Inglaterra, e França, que ele intitulou Paz Regicida em 1796, a fol. 75 do opúsculo já traduzido em português, e impresso em Lisboa em 1822 (obra na verdade digna de todo o bom, e fiel vassalo a ler, e decorar, pela sua sã doutrina, profunda política, e encantadora eloquência, e muito mais discorrendo tão profundamente sobre as causas, progressos, e consequências de ímpia Revolução Francesa, e seus remédios, e até mesmo pelo diminuto preço de 360 reis porque se vende uma obra, que em outro tipo custa 1$920 reis) diz ele o seguinte:
A obra Francesa não é uma má obra velha, coberta com prescrição; é nova demolição, e decomposição de todo o Edifício da sociedade civil, e infame arquitectura do covil de ladrões, assassinos, e ateus: obras de rapina, matança, e impiedade, longe de serem títulos a causa alguma, são por isso só públicas declarações de guerra ao Género Humano.
Esta guerra porém não é feita à França, mas à cáfila dos salteadores, que exterminaram de suas casas os respectivos proprietários; pois as Nações são Essenciais morais, e não Superficiais geográficas.
Supõem-se, (o que Deus não permita) que o nosso amado Soberano fosse sacrílegamente morto; a sua exemplar Rainha, a Cabeça das matronas da Terra, tivesse o mesmo fado; as suas Princesas, que pela sua beleza, e modesta elegância, são as flores do país, e os modelos das virtudes do seu sexo, sofressem igualmente cruel, e ignominiosa traição, com cem outras mais, filhas, e senhoras da primeira distinção; os Príncipes de Cales, e York, esperanças, e timbres da Nação, com todos os seus Irmãos, fossem obrigados a fugir dos punhais de assassinos; todo o corpo do nosso excelente Clero fosse assassinado, roubado, e desterrado; a Religião Cristã, e todas as suas comunhões, proibida, e perseguida; a Lei da Terra, fundamental, e totalmente abrogada; os Juízes conduzidos ao cadafalso por Tribunais revolucionários; os nobres, e plebeus esbulhados de suas possessões até à última geira de terra, e em cima empobrecidos, e aviltados; todos os Oficiais do Serviço Civil, Militar, e de Marinha sujeitos aos mesmos desterros, confiscos, e perigos; os principais Banqueiros, e Comerciantes arrastados ao patíbulo, para o matadouro geral dos que não tinham outra culpa senão o ter dinheiro, e fazer Comércio; os Cidadãos das Cidades mais populosas, e florescentes encadeados, e juntos numa Praça, e aí destruídos a milhares com metralha de artilharia, e descargas de canhonada, por não se acharem patíbulos, máquinas, e algozes suficientes para expeditas execuções capitais; trezentos mil outros sentenciados a uma situação pior que a morte, presos em pestilentes, e infernais calabouços; (Burk neste exemplo descreve o que fizeram os Jacobinos e Pedreiros Livres na Revolução Francesa, e como Profeta político prognosticou, o que há pouco praticaram, e intentaram fazer na Espanha, Nápoles, Piemonte e Portugal, e a quanto eles se propõem em toda a parte do Mundo, em que poderem exercitar os seus execráveis, e mortíferos planos. Pela continuada guerra contra os Pedreiros acabou, e só podia acabar o seu governo, e influência, e pararam, e só podiam parar os seus dolorosos estragos. Todo o Governo pois, que não seguir este exemplo, e não desalojar até o último Pedreiro, que existir, virá a ser por eles espezinhado, e desgraçado, com todos os seus vassalos - De um Anónimo) em tais circunstâncias calamitosas cairiamos porventura Ingleses a Facção dos malvados, que praticassem tais desordens, e horrores? Seria o país, onde se vissem tais tragédias, a Inglaterra, tão admirada, honrada, amada, e querida? Não reputaríamos antes por únicos compatriotas os fugitivos leais deste país? A terra de seu temporário asilo não se deveria considerar a verdadeira Grã-Bretanha? Poderia eu ser considerado como traidor a meu país, e digno de perder a vida com infâmia, se andasse por todas as Nações da Europa batendo a todos os Paços, e Corações dos Principais da Cristandade, para socorrer os meus amigos, e vingá-los dos seus inimigos? Podia nunca mostrar-me melhor Patriota? Que se devia pensar dos Príncipes, que insultassem a seus Irmãos perseguidos pelos rebeldes, e que os tratassem de vagabundos, e mendicantes? Que generosos sentimentos de poderiam considerar nos que mostrando-se Geógrafos, em lugar de Reis, reconhecessem como os idênticos países nacionais as cidades, só por terem a mesma medida geométrica, depois de tais cruezas, para continuarem com os usurpadores, e malvados as mesmas antecedentes relações políticas? Que juízo faríamos da bárbara protenção dos que, atendendo às cabalas, e intrigas, e declarações dos levantados, lhes entregassem as vítimas da Lealdade de seu país, que lhe tinham ido suplicar refúgio no Altar da Compaixão, para serem sem misericórdia abandonados aos Tribunais dos bebedores de sangue, e parricidas de seu Soberano?
A opressão, e a sensibilidade fazem loucos os homens sábios; mas, ainda assim mesmo, a sua loucura é melhor do que o juízo dos néscios. O seu brado é a voz sagrada da humanidade, e miséria, exaltada no santificado frenesim da inspiração, e profecia. Na amargura da alma, na indignação da virtude sofredora, no paroxismo da desesperação, no espírito da lealdade Britânica, não clamaria eu por cem bocas, e denunciaria a iminente destruição, que espera os Monarcas, que consideram a fidelidade do Vassalo como torpe vício, e que toleram, que ela seja punida como delito abominável, e que só se tenha veneração aos rebeldes, traidores, regicidas, e furiosos escravos, que quebraram os grilhões, e correm à rédea solta a devastarem a terra, deixando-nos adormentar por dormideiras de aduladores, que nos aliciam a descansar nos braços da morte!
(Índice da Obra)
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