A VERDADE
ou
PENSAMENTOS FILOSÓFICOS
sobre os objectos mais importantes
Á RELIGIÃO, e ao ESTADO
Á RELIGIÃO, e ao ESTADO
por
Pe. José Agostinho de Macedo
LISBOA
Na Imprensa Régia
Na Imprensa Régia
Ano 1814
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XXXIV
A Moral não pode ser o ditame da razão só;
deve ser uma emanação divina de princípios imutáveis
Ponhamos de parte por um momento o que respeita ao verdadeiro culto; baste por ora ter visto como os mais famosos Filósofos da Antiguidade hajam reconhecido como indispensável uma luz celeste, e sobrenatural para instruir os homens; tratemos unicamente da Moral. A razão, que os modernos Filósofos tanto exaltam, como fonte inexausta da verdade, chegando a dizer, que ela só basta para fazer os homens sábios, e conduzi-los pelos caminhos da virtude; esta razão, digo eu, despojada da Revelação, de quão funestos, e erróneos princípios tem sido fecunda matriz? O que conhece a História das nações, o que leu os decantados Códices da Moral, publicados pelos mais célebres mestres da antiga Filosofia, com facilidade se convence, que é mui débil a razão humana, e incapaz de conduzir o homem ao perfeito lume da verdade. Os antigos Legisladores, que conheceram que o homem autor das leis pode errar, e que os outros homens, que lhes devem obedecer, são mui fáceis em desconfiar de sua idoneidade, lembraram-se de corroborar, e sancionar suas leis com alguma ideia de emanação divina. Para lhes dar o crédito de justas, de sábias, de conformes à recta razão, idearam fazê-las derivar dos Numes. Minos se gloriava de haver recebido suas leis do próprio Jove; Numa da boca da Ninfa Egeira; Solon, e Lycurgo se diziam instruídos pelo próprio Apolo. Este facto prova, que o sentimento comum dos homens é não prestar respeito, e obediência às leis, quando são ditadas pelo arbítrio humano, e que as não julga justas, se não forem conformes aos princípios da lei Divina; e que unicamente a voz de Deus pode preservar a lei do erro, e da injustiça. A lei da Natureza existe escrita no coração do homem, diz o Filósofo, e não tem necessidade de socorro algum Divino para ser justo, para ser sábio, e para não errar. Mas eu respondo, que assim como vem de Deus o ditame da lei natural, não se pode negar, que o sentimento de nossa consciência, que se inclina à virtude, e que abomina, e detesta o vício, não se derive de um lume eterno; daqui nasce, que suposta em um Filósofo tanta virtude, que com ela possa reprimir todas as paixões para escutar a lei natural, sempre se deve dizer, que o homem está obrigado a Deus por justiça. Mas digam-me quais fossem os mais célebres Legisladores da antiguidade, e os mais decantados mestres da Moral, que não hajam caído em muito grosseiros erros de princípios, e de máximas! Burigni, depois de haver investigado com muita sagacidade, e destreza nos escritos dos Filósofos tudo o que tem dito de com sobre o dogma, e moral, termina confessando, que não houve uma só escola de Filósofos, que não sustentasse consideráveis erros, e que não existira um só entre tão decantados sábios a quem se não possam exprobrar vícios essenciais. Todos estes grandes homens escutariam, sem dúvida, a lei da Natureza, e o interior ditame da consciência; e com tudo erraram. Logo, o homem apelando unicamente à lei natural, não conhece bastantemente, nem entende a verdade. Será pois o erro inevitável? Um Deus sapientíssimo, essencialmente verdadeiro, e bom, deixará que o homem se reduza a tão mísera condição? Não se pode crer. Do que tenho dito se conhece, que é indispensável uma luz sobrenatural, que ajude a fraqueza humana; que Deus não negará esta luz; que a sua Providência não podia permitir, que o homem permanecesse envolto em tão espessas sombras.
O homem na Revelação conhece a sua insuficiência e volvendo-se ao que é luz verdadeira, e que ilumina todo o homem, que vem ao Mundo, sente, que a voz de Deus é uma chama para ser coração, e um facho aceso diante dos seus olhos, e de seus passos.
(Índice da Obra)
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