30/12/13

"DEFEZA DE PORTUGAL" (1831) - D. Maria não pode ser Rainha de Portugal (VI parte c)

(continuação da parte b)

Escrevendo estas linhas, com tal entusiasmo de coração, e de cabeça me achava eu, que pensando, ou esquecendo-me de que alguém poderia pressentir-me, gritei, como fora de mim, por estas palavras "D. Pedro Rei de Portugal! Para brasileiros! D. Maria da Glória Rainha de Portugal! Fora Pedreiros!" E eis que ouço uma voz medonha, e espantosa, que diz "Este homem está doido; há de ele ser Rei, e ela há de ser Rainha, ou por jeito, ou por força." Corro em seguimento de quem falava, mas não vejo alguém; acho somente, indo para aquela parte, onde parecia soar a voz, um papel em letra desfigurada, no qual pude ver certos emblemas maçónicos, como eram um triângulo, um compasso, um punhal, um bosque, e nele um homem, e junto dele uma menina; já se entende, tudo isto pintado, e a tudo isto seguia a seguinte legenda: "Convém ter Portugal sempre inquieto até o cansar, e desesperar. Serão os Povos inspirados de sentimentos de compaixão pela desgraça do Senhor D. Pedro, e da Menina, arrojados do Brasil: dir-se-lhes-há que, quando eles estavam no Brasil, não fizeram mal em aclamar Reis o segundo filho do Senhor D. João VI; mas que agora, estando o primeiro desimpedido, deve outra vez tomar o lugar, que lhe pertence, e conseguintemente reinar; mostrar-se-lhes-há que isto lhes convêm, porque é o meio de fazer prosperar o comércio entre Portugal e o Brasil. Assegurar-se-há a todos a conservação dos seus empregos, e  o melhoramento neles, em nome do Senhor D. Pedro: prometer-se-há baixo aos soldados de todas as linhas, que a pretenderem,e reforma a todos os oficiais, que não quiserem servir: dar-se-há um posto de acesso a todos os que prestarem maiores serviços ao Senhor D. Pedro; serão para isso convidados os oficiais de maior confiança, e os sargentos de todos os campos: os soldados serão aliciados com dinheiro; mas haja toda a cautela com os militantes, que têm estado no Espanha: os agentes desta Causa serão todos os que amam a liberdade; e lançar-se-há mão desses, que acabam de ser expulsos do Brasil, porque merecem a estima dos homens de bem: chegando o momento, e ao toque do Grande Hino, dar-se-há o grito de "Viva o Senhor D. Pedro"; serão imediatamente presos, e embarcados dos Fidalgos mais amigos de D. Miguel, e postos em liberdade todos os presos. Por todos os amigos da liberdade será lavrado um protesto, em nome da Nação, da coacção, em que a pôs a força armada a favor de D. Pedro: dado este passo, o Exército fiel das Ilhas dos Açores estará prestes a segurar este esforço dos verdadeiros liberais, e a presença do Senhor D. Pedro coroará os desejos dos seus amigos. Valor, segredo, velocidade, e confiança nos Gabinetes de França, e Inglaterra." Nada mais continha o que vi escrito no tal papel, salvo uma cifra, que não pude entender: fiquei, não desmaiado, mas admirado de tal perfídia, e traição: vacilei no que devia fazer, se o remeteria à polícia; mas lembrei-me que lá dantes não corriam papeis, que não fossem assinados, e também que ao Correio do Porto esqueceria de meter na Mala de Lisboa esta correspondência, como se esqueceu de dar, e enviar outras. Então decidi-me a denunciar ao público este aborto do maçonismo;e, copiado, o entrego ao fogo, como deviam ser entregues todos os autores destas maldades, ou , em termos claros, todos os que se lembram de chamar o Senhor D. Pedro a Portugal, e todos os que acreditam em promessas feitas a Portugal em seu nome; porque o nome do Senhor D. Pedro em Portugal não é pronunciado senão para acabar de destruir Portugal, e para os portugueses se matarem uns a outros, e os que vivos ficarem serem escravos de tiranos, e de malvados.

Entenderá algum dos meus leitores, que esse papel, que eu disse haver visto, é fingido, pois que no local, em que eu vivo, não haverá lá desses malhadões capazes de inventar, e ainda de executar estes planos. Mas não é isto assim: aqui nestas montanhas se acoutam malhados de bom lote, como oficiais da 1ª, e 2ª linha, cívicos, e outros desta raça; por aqui vivem, por aqui vegetam estes bichos do mato, e respiram livremente; não há quem os prenda; se os prendem, não há quem jure de dista contra eles, ou porque os que juram são outros tais como eles, ou porque os que podem, e devem jurar, se temem, dizendo para si: "ninguém sabe em que isto há-de vir a parar". Assim os tais malhados, se são presos, são logo soltos, e absolvidos como inocentes, com quatro atestações passadas graciosamente, ou venalmente, por pessoas capazes de atestar que o Diabo é um Santo, e com três testemunhas abonatórias, que nunca os malhados estão sem fradores; e assim os tais malhados saem sempre livres, secundum allegata, et probata, e ao depois insultam as testemunhas, que juraram parte do que sabiam, e aos que os prenderam. Ora se aos tais atestantes, e às tais testemunhas abonatórias se impusesse a obrigação de ficarem por principais pagadores, dizendo-lhes: "Ora este homem está inocente porque Vossas merecês, ou Senhorias o dizem; pois tomem sentido; se ele fizer alguma, são Vossas merecês, ou Senhorias os que pagam a pena por ele". Não seria então absolvido um só dos que tem sido presos por malhados. Eu estou esquecido do que estudei na Jurisprudência; mas como em casos insólitos só devem reger Leis insólitas, se eu fosse Juiz, que houvesse de sentenciar algum malhado, que se houvesse justificado, lhe diria: Vossa mercê não tem dado provas positivas de ser um bom português, ainda que as testemunhas, e atestantes o justificam de que não é notoriamente malhado; pois por essa razão fica Vossa mercê preso mais doze anos, não por malhado, mas para que o não venha a ser. Eu aposto qualquer coisa, se de mil malhados presos por isso, e justificados por aquilo, há dois, que não desejem de todo o seu coração o império da malhadice, e que se não aprontem para ao primeiro rufo cantar o Hino Costitucional, e berrar pelo Senhor D. Pedro, ou pela Senhora D. Maria da Glória.

Ora pois, ou o papel, que acabo de trasladar, seja real, ou imaginado, quero dizer, forjado pelos pedreiros para aterrar, o certo é que é este, e não outro o partido, que eles pretendem tirar da chegada do Senhor D. Pedro à Europa: fazer em seu nome outra revolução, alagar de sangue o território português, e abismar Portugal em discórdias, em vinganças, em pobreza, e em crime. E haverá ainda em Portugal almas tão vis, que empreendam, ou aceitem qualquer tentativa em nome do Senhor D. Pedro? Que é o que podem esperar os portugueses do Senhor D. Pedro, depois que com o seu nome foi o Brasil roubado a Portugal, e por fim empobrecido, e desgraçado? A liberdade? Pois não agradou aos brasileiros, que antes viviam oprimidos, a que lhes foi concedida em seu nome, e agradará aos portugueses, que sempre foram livres, e agora mais que nunca, uma liberdade comprada por sangue, e por dinheiro; uma liberdade, que autoriza o crime, a desordem, e a anarquia; uma liberdade, que só serve para ladrões, para facionorosos, e para malvados? E que pode esperar o Senhor D. Pedro dos pedreiros de Portugal, se ele se não pode haver, nem concertar com os dos Brasil, que se são mais tolos que os de cá, são todavia menos velhacos, menos orgulhosos, e menos sóbrios? Reinar!!! E por quantos meses?  Poderia ele sofrer a ambição, a petulância, a loucura, o descoco, e a mania dos Palmelas, dos Saldenhas, e de toda essa corja de mandatários de imoralidade, do desaforo, e da rebelião? Desgraçado Príncipe! Ele seria arrojado, destronisado, e posto fora de Portugal pelos mesmos, que agora berram por ele. Porém esbravejem quanto poderem os pedreiros, berrem até lhes rebentarem os bofes os desaforados constitucionais; os Senhor D. Pedro não há de reinar em Portugal, nem por jeito, nem por força: não por jeito, porque os portugueses já conhecem os constitucionais pelo direito, e pelo avesso, e não acreditam em quantas promessas lhes fizerem em nome do Senhor D. Pedro; não por força, porque todos os bons portugueses, e são quase três milhões, estão intimamente persuadidos, e convencidos de que o Senhor D. Pedro, e seus filhos, e filhas não tem algum direito à Coroa portuguesa, depois que ele tomou para si, e para seus filhos, e filhas a Coroa brasileira. Esta é a lei de Portugal, que o Senhor D. Miguel reine: e se esta não é a lei!!! é a expressão da conta de geral dos portugueses que o Senhor D. Miguel seja seu Rei. Os portugueses não querem outro; e se este lhes faltar sem sucessão, (afaste Deus de Portugal tão horroroso castigo) na Família Real de Portugal, não na do Brasil, tem os portugueses quem reine. Este é o juramento dos portugueses; eles o farão valer com as armas na mão. Embora os pedreiros forjem planos; cogitem eles novas traições; comprem sargentos e soldados das dúzias; façam finalmente quantos esforços quiserem, ameacem com este mês, ou com o de Outubro: os traidores serão decapitados, e o Senhor D. Miguel há de ser Rei de Portugal todos os dias da sua vida. Na conservação destes sentimentos de justiça, e de lealdade está o principal baluarte da Defeza de Portugal, e sobre tudo na Misericórdia Divina, porque Deus está, e há de estar em favor do Senhor D. Miguel, e de todos os portugueses, que o jurarão Rei, e que forem fiéis a este juramento, o mais santo de todos os juramento, que prestarão os portugueses em todos os séculos; porque o juramento de Miguel Rei é o juramento da Religião, como farei ver, discursando pelos números seguintes.

Rebordosa 7 de Setembro de 1831.

Alvito Buela Pereira de Miranda.

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