08/04/13

O RESGATE DOS ESCRAVOS E OUTROS BENS DADOS POR DEUS

Infante D. Henrique
"Com estes cativos soube o Infante muitas coisas das quais tanto desejava, e foram elas de qualidade que o Infante as mandou significar ao Papa Martinho V, como primícias de tão novos furtos. O qual, a petição do Infante, fez perpétua doação à Coroa destes Reinos de toda a terra que se descobrisse por este mar Oceano do Cabo Bojador até às Índias inclusive; e para todos os que nesta conquista morressem concedendo Indulgência plenária. E depois confirmaram esta doação o Papa Eugénio IV, e Nicolau V, e Sixto IV que mais que todos a ampliou, pondo excomunhão e interdito aos outros Príncipes e pessoas que nas ditas terras entrassem sem licença dos Reis de Portugal. E além dos quintos que o Infante para a Ordem de Cristo já tinha por ElRei concedidos, também o Infante D. Pedro, seu irmão que então governava o Reino, lhe fez mercê que ninguém pudesse passar aquela conquista sem sua especial licença. Com estas mercês e graças começou o Infante a prosseguir sua conquista com mais poder e autoridade, e com menos pregas e maldições. E porque Antão Gonçalves lhe disse que alguns daqueles mouros queriam dar por seu resgate certos escravos da Guiné, de cujos ardores a gente tanto fabulava, o mandou o Infante outra vez continuar em seus descobrimentos; e estando para partir aconteceu que um Baltazar, gentil-homem da Casa do Imperador Frederico III, que ele mandara ao Infante para na conquista de África ganhar honra e ser armado Cavaleiro, pediu licença ao Infante par ir naquele descobrimento da Guiné, como a mais nova coisa em que então se falava no mundo; porque desejava ver-se em uma grande tormenta que depois pudesse contar na sua terra: e sucedeu-lhe tanto ao certo que, tendo eles partido, lhe sobrevoei um temporal tão grande e temeroso que chegou, segundo dizia o estrangeiro, nunca tal tinha visto. Todavia sossegado o vento, chegaram ao Cabo já deles conhecido, onde alcançaram pelo resgate dos cativos, que levavam: dez negros de terras diferentes e uma boa quantidade de ouro em pós, que foi o primeiro que nestas partes se resgatou.
Nuno Tristão - em Bissau
Depois, no ano de 1443, Nuno Tristão descobriu a ilha de Arguim, e outras junto dela, a que chamaram "das Garças" por haver nelas tantas que serviram de refeição ao navio; e das ilhas trouxe a este Reino mais de quarenta negros cativos que cá se estimaram muito por sua estranha figura. Vendo o ouros e os escravo, e a esperança que davam os ministros deste descobrimento, começou o povo a confessar a bondade da conquista rompendo todos a uma voz em louvores ao Infante em tudo o que ele queria e servindo-o animosamente. E os primeiros foram os moradores de Lagos, por serem mais vizinhos ao Infante; os quais se ofereceram liberalmente e armaram à sua custa seis caravelas e por Capitão delas um Escudeiro honrado chamado Lançarote, que fora Moço da Câmara do Infante. E não fizeram mais em sua viagem que trazer de mais estima, pelas informações que deles tomava."

(...)

"E quando frutificou em louvor de Deus a Cristandade destes homens do Congo pela conversão do seu rei, tão pouco aproveitou o que ElRei fez no requerimento d'ElRei de Benij, cujo senhorio está entre o Congo e o castelo de S. Jorge da Mina. Porque no ano do Senhor mil e quatrocentos e oitenta e seis também este rei de Benij mandou pedir a ElRei D. João que lhe mandasse sacerdotes para doutrinarem na Fé de Cristo ao qual se queria de novo converter. E trouxe este Embaixador, um João Afonso de Aveiro, que tinha já descoberto naquelas partes uma grande ilha que se chamou com o seu nome (e também foi o primeiro que trouxe a este reino pimenta da Guiné que nós chamamos de rabo, e não tão boa como a da Índia). Mas como ElRei de Benij  pediu os sacerdotes, mais por se fazer poderoso com nosso favor contra seus inimigos, que com desejo de baptismo aproveitaram pouco os Ministros dele que ElRei lhe tinha mandado com uma feitoria para o proveito que davam os escravos de Benij ao trato do ouro da Mina; os quais ElRei mandou logo vir todos por esse motivo, e porque a terra era doentia tanto que entre as pessoas que faleceram nela estava o mesmo João Afonso de Aveiro (que foi o primeiro que assentou aquele trato, feitoria, e comércio).

Castelo de S. Jorge da Mina, no Gana
E porque muito tempo este resgate de escravos de Benij, e Congo para a Mina, sempre correu por navios, que do Reino os iam lá resgatar, e nele intervinham rezados inconvenientes de se fazerem Mouros, ou se tornarem gentios, por não serem escravos, ElRei D. João III, até cujo tempo durou este resgate nesta forma, lembrando mais da salvação de tantas almas, que do proveito da sua fazenda, mandou, que cessasse este trato. E por ser esta obra de louvor de Deus, ele deu logo a ElRei o galardão dela com dobrado proveito, abrindo-lhe outra Mina abaixo da cidade de S. Jorge, donde começou a correr grande cópia de ouro, que importava muito mais do que se havia pela venda de escravos." ( DE MARIZ, Pedro. Diálogos de Vária História ...; Lisboa 1758 Cap. IV)

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