PÁTRIA – Em a linguagem antiga significava, e significa ainda o país, onde alguém
nasce. Nome doce, e caro para todos, e que excita em os corações desejos de
façanhas nobres, e virtuosas. Porém a moderna Pátria Republicana é de um cunho inteiramente novo, e perfeitamente
diverso. Um Demónio saído do inferno não poderia cometer mais iniquidades,
que as que a palavra Pátria faz
cometer a um verdadeiro Filosofo Republicano. Regicídios, fratricídios,
parricídios, injustiças, crueldades, roubos, heresias, blasfémias, extermínios,
raptos, adultérios, leviandades, matanças, e quanto se pode imaginar de mais
atroz, e iníquo, outro tanto é licito, e manda esta fúria infernal; e nada há
tão virtuoso, louvável, e meritório para um Democrático da ultima moda como todos estes horrores, quando os consagra à digna Pátria. Poucas pátrias deste jaez bastariam para acabar com tudo, e aniquilar a
linhagem humana. Em resumo de conta, a Pátria Republicana é tal, que todo o
homem de bem, honrado, e virtuoso deve em consciência jurar-lhe um ódio eterno.
PATRIOTA
– Significa pessoa a propósito para a pátria republicana, quer dizer, cunha do mesmo pau. Nesta hipótese,
será mais patriota aquele, a quem menos asco causam as iniquidades, perfídias,
e blasfémias, e que quando a Pátria as manda, e até sem as mandar, ele lhas
dedica com uma semblante o mais sereno, e risonho. Não se pode pois ser bom Patriota sem ser um ateu, um
traidor, um inimigo, não só do legítimo Soberano, mas da Pátria verdadeira, de Deus, de seu próprio Pai, e até de seus mais caros Amigos, e Patrícios. Com
estar provas de patriotismo pode estar seguro qualquer para conseguir emprego
em a pátria republicana. Cuidado, que eu nada exagero em a explicação do Vocábulo Patriota; basta ter olhos, e
lançar uma olhada à moderna Pátria. É
claro que não se vêm em os empregos senão Patriotas; porém Patriotas desta estôfa. Em o
antigo idioma não há, nem se quer uma palavra, que explique plenamente o novo
termo Patriota. Ela é a quinta
essência da impiedade, da patifaria, e da pouca vergonha. Oh! e quantos
Patriotas há, para quem desfeita como o sal em agua a cucanha de uma tal Pátria, chorão amargamente uma perda tão preciosa!... E oh! quantos há em
lugares, que suspiram por uma cara Pátria,
que ponha em exercício seus belos, e
louváveis desejos! Mas não haja susto; são tigres, que mordem em vão sua
cadeia.
O
que seria maravilhoso ver, se fosse possível, era que se fizessem todos os patriotas em uma paiz. Num momento se
acabaria a todo o patriotismo: e
eis-aqui a prova. Tudo o que ele tem de
útil, e agradável é poder tiranizar, e roubar. Em quanto houverem não patriotas bem vai o caso, e a tirania, e o roubo, ou teriam que roubar-se, e tiranizar-se uns aos outros, e
seria mui duvidosa a sua sorte. Mais claro: em quanto houverem borregos, a
republica dos lobos há de ter certas as suas conveniências; porém reduzida só a
lobos não pode deixar de ser mui miserável.
Outra
classe de Patriotas há, a quem
podemos chamar solapados. Declamam
fortemente contra as violências, opressões, e tirania, que ou sofrem, ou hão
sofrido por outros, sua pátria, e seus
concidadãos. O que não vê por teia de cadarso, os terá por homens de bem; porém
cuidado! que estes são os mais fanáticos, e perigosos Republicanos. Pobres
Patriotas! A suspirada tirania, e os apetecidos roubos os tem feito, ou
estão fazendo outros, e não eles; e
são Tântalos atormentados de uma sede raivosa, que não podem provar a agua, que
lhe escorre dos lábios. Quem palpitações do coração! Mugem como touros ao
lembrar-se que outros lhes hão usurpado seu exclusivo direito de roubar; e tem
havido homem, que até tem arrenegado da democracia, e com razão: porque, de que
diabo serve uma democracia, onde não chega a minha vez de roubar? Olho à letra!
Pois não é cousa nova que os ladrões não estejam de acordo: e um tunante não é um homem de bem, só porque fala mal de outro tunante.
REPÚBLICA
– (Vid. Pátria) Há só uma cousa a advertir, e é que em a língua republicana
parece estar sancionado que não possa haver pátria verdadeira, senão a que é
Republicano-democrática. E na verdade, que em certo modo a proposição é mui
justa; porque para inspirar sentimentos, que horrorizem a natureza, não basta
uma qualquer pátria, mas sim é necessária uma pátria republicana.
CIDADÃO
– Em o idioma antigo, habitante de Cidade.
Em o moderno, todos (à excepção dos Frades) habitam na Cidade, ainda que nunca a
hajam visto. Para entender pois este Vocábulo com a devida precisão, é
necessário distinguir, e separar o Cidadão cidadão,
do Cidadão vilão, e do Cidadão aldeão, etc.
Em
as Republicas modernas todos os Cidadãos são iguais, ao menos de palavra; porque todos são Cidadãos. Porém pelo
que toca à realidade, há duas classes de Cidadãos, tão distintas uma da outra
como o Oriente do Poente; a saber: Cidadãos opressores,
e Cidadãos oprimidos: Cidadãos
ladrões, e Cidadãos roubados: Cidadãos verdugos, e Cidadãos assassinados.
Quanto se comprazem os primeiros com um tal nome, e com os privilégios a ele
anexos, outro tanto se horrorizam os segundos somente em ouvi-lo. Todo o homem
de bem, pacífico, e religioso, especialmente se tem dinheiro, trema desde os
pés até à cabeça só em ouvir o nome Cidadão.
Ainda
não temos podido penetrar, porque a democracia moderna tinha escolhido este igualativo Vocábulo com a preferência a
outros. Dizemos isto, porque para igualar qualquer palavra devia ser indiferente; e tão honorífico seria chamar aos habitantes de um país com o
nome de cidadãos, como com o de brejeiros
ou bandidos, com tanto que fosse
comum a todos. Por ventura preferir-se-ia aquele por ser mais decente. Porém bem considerada a
coisa, é preciso confessar que o nome
Cidadão parece assaz vil para manifestar toda a dignidade, e grandeza de um
Povo essencialmente Soberano. Porque,
vamos com clareza, não lhe caberia melhor
o de Majestade? Pelo menos assim lhe
era devido na qualidade de Soberano
verdadeiro. E então que entusiasmo tão exaltado não causaria em um malsim, um
lacaio, ou um sans-culotte, o ver-se saudado com a expressão de sirva-se Vossa Majestade?! Pelo menos
deste modo se união perfeitamente o decoro, e a igualdade.
Sans-culotte |
(continuação, V parte)
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