18/06/15

O PUNHAL DOS CORCUNDAS Nº 13 (II)

(continuação da I parte)


APPENDIX

Extrato de um projecto da Revolução, composto pelo Conde de Mirabeau, apanhado em casa de Madame Grai, por Le Grande seu doméstico, e vendido a Mr. Houle, Oficial no regimento de Dragões da Rainha, impressos depois com os outros escritos do mesmo género com o título Mistérios da Conspiração.

"Uma nação junta não se muda; só tem em vista o interesse comum para o estabelecer. Deve destruir toda a resistência: e atendei bem para isto. Nada pode ofender a justiça quando se trata do bem geral. Eis aqui o princípio. Trata-se agora de saber qual seja o caminho que é preciso tomar para chegar à restauração geral. É preciso destruir toda a ordem, suprimir todas as leis, anular o poder, e deixar o povo em anarquia. As leis que fizermos não terão logo todo o vigor, não o terão talvez depois; mas é preciso restituir a força ao povo: ele resistirá por sua liberdade, persuadido que a pode conservar. É preciso lisonjear seu amor próprio, e sua esperança, e prometer-lha a felicidade depois dos nossos trabalhos. É preciso iludir seus caprichos, e os sistemas que ele tem feito à sua vontade, porque o povo legislador é muito perigoso, só estabelece leis que coalisam com suas paixões. E como não haja mais que uma alavanca, que os legisladores movem à sua vontade, é preciso que nos sirvamos dele, fazendo-lhe odioso tudo o que quisermos destruir. É preciso semear a ilusão em todos os seus passos; comprar todas as penas mercenárias, que propagarão os nossos meios, e lhe farão ver que nós não atacamos mais que os seus inimigos.
O Clero, sendo o mais poderoso na opinião, não pode ser destruído, senão metendo-se a ridículo a Religião, tornados odiosos seus Ministros, e dando-os a conhecer como outros tantos monstros hipócritas; porque Mafoma, para estabelecer a sua Religião, começou por infamar o Paganismo, que os Árabes, os Sarmatas, e os Seytas professavam. É preciso que a todos os instantes os Libelos abram um novo caminho ao ódio contra o Clero: é preciso exagerar suas riquezas, tornar gerais os crimes, e os erros dos particulares, atribuir-lhe todos os vícios, a calúnia, o assassínio, a irreligião, e o sacrilégio. Nada de delicadeza, tudo é permitido nas Revoluções.
Venhamos à Nobreza. É preciso evitá-la, e dar-lhe uma origem odiosa. É preciso estabelecer um gérmen de igualdade, que não pode existir; mas que lisonjeará o povo.É preciso sacrificar os mais preocupados, incendiar, e destruir suas propriedades, para intimidar os outros. Senão pudermos destruir inteiramente a preocupação da Nobreza, no menos a enfraquecermos, e o povo vingará seu amor próprio, e seu ciume, com todos os excessos, que obrigam os Nobres a fazer o que nós quizermos.
Enquanto à Côrte, é preciso eclipsá-la aos olhos do povo, anulando todas as leis, que a protegem. O Duque de Orleães não omitirá causa alguma para dar explosão à sua vingança. É preciso degradar a Corte até tal ponto, e com tanto excesso, que em lugar de veneração, o povo não tenha mais que ódio, e aversão a seus Soberanos. É preciso que os considere como seus inimigos, e que esteja pronto a se vingar. É preciso lisonjear o soldado, levantá-lo contra a autoridade legítima, fazer-lhe odiosos seus Oficiais, e os Ministros: aumentar seu soldo, fazendo-o o homem da Nação, e não do Rei: enviar-lhe emissários, que o instruam nos nossos projectos, e fazê-lo patriota. E não vedes vós que sem isso nossos inimigos iludiriam todas as nossas vistas, todas as nossas combinações, todos os nossos meios, pela força das armas? Passemos aos Parlamentos.
É preciso representar ao povo sua venalidade, que recaiu sempre sobre o mesmo povo. É preciso mostrar-lhe os Magistrados como déspotas altivos, que vendem até os seus mesmos crimes. O povo ignorante e bruto só vê o mal, e não o bem das coisas. Não digo nada dos Financeiros. Será infinitamente fácil convencer o povo que tudo são abusos na administração da fazenda, e que só merecem indignação os que a ela presidem. Notai bem que o Rei, e os Grandes procurarão frustrar a nossa Revolução com guerras intestinas, ou com as Estrangeiras. É preciso pois para que isto tenha um completo êxito levar o espírito de independência a todos os povos circunvizinhos. Isto não será coisa muito difícultosa. O Espanhol é muito inflamável, e geme há muito tempo debaixo do jugo tirânico do Despotismo, e da Inquisição. Os Italianos são tão arrebatados como os Franceses, e depois que começou a lavrar entre eles o espírito Filosófico, desprezam a Tirania. O Alemão é mais difícil de se mover; porém sua escravidão o indigna contra seus déspotas. É preciso espalhar ouro em Alemanha. Todos os que se deixarem corromper, propagarão a insurreição. O Brabante se inflamará com o mais leve assopro. A Holanda é toda nossa. A Inglaterra nutrirá, e sustentará nossas desordens. Seu ódio natural contra os Franceses não lhe deixará tomar um partido generoso para defender nossos direitos, se neste partido não divisar seu próprio interesse. Quando o Gabinete de S. Jaime nos queira fazer guerra, opor-se-hão os Comuns, porque nós lhes diremos que o que pretendemos é destruir o Despotismo, e a Hidra feudal, e fazermô-nos livres, como eles são. A Prússia tem vistas, que poderão  prejudicar; este Reino não nos deve meter medo; não é uma Potência, que possa afrontar um grande povo ardente, e impetuoso como são os Franceses. É preciso aguerrir este povo. É preciso mais que tudo fixa-lo na defesa das fronteiras, e para isto cumpre nutrir e acender seu furor, alentar suas esperanças com a supressão dos impostos: intimar-lhe surdamente a matança, e extermínio dos inimigos da Revolução, como um dever útil ao Estado. Nós devemos exigir o juramento a todos aqueles, que se juntarem a nossos projectos, e formar diversas sociedades, que em suas sessões tratem o mesmo assunto, discordando (para disfarçar) de opinião.
Enfim importa admitir o povo nos estabelecimento, que devemos criar, concedendo-lhe a voz deliberativa nas Assembleias gerais; isto lhe dará um veículo de honra, que lhe fará andar a cabeça a roda. Mas é preciso não deixar às Cameras mais do que um poder limitado. Se lhes deixarmos muita força, seu Despotismo será muito perigoso. Lisonjeemos o povo com uma justiça gratuita; prometa-mos-lhe uma diminuição de impostos, e uma repartição mais igual. Estas vertigens o hão de fanatizar, e removerão toda a resistência.
Ah! Que importam as vítimas e seus números, as espoliações, as destruições, os incêndios, e todos os efeitos necessários de uma Revolução? nada nos deve ser sagrado!" (Tirado da Refutação dos Princípios Metafysicos, pág. 222).

Este Documento original e autêntico contêm em si todos os princípios de irreligião, e imoralidade: os Pedreiros Livres o pertenderão negar; mas o que eles praticaram na França, na Itália, em Espanha, e em Portugal, manifesta bem a sua autenticidade, e que este é o seu Cresto, ou Cartilha, por onde se governam, e querem deste modo arrancar de entre os homens a Religião, e os bons costumes, e precipitá-los no abismo de todos os males: são portanto os maiores inimigos do género humano. Só poderemos ser felizes pela Religião, e pelos bons costumes; e como esta infernal seita trabalha por destruir estes dois princípios, somente com o extermínio dela poderemos aspirar à nossa felicidade.

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LISBOA: NA IMPRESSÃO RÉGIA. 1823
Com licença da Real Comissão de Censura.

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