(continuação da II parte)
A Soberania do Povo
De que na antiguidade sagrada, ou profana por mais que se busque, não aparecem vestígios, antes pelo contrário quanto mais perto da origem da sociedade chegam os trabalhos, e a exames históricos, vai-se para contantemente em algum Rei ou juiz ou magistrado supremo... o que é tão certo, que o ditado vulgar "Haja um que nos governe... já era mil anos antes que Jesus Cristo viesse ao mundo..."
De que na antiguidade sagrada, ou profana por mais que se busque, não aparecem vestígios, antes pelo contrário quanto mais perto da origem da sociedade chegam os trabalhos, e a exames históricos, vai-se para contantemente em algum Rei ou juiz ou magistrado supremo... o que é tão certo, que o ditado vulgar "Haja um que nos governe... já era mil anos antes que Jesus Cristo viesse ao mundo..."
Foi
a soberania do povo quem levou ao cadafalso o Rei Carlos I de
Inglaterra e em nossos dias o malfadado Luis XVI, e acabaria
infalivelmente por fazer a todos a mesma gracinha, se lhe não forem à
mão, e cortarem os herpes muito radicalmente de maneira, que nunca mais
pegue tal doutrina quer seja de sementeira, quer de enxertia quer de
estaca... Assentemos por uma vez que nunca o povo se diz soberano para
outro fim mais do que para cair toda a soberania nas mãos de um punhado
de aventureiros, que desta arte lhe fazem a boca doce, em quanto mui a
salvo, e a despeito da moral cristã, e dos princípios mais vulgares de
decência, vão enchendo a bolsa, e por certo que não há coisa melhor nesta
vida....
Se
pegou a a lábia ficaremos verdadeiramente soberanos, e o povo terá de
obedecer a muitos que só curam de esmagá-lo, e saqueá-lo, em lugar de um
só que nenhum interesse tinha de o vexar e de o oprimir. Se o tiro
falhou, e não acerta no alvo não falharam as louras que vão na algibeira
e que darão para comer e viver folgadamente em quauqluer parte do
mundo. São pois os heróis deste jaez inimigo do povo a quem esbulhão de
todo o fruto dos seus suores e fadigas; são inimigos dos Reis cuja
autoridade aviltam a ponto de fazerem sensível para experiência de
alguns anos, que um Rei é traste supérfluo, e que se todas as suas
funções se devem reduzir a assinar de cruz em todos os papeis que lhe
arrumarem, será melhor que o não haja... pois um Rei assim que custa um
conto de réis por dia, sai muito caro à Nação (expressão de um ilustre
deputado às Cortes Ordinárias, que de certo não podiam ser mais
ordinárias). Ora tem saido a lume refutações sem conto desses puritanos,
liberais, pedreiros carbonários etc. etc. etc. mas quem deu chiste foi o
autor de Hudibras.
Ainda
que o restabelecimento de Carlos II no trono de Inglaterra sufocou os
partidos, e restituiu a paz, e a tranquilidade ao próprio Reino que
nessa parte mais feliz do que acaba de ser o nosso, não fôra roubado sob
a protecção de Cromwel e que à primeira voz que soltou o General Monck
(mais feliz do que o nosso ínclito Silveira) gritou em altas vozes pela
monarquia; nem por isso deixou de haver uma chusma de descontentes, que
sem embargo de que todas as classes tinham aceitado cordialmente a
mudança de governo, mordiam-se de raiva, e não perdiam de todo a
esperança de tornarem a subir...
Apareceu
o Hudibras, ficaram todos metidos num chinelo, e nunca mais ninguém
piou, e o que não chegaria a fazer toda a severidade de um Rei, que
desagravava o trono de seu desgraçado Pai, conseguio-o pena de um
escritor, que sem nomear pessoas, ainda que designando-as mui claramente
pelas suas artes, prendas, e manhas, triunfou daquela emperrada teima
de reformar a torto e a direito, e por certo mais esforçado que Alcides
livrou a sua ditosa pátria destes verdadeiros, leões de Nemeia...
Apareça entre nós um Hudibras - e sem pão nem pedra daremos cabo dos
pedreirinhos, que conseguirem escapar ao desterro, e à morte, e a
qualquer outra pena, que lhes infligir a junta severidade das leis.
Sem comentários:
Enviar um comentário